Fundado em 2009, o grupo Vitrola Nova recorda sua trajetória e comemora o futuro na cena teatral cearense com apresentação da peça teatral "Lembra da Canção".
Levando mais de 40 artistas ao palco do Theatro José de Alencar (TJA), o espetáculo musical busca recordar a história da companhia cearense por meio de canções de nomes relevantes de diversas gerações da música brasileira.
Na apresentação única, marcada para esta quarta-feira, 10, às 19h30min, em um dos palcos principais de Fortaleza - o TJA -, a peça dá destaque às vivências e experiências dos diversos personagens que formam o enredo lançado em agosto de 2023.
Em conversa com o Vida&Arte, Bruno Mariano, diretor-geral do Grupo Vitrola Nova, destacou as singularidades do elenco formado por artistas do Ceará, majoritariamente LGBTQIAPN , além de pontuar a realização do espetáculo "Lembra da Canção" como um marco do aniversário de 15 anos da companhia teatral.
O POVO - "Lembra da canção" está sendo apresentado desde meados do ano passado. Como vocês avaliam a recepção do espetáculo pelo público até o momento?
Bruno Mariano - Estreamos em agosto de 2023, apresentando o resultado de um processo de criação que foi iniciado em julho de 2022. Nosso público é extremamente diverso, assim como nosso elenco. Por isso, nos sentimos acolhidos e acolhidos com a receptividade de nossos espectadores. Vivenciamos fortes trocas de energia, compartilhando memórias e emoções por meio do encontro imprevisível de uns com os outros. Por isso, o "Lembra da Canção" tem sido leve, divertido e vibrante. As pessoas gostam de voltar no tempo e ouvir grandes sucessos da música. E essa é a nossa especialidade! Estamos desde 2009 contando histórias cantadas.
O POVO - Qual balanço pode ser feito desses 15 anos de atuação do grupo na cena teatral do Ceará?
Bruno Mariano - O Vitrola Nova foi composto por centenas de pessoas ao longo desses 15 anos de atividade, sendo, majoritariamente, pessoas LGBTQIAPN . Nos ensaios e nos palcos, os integrantes experimentam a presença cênica, desenvolvendo habilidades em canto, teatro e dança, e são orientados mediante de técnicas de consciência corporal, treinamentos vocais e criação para a cena. Trata-se de um grupo que proporciona experiências artísticas, formativas e profissionais para quaisquer perfis de pessoas, seja qual for sua experiência com as artes cênicas. No nosso elenco, temos professores, enfermeiros, vendedores, funcionários públicos, recepcionistas, médicos... E também cantores e atores. Portanto, por meio do encontro com essas pessoas e de nossas ações em coletivo, ocupamos vários espaços culturais de Fortaleza, representando a linguagem do coral cênico na cidade e ressaltando seu caráter inovador e único. A força da coletividade e do trabalho em equipe nos impulsiona a alcançar voos cada vez mais altos.
O POVO - A peça teatral é descrita como um "convite ao público a participar de uma festa chique e decadente e a rir, se encantar e se emocionar com os mais diferentes personagens presentes em uma noite de diversão". De que forma os adjetivos "chique" e "decadente" dados à festa fictícia influenciaram na construção do repertório musical que será apresentado durante a apresentação única no TJA?
Bruno Mariano - "Escolhe teu melhor vestido e vai!", esse verso da música "Marrom Glacê" (de Guto Graça Mello, Mariozinho Rocha e Renato Corrêa) define muito bem a ocasião. Os convidados dessa festa usam roupas e acessórios exuberantes, elementos que marcam suas presenças e ressaltam suas originalidades. São pessoas que possuem muito bom gosto e querem, a qualquer custo, curtir essa grande festa. Mas, acima de tudo, elas possuem um objetivo em comum: serem lembradas. Cada uma com suas motivações. E, como toda boa festa tem momentos de muita alegria e boas memórias, também há momentos de vulnerabilidade. Por isso, outras facetas dos convidados evidenciam suas derrocadas. Porém, isso não abala o desejo de encontrar amigos e compartilhar memórias. Pelo contrário, fortalece suas conexões.
O POVO - "Lembra da Canção" conta com 45 pessoas no elenco. De que maneira é possível lidar com um grande número de atores em um único espetáculo? E o que ter esse volume de pessoas trabalhando para construir uma peça significa para a trajetória do Vitrola Nova, como também para o fortalecimento da arte e cultura cearense?
