"Abram alas pra mim", é como começa King Saints na canção "Bitch não toca em mim", lançada em julho de 2023. A artista, que se define como uma "cria do pop", é de Duque de Caxias, Rio de Janeiro, e se destaca com voz e composições que atravessam sua vivência, coletividade e força.
Cinthya Ribeiro dos Santos, de 30 anos, é o nome por trás de King Saints. O nome artístico foi escolhido por meio da influência de Michael Jackson, de quem ela é fã e via como uma referência desde criança. "Ele me influenciou muito. Acho que a milhões de artistas e não seria diferente comigo. Ele é o rei do pop, 'King of Pop' e eu ficava com aquilo na cabeça", conta.
"Hoje em dia, eu entendo que a gente viveu num processo muito patriarcal, onde os homens comandavam tudo e o rei comandava o império. Então, se é o rei que comanda o império, eu sou o rei do meu próprio império. Logo, sou o King of Saints", diz a artista, que incorporou o "Saints" como referência ao seu sobrenome "Santos".
King assina projetos para artistas como Elza Soares e Negra Li, Luisa Sonza e Iza. A artista caxiense destaca que compor é um processo que se orgulha em sua trajetória: "Eu gosto muito de fazer música e nem todas elas eu me vejo interpretando, mas eu gosto de imaginar outras pessoas cantando essas músicas. Eu acho que isso é uma excelente maneira de eu estar em diversos lugares, com minha música tocando em vários lugares, com a voz de outras pessoas também", diz.
Elza Soares, pouco antes de sua morte, em 2022, gravou em estúdio nova versão da canção "Preciso Me Encontrar" com Negra Li, música de Candeia de 1976, que tem parceria de King e outros artistas na composição. "Duas mulheres que me inspiraram muito a vida inteira, até para eu ser a artista que eu sou, estética e fisicamente. Para me enxergar como uma pessoa, como uma mulher negra que alcança espaço", destaca.
King também colaborou nas faixas "VIP" e "Anaconda" do álbum "Doce 22", de Luisa Sonza, indicado ao Grammy Latino como o Melhor Álbum Pop em 2022. Mais recentemente, em agosto de 2023, ela esteve junto a Iza na composição de 11 músicas do "Afrodhit", cantando com a artista a canção "Boombastic" do projeto.
Para King Saints, essas realizações a colocaram em evidência no mercado da música e lhe possibilitaram visibilidade "Foi uma mudança para mim, de como o mercado me enxergava enquanto intérprete", aponta.
Como cantora, a artista de Duque de Caxias se descreve de forma enérgica como uma personagem da cena pop. No entanto, um adendo: para o underopop. "A gente está criando uma cena que é o underpop, que é o pop que vem da underground", avalia. "Aqui no Brasil, artistas negros, para serem relacionados como um artista pop, eles têm que vir também de outras vertentes. Tem que vir do rap, ele tem que vir do punk, não entra como um artista pop. Então, eu diria que esse underpop vem com esse flerte de todos os outros gêneros, mas que é um pop do Brasil, de negrona mesmo", explica.
A relação de King Saints com o meio artístico, no entanto, percorreu caminhos até chegar ao pop. Como compositora, ela primeiro escrevia sambas-enredo e frequentava os espaços de música da escola Grande Rio. Depois, seu processo com expressões artísticas passou pela dança, palcos de performances, composições musicais e, só então, como intérprete.
"A maneira que eu me comunico, como artista, foi um processo de lapidação e até de relações porque a gente vai conhecendo pessoas, aprendendo e observando outros artistas", aponta.
É também natural para King falar sobre aquilo que lhe é inerente. Em suas composições e signos, a sexualidade é discutida como forma de expressão das suas vivências. "Isso passa muito explícito nas minhas músicas. Eu sempre falo para homens e mulheres, é sempre ambíguo. Sempre tem uma relação com homens e mulheres nas minhas músicas, principalmente em músicas relacionais", conta.
"É muito também sobre a segurança de estar. Isso é algo que eu gosto de trazer para a minha música, para o meu palco, para a minha equipe, para as pessoas que compõem comigo. Não é só a interpretação, são as pessoas que estão por trás, que também são pessoas LGBTs", destaca King sobre sua equipe também representar um espaço de diversidade sexual.
King define: "Eu sou um coletivo, eu sou comunidade. E eu tento imprimir isso na minha música, na minha arte, na minha expressão e na minha equipe. Porque eu acho que, para além da estética, a gente vive no mundo capitalista. Então, a gente precisa também gerar dinheiro, gerar verba".
Diretamente de Duque de Caxias, King Saints finaliza a entrevista ao Vida&Arte com reflexão sobre si mesma: "Não é que a minha pauta foi uma mulher negra bissexual. Essa é a minha vida. Então, automaticamente isso está explícito em todos os lugares, espaços onde o meu corpo entra ou a minha música entra, ou a minha arte impacta de alguma maneira. Estou eu, estou aí, vivona, graças a Deus, a cada dia, 30 anos negligenciando as estatísticas".
King Saints
Trilha sonora
Na sexta-feira, 24 de maio, King Saints se tornou voz de nova trilha sonora de novela da TV Globo. A música "Toda Família" dá vida a relação de aproximação dos irmãos Mancini, protagonistas de "Família é Tudo", teledramaturgia da faixa das 19 horas na emissora.
O projeto é uma parceria inédita da Rede Globo com a Universal Music Publishing Brasil, que tem composição de Amanda Coronha, Barbara Dias, Rachell Luz e TH4I. A interpretação é de King Saints.