Filmes de terror são feitos aos montes no cinema. No meio de uma vasta galeria de suspenses e sustos genéricos, uma ficção científica de 1979 com fortes raízes no horror chamou atenção e conquistou fãs ao longo de mais de 40 anos, com uma franquia que soma seis filmes.
Em 15 de agosto será lançado nos cinemas brasileiros "Alien: Romulus", do cineasta uruguaio Fede Alvarez, que dirigiu, dentre outros, o remake "A Morte do Demônio" (2013) e se mostrou capaz de trazer autenticidade, mas resgatar e honrar obras consagradas.
O longa chega em meio a incertezas dos últimos lançamentos da sequência e certa saturação no gênero. Entretanto, para entender o contexto da nova empreitada de uma das figuras mais conhecidas e temidas do cinema, é preciso compreender como a série mudou ao longo dos anos.
Em 1979 foi lançado "Alien", conhecido no Brasil como "O Oitavo Passageiro", do ainda não tão consagrado Ridley Scott. O trabalho mostrou uma faceta diferente dos filmes de terror, a começar pela ambientação. O longa se passa no espaço, mais necessariamente na nave Nostromo, um personagem à parte. Escura, sufocante mesmo que gigantesca, o local abriga quase 100% do filme.
Para criar o alien da produção, Scott se inspirou e reproduziu, quase que completamente, a obra Necronom IV do artista suíço H.R Giger. Com apenas algumas mudanças, nascia uma figura humanóide, mas grotesca, profana com formatos fálicos e aterrorizantes: o xenomorfo.
O elenco é completado pela atriz Sigourney Weaver. A figura feminina dela é um diferencial por trazer uma personagem instigante fora de estereótipos da época. O filme foi um sucesso e logo se tornou um clássico.
Para a sequência "Aliens: O Resgate", foi contratado o diretor James Cameron, especialista em fazer títulos grandiosos como "Avatar (2009)" e "Titanic (1997)". O longa deixa o horror da ficção científica e dá lugar a uma ação empolgante com mais personagens e mais xenomorfos, inclusive com uma versão de rainha da raça. Também foi um sucesso, apesar das diferenças do original.
As continuações entraram em um limbo de divergências criativas com o que os novos diretores e os produtores executivos queriam, fazendo com que a franquia perdesse identidade.
Só 15 anos após "Alien 4: Ressureição" (1997), filme totalmente diferente do que os outros haviam mostrado, diga-se, chegou "Prometheus" (2012), já com a mente criativa de Ridley Scott retomando as rédeas da franquia. Ele, porém, deixou de focar no xenomorfo e decidiu imergir bem mais na gênese desse universo.
O diretor brigou com os executivos do primeiro Alien para incluir uma cena que não parecia ter muita relação com o restante da trama: o famoso corte de uma nave que abrigava um corpo estranho em uma lua distante. O seu objetivo era desenvolver um projeto em torno dessa figura misteriosa.
O roteirista John Spaihts, juntamente com Scott, quis abordar a história do filme em torno do astronauta gigante e como a sua raça está ligada com o desenvolvimento da história humana e dos xenomorfos. A pegada de terror e ação agora é substituída por algo filosófico, com elementos religiosos.
“Prometheus” se passa 29 anos antes do primeiro filme e é bem original em suas ideias, mas, em certos momentos, se perde no que quer explicar e deixa muitas questões em aberto.
No meio de personagens pouco expressivos, o principal é o andróide David, interpretado por Michael Fassbender, com uma personalidade ambígua e pouco conformada em ter sido criado por uma raça que ele considera inferior para servir.
Outro ponto que estimula a imersão é justamente a raça destes gigantes, colocados na trama como criadores dos seres humanos e chamados de Engenheiros. Eles têm traços semelhantes aos da raça humana e querem destruir a Terra por estarem decepcionados com o rumo tomado pela humanidade.
O filme até abriu margem para uma teoria de que Jesus seria um representante dos Engenheiros enviado para mostrar o caminho correto que os homens deveriam seguir. Porém, ele foi morto e, por isso, eles decidiram eliminar a vida no planeta. “Prometheus” pouco cita “Alien”, que só vem a aparecer em uma forma diferente na última cena.
"Alien Convenant” (2017), uma sequência direta 11 anos após os acontecimentos de "Prometheus", cai na mesma complexidade de não decidir o que quer contar. Parte da trama foca em David, agora com o seu complexo de Ozymandias, e, além de extinguir o que parece ser uma raça semelhante a dos Engenheiros, passa a ser um criador e dar vida a versões de xenomorfos, o que chama de "organismo perfeito".
Este filme, porém, peca ao mostrar um elenco grande que vai sendo abatido de formas atrapalhadas e previsíveis, enquanto tenta embarcar numa trama religiosa e filosófica. Sem conseguir se aprofundar em nenhum dos pontos, a sensação do espectador é de decepção.
O saldo de “Prometheus” e “Convenant” deixa muito a desejar, mas é inegável a autenticidade. David até chega a citar, em uma das suas muitas referências e falas poéticas, por vezes cansativas, "O Paraíso Perdido", livro de John Milton, em que Lúcifer questiona: "É melhor servir no céu ou reinar no inferno?". O tema aponta que o andróide vive, mas sem abordagem suficiente para deixar o público satisfeito.
"Alien: Romulus" mostra no primeiro cartaz divulgado uma bela arte de um xenomorfo e um bebê, lembrando "A Criação de Adão", do pintor Michelangelo. A imagem indica uma proximidade com as questões abordadas nos filmes anteriores sobre questões religiosas e filosóficas da origem conectada do alien e do ser humano.
O primeiro trailer remete ao primeiro filme com uma nave como principal ambientação, e apresenta um terror de ficção científica forte com um xenomorfo grotesco e sanguinário. O longa recebeu as bênçãos de Ridley Scott, que está como produtor. Ou seja, a obra não deve fugir muito do que ele imaginava dar continuidade na saga.
Este longa se passa entre os acontecimentos de "Alien: O Oitavo Passageiro" e "Aliens: O Resgate". É difícil para os fãs da franquia não se empolgarem com o retorno de um dos personagens mais icônicos que o cinema já criou, ainda mais prometendo voltar às origens. Resta saber se o competente para terror e remakes, Fede Alvarez decide o que contar: se será a gênese humana e do xenomorfo ou um horror clássico. Quem sabe até mesmo uma mistura dos dois.
"Alien: Romulus" aparenta ser instigante e tem todo o potencial para ser um terror diferente dos demais, trazendo novamente uma figura marcante e ameaçadora paralelamente com abordagens mais complexas e de interesse em temas fora até mesmo da ficção científica.
Alien Romulus