Iago Xavier estava em um ônibus da linha Grande Circular quando descobriu que voaria até Paris, na França, para participar da 77ª edição do Festival de Cannes. Seu celular tocou, indicando que Karim Ainöuz, diretor de "Motel Destino", estava ligando, surpreendendo o ator que não esperava aquele contato.
"Não entendi primeiro o que era e ele desligou (assim que atendeu). Quando fui olhar o grupo, era a notícia que tínhamos sido selecionados para o Festival, para a competição principal (a Palma de Ouro). Primeiro, fiquei em choque, sem saber como reagir, porque uma notícia dessa não é todo dia que se recebe, né?".
Alegria? Felicidade? O momento "foi um misto de sensações" para o artista. Ele até fica em dúvida se algum resquício de tristeza passou rapidamente por seu corpo. "São muitos sentimentos envolvidos na hora. Acho que não foi nem tristeza, foi uma falta de saber o que sentia. Eu fiquei: 'Nossa, que é isso que está acontecendo?'", reflete sobre.
Se o choque deixou Iago sem reação e nublou suas sensações, seus familiares e amigos foram como um beliscão para acordá-lo do transe, seu "pé no chão" para processar tudo o que estava acontecendo. "Nossa, se essas pessoas estão felizes por mim, então isso é enorme", é o que recorda ter pensado quando as felicitações o cercaram.
"Eu realmente fiquei muito impressionado de ver como quando uma coisa dessas acontece com uma pessoa, que no caso fui eu, todos os que estão em volta ficam muito felizes com isso e tem um orgulho muito grande", aponta. "Aqui no meu bairro temos um senso de coletividade muito grande. Então, quando um dos nossos consegue chegar em um lugar desses, todo mundo fica feliz", completa.
Esta felicidade coletiva foi vista brilhando nos olhos e sorriso do artista durante o tapete vermelho do Festival. Ao som de "Coração", na versão interpretada por Xand Avião, Iago chamou atenção pela empolgação, dança e palmas — que contagiaram os outros integrantes do elenco, como Fábio Assunção e Nataly Rocha.
E apesar das duas reuniões, uma no Brasil e outra na França, sobre quais deveriam ser os passos seguidos na chegada ao evento, a animação do ator não pode ser contida em movimentos previamente calculados para se encaixarem aos padrões franceses, principalmente ao som de uma playlist de artistas brasileiros como Jorge Ben Jor e Jackson do Pandeiro.
"(Foi) uma felicidade absurda de ver onde o nosso trabalho chegou. Nos empenhamos tanto e foi inevitável não lembrar do set (de gravação), do trabalho que deu para fazer tudo isso", recorda e, em seguida, acrescenta: "Eu ficava lembrando constantemente durante o tapete vermelho desse trabalho e pensando que fomos realmente recompensados por isso".
Este sentimento o acompanhou até a sala na qual o filme seria exibido pela primeira vez, tanto para o elenco, como para os espectadores de diferentes nacionalidades que os prestigiaram. "Por um momento esqueci que estava em Cannes, embarquei na história do filme e fiquei vidrado assistindo tudo, encantando pela visão do Karim".
"Quando acabou, eu simplesmente fiquei sem acreditar que aquilo tinha acontecido. Parecia um grande sonho, todo mundo aplaudindo de pé por muito tempo — é tanto tempo que você fica até sem saber o que fazer", lembra.
Cannes entregou ao cearense exatamente o que ele esperava, se erguendo como um evento "bem grande e chique". Mas, deixando Paris e desembarcando em Fortaleza, agora o momento é dedicado a organizar os planos para o futuro — algo que para Iago não está limitado a trabalhar em apenas uma linguagem artística.
Para o audiovisual, ele compartilha que no momento está participando de testes para outras produções, não aprofundando o assunto, pois é "tudo meio sigiloso" ainda. Mas adianta que nutre desejos para a área, como o de integrar o elenco de uma novela. "Acho que está no imaginário de todo o brasileiro, essa cultura da novela. Minha mãe e avó são fãs (e) tenho certeza que ia fazer a alegria da minha família", elabora.
E se ele fosse o galã e desse vida aos mocinhos dos folhetins? Bem, o cearense se encaixa no perfil e se imagina dando vida a esse papel. "Mas confesso que os personagens que eu mais gosto são os vilões e antagonistas. Acho que eles têm uma coisa mais misteriosa, que eu particularmente gostaria mais de fazer".
E revela outro papel que projeta para um futuro: "Eu queria, talvez, interpretar uma pessoa em situação de rua ou em uma situação social vulnerável, porque acredito que essas histórias têm que ser contadas, são elas que o Brasil tem que ver. Saímos na rua e parece que não enxergamos que essas pessoas existem. Temos que colocar lá na tela do filme para poder reparar".
Mas, como mencionado anteriormente, os planos de Iago não se resumem apenas ao audiovisual. Poeta e compositor, ele tem um projeto pessoal com outros artistas de Fortaleza, voltado para a música e alinhado com ritmos da periferia, presentes na pesquisa que eles desenvolvem, como funk, rap e reggae.
"Estamos planejando montar nossa gravadora para lançar nossas músicas, que só temos a composição delas. Estamos planejando fazer um álbum ou um EP, mas queremos lançar isso para o mundo, com as letras que temos e com o que queremos falar", sustenta.
E completa: "Quero muito que tenhamos colocado isso para frente. Parece que estamos começando agora, mas já temos um tempo. Daqui a dois anos, quero olhar para trás e pensar assim: 'Ainda bem que começamos, porque isso aqui deu esses frutos agora'. Quero continuar atuando e no audiovisual, e pretendo conciliar as carreiras".
Se pudesse transmitir, inclusive, algo para si do presente para o momento que iniciou o curso de Artes Cênicas na Escola Porto Iracema das Artes, Iago aconselharia para ter paciência e esperar os frutos que viriam do trabalho. "Você não precisa brilhar sempre, porque tem outras estrelas aqui no céu. Mas a sua hora também vai chegar um dia, então é só ter calma, continuar acreditando, trabalhando e, principalmente, se movendo", conclui.