Bruno Mariano - Gerir um coletivo massivo, ainda por cima de forma independente, é, sem dúvida, desafiador. Cada integrante vivencia os desafios de suas vidas pessoais enquanto se faz presente em um coletivo tão heterogêneo como o Vitrola. Nossos objetivos perpassam por motivações individuais, mas, quando estamos juntos, exercemos nossa potencialidade em várias camadas que qualificam nossa existência em coletividade. Isso acontece por meio de ações nas quais todos colaboram. Equipes de articulação interna nutrem nossas atividades, tais como produção, assistência de direção, roteiro, caracterização, gerenciamento de redes sociais, etc. É dessa forma que sobrevivemos na cena artística fortalezense. Ainda assim, para além dos obstáculos, seguimos realizando aparições na cidade com persistência e esperança, em busca de condições dignas de permanência. Temos ciência do quanto isso é raro! Além de ser extremamente satisfatório saber que há 15 anos representamos o canto coral cênico em Fortaleza e estamos sempre nos reinventando. Esses são estímulos que não apenas nos movimentam, mas também inspiram outros grupos artísticos locais a se articularem e seguirem em frente.
O POVO - Quais canções podemos aguardar serem interpretadas durante a apresentação no Theatro José de Alencar neste sábado, 6?
Bruno Mariano - O repertório é constituído por músicas exclusivamente brasileiras, desde algumas consideradas grandes medalhões até outras mais obscuras. "Chuva de Prata", "Fala", "Esse tal de Roque Enrow"... E mais outras 18 canções embalam nossa narrativa cantada. Compositores e intérpretes como Erasmo Carlos, Rita Lee, Caetano Veloso, Gal Costa, Chico Buarque e o cearense Rodger Rogério são celebrados em nossa festa. Está imperdível!
O POVO - Relembrando um pouco da trajetória do Vitrola Nova, como você analisa os anos iniciais da companhia de teatro?
Bruno Mariano - Nossas primeiras investigações artísticas surgiram de forma despretensiosa, reunindo um grupo de amigos que se interessavam em interpretar um seleto número de músicas da MPB com arranjos a quatro vozes. Logo em seguida, assumimos uma nova roupagem: incluímos elementos da cena para incrementar nossos projetos e estendemos o número de canções em nosso repertório. A partir daí, nos apresentamos em eventos institucionais e intervenções. E, desde então, nos fazemos presentes nos mais variados espaços culturais de Fortaleza, maturando procedimentos de gestão e criação em grupo.
O POVO - Da fundação do grupo, lá em 2009, até os dias atuais, muita coisa mudou, desde o mercado da arte até os variados formatos de recepção do público. Como o grupo se adaptou a essas transformações?
Bruno Mariano - A capacidade de um organismo vivo em se adaptar é magnífica. E isso não é diferente em um coletivo de artistas. No caso do Vitrola Nova, nossa maior adaptação aos diferentes contextos que se apresentaram ao longo desses anos se pauta em nossa originalidade. Ao invés de nos modificarmos para um melhor encaixe ao que nos foi e é confrontado, realizamos nossos próprios procedimentos e, cada vez mais, fortalecemos nossa subjetividade. E é compartilhando isso com o máximo de sinceridade que continuamos atuando na cena artística local e alcançando diferentes públicos.
O POVO - Para o futuro, o que podemos aguardar dos próximos projetos do Vitrola Nova? E o que os membros anseiam para o grupo teatral?
Bruno Mariano - Como nosso público adora relembrar canções marcantes, estamos nos articulando para produzir uma releitura de um dos nossos maiores sucessos: o "Vitrola Jukebox - Novelas". Trata-se de um musical interativo em que o espectador escolhe a música que quer ouvir. O repertório é composto por canções que fizeram parte da trama de vários folhetins brasileiros, celebrando a cultura brasileira e, também, proporcionando momentos de emoção, alegria e saudosismo. Nossa atual geração de cantores-intérpretes permanece nessa empreitada com muito ânimo para seguir em frente. Ainda assim, também buscamos novas pessoas que se interessem em integrar nosso coletivo para continuar cantando e alegrando a Cidade.
Espetáculo "Lembra da Canção"