Em 1994, o fotógrafo Fabio Lima, recém contratado por um periódico publicitário, estava presente na coletiva de imprensa do lançamento da marca Senninha, em um restaurante do bairro Jardins, em São Paulo. Na saída do evento, o manobrista do estabelecimento guiava o piloto Ayrton Senna com um guarda-chuva até o seu Audi. O que era para ser apenas um
momento casual, foi visto pelo fotógrafo como uma oportunidade para um click, que ficaria guardado até o último dia 1° de maio, quando foi publicada no instagram de Fabio como uma homenagem aos 30 anos de morte do piloto.
Nascido em São Paulo, Fabio desde a adolescência gostava de fotografar. Mais tarde, através dessas fotos ele montou um portfólio que o levou a trabalhar em laboratórios de shoppings centers que revelavam fotos. Foi assim que ele teve a oportunidade de conhecer fotógrafos profissionais. Logo, um desses colegas, o fotógrafo Kiko Coelho, comentou que havia uma vaga aberta para o que ele chamou de "tirar fotos de bonecos" no caderno Prop&mark, que saia no jornal Folha da Tarde. Na época, Fabio não sabia do que se tratava, mas logo percebeu que os tais bonecos, eram na verdade personagens, já que o caderno era dirigido à publicidade e cobria as notícias das campanhas. Em janeiro de 1994, ele começou a trabalhar no jornal.
Alguns meses depois, em junho de 1994, Fabio Lima, à época com 22 anos, encontrava-se em estado de êxtase. Não bastasse estar às vésperas de viajar para cobrir o Festival de Filmes Publicitários de Cannes, o rapaz teve seu primeiro contato com Renato Russo, seu ídolo durante a adolescência. Na ocasião, Fabio entregou ao cantor fotos tiradas no dia anterior, durante o show da banda Legião Urbana. Para a alegria do jovem, o fundador da banda gostou das imagens. "Ele perguntou, 'você vai no show hoje?'. Falei 'cara, eu não vou porque eu vou viajar'. 'Ah, que legal, você vai para onde? Quando você voltar, me escreve'. E me passou o endereço dele. Naquele momento, eu não estava nem aí para viagem. Eu só queria saber da banda".
Fabio cobriu o Festival de Cannes pelos próximos dois anos seguintes. Em 1997, com a passagem em mãos para participar do evento pela quarta vez, ele decide desistir da viagem e se mudar para Fortaleza.
O fotógrafo lembra que no primeiro dia na Cidade, rodou os jornais com seu portfólio embaixo do braço e o desejo de trabalhar com fotojornalismo: "Quando eu fui ao O POVO, o editor de fotografia, gostou do meu trabalho e falou que eu podia começar no dia seguinte. Porém, naquela época, não tinha vaga ainda. Então eu fiquei indo por alguns meses, apenas para mostrar o meu trabalho, sem receber remuneração. Mas eu precisava daquela oportunidade", destaca. Assim, ainda em 1997, Fabio foi contratado pelo O POVO, onde está até hoje.
Foi no O POVO, em 1999, que o fotógrafo ganhou o primeiro de três prêmios, na categoria fotojornalismo pela Associação Cearense de Imprensa (ACI), a fotografia retrata a tropa de choque expulsando militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) que estavam acampados na sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Para Fábio, uma outra cobertura que ele jamais vai esquecer aconteceu em 2008, três anos após o assalto ao Banco Central, ele conta: "quando prenderam o Alemão na cidade satélite de Brasília, trouxeram para cá e eu passei à tarde na Polícia Federal, esperando ele chegar. Fiquei na parte de fora e os policiais saíam para fumar um cigarro, para conversar. Foi assim que eu acabei criando um relacionamento com a galera e lá pelas 17h30 mais ou menos, me mandaram sair de lá e ir para a base aérea, porque ele iria chegar por lá".
"Eu sabia que lá eu não ia conseguir fazer nenhuma foto, mas obedeci fui para a base e perdi a vaga que eu tinha conquistado na Polícia Federal. Quando eu voltei, toda a imprensa estava nos fundos da polícia tentando fazer alguma imagem da garagem que era no subsolo, e eu não tinha a minha foto, eu falei 'e agora o que eu vou fazer?'", relembra.
E continua: "Quando cheguei ao portão, tentei fazer algumas fotos, mas a imagem ficou muito ruim. Foi quando eu decidi arriscar, e voltei para onde eu tava tarde. Enquanto eu estava chegando, o policial fechava o portão, eu falei que um dos guardas que eu conheci durante a tarde disse que eu podia entrar. Ao chegar na recepção, eu expliquei que o cara lá de fora tinha deixado eu entrar".
"Assim que passei a recepção, tentei encontrar o acesso da garagem, já que eu sabia mais ou menos onde ele ficava. Logo que entrei, abri as janelas, e quando eu olhei, o Alemão estava bem embaixo", afirma.
O fotógrafo finaliza o relato animado: "Aproveitei, peguei a câmera e fiz umas duas fotos sem flash, mas estava muito escuro e tive que tirar mais uma com o flash. Quando eu coloquei o flash, ele olhou para cima, o policial também olhou, e logo veio outro policial que me tirou de lá dizendo: 'você não pode ficar aí', mas eu tinha a foto, foi interessante, arrisquei e consegui fazer uma foto bem legal do momento".
Enquanto relembra os 30 anos de carreira, o fotógrafo conta que ganhou em média um prêmio por ano e se destaca como 23° lugar no ranking de jornalistas do Nordeste brasileiro. "O prêmio que mais me orgulha é o que eu não ganhei, mas o que eu ainda vou ganhar", ressalta.
Além de prêmios, as fotos de Fabio também marcaram presença em exposições internacionais, a primeira em 2018, na Colômbia, advinda do Prêmio Latino-americano de fotografia documental, em seguida, no ano de 2020, suas fotos fizeram parte da exposição "City vs Quarantine", em Kiev na Ucrânia, e também no livro "Mirando com Calma". Os dois últimos reconhecimentos internacionais foram consequência do trabalho realizado pelo fotógrafo durante a pandemia de Covid-19, onde o mesmo retratava o cotidiano da pandemia.
Fabio observa ao contar sua trajetória, que geralmente não se abala com a realidade que cobre. "A câmera isola a gente da cena, causa uma pseudo segurança", justifica. E é através da câmera também, que ele busca proteger a imagem das pessoas que estão sendo fotografadas. Principalmente se for em uma situação delicada. Um exemplo, é a fotografia "Tem gente alugando criança para pedir esmola", que conquistou o prêmio de fotojornalismo do Ministério Público do Estado do Ceará em 2022.
A foto apresenta metade do corpo de uma mulher sentada em uma calçada com uma criança no colo e a outra metade um cartaz de um fastfood anunciando seus sanduíches. Sobre a situação, Fabio comenta: "Eu não podia expor nem a pessoa, nem a criança. Assim a placa virou o refúgio e ainda tinham imagens de comidas nela, o que caiu bem com o que a gente estava propondo na pauta".
E prossegue: "eu costumo dizer que, 50% da foto é minha e 50% estava lá. Eu prezo muito por não mexer na cena para não alterar nada, para fotografar a coisa como ela é. Acho que isso é um exercício diário. Hoje eu vejo coisas que as pessoas não veem, mas porque meu olho está treinado. É involuntário".
"Uma vez, uma pessoa descreveu a minha fotografia como 'a língua que toca o dente machucado'. Então com as minhas fotos, eu quero mostrar para a sociedade o que ela insiste em não ver, como se eu abrisse os olhos dela", confirma Fabio.
Um novo olhar sobre artistas
Além de Ayrton Senna e Renato Russo, nestes 30 anos de carreira, Fabio Lima também fotografou Rita Lee, Zé do Caixão, Monarco da Portela, Ivete Sangalo, Ney Matogrosso e outros artistas.
Acompanhe o fotógrafo
Além das publicações nos canais do O POVO, o fotógrafo também publica imagens em @fabiolimafotojornalismo