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Emiliano Queiroz relembra trajetória de mais de 70 anos de carreira
Vida & Arte

Emiliano Queiroz relembra trajetória de mais de 70 anos de carreira

Aos 88 anos, Emiliano Queiroz ganha exposição, revisita embates na ditadura militar, defende diversidades e relembra novela problemática
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Retrato de Emiliano Queiroz. O ator veio a Fortaleza para o evento em que será homenagiado pelos seus 50 anos de carreira no Museu da Fotografia (foto: Matheus Souza/Opovo) (Foto: Matheus Souza)
Foto: Matheus Souza Retrato de Emiliano Queiroz. O ator veio a Fortaleza para o evento em que será homenagiado pelos seus 50 anos de carreira no Museu da Fotografia (foto: Matheus Souza/Opovo)

No corredor do Hotel Luzeiros, na avenida Beira-Mar, a cineasta Maria Letícia não economiza elogios. “Emiliano é o maior ator do Ceará de todos os tempos”, crava. “Ele é uma pessoa mansa, maravilhosa. Estou casada há 51 anos e sigo segurando firme”, se orgulha a carioca de 77 anos.

Aos 88 anos, Emiliano Queiroz tem mais de 70 anos de carreira, acumula mais de 80 participações em novelas, é pioneiro da radionovela no Estado, brilhou no cinema e já perdeu as contas de quantas peças de teatro encenou. Toda essa abundância é celebrada na exposição “Emiliano Queiroz - De Aracati para o Mundo”, em cartaz no Museu da Fotografia de Fortaleza.

Enquanto a esposa e biógrafa (Maria Letícia escreveu com o marido o livro “Na Sobremesa da Vida”) se derrete em elogios, o ator que dá nome ao teatro do Sesc em Fortaleza está concentrado para entrevistas no hotel onde está hospedado. Mesmo após tantos anos diante das câmeras, o cearense gosta de se apegar à cronologia da própria vida para não perder nenhum detalhe.

É com orgulho que ele lembra, por exemplo, de Veludo, criação de Plínio Marcos (1935-1999) para a premiada peça “Navalha na Carne”, de 1969. Em cena com Tônia Carrero (1922-2018) e Nelson Xavier (1941-2017), Emiliano defendeu um personagem gay em meio ao conservadorismo da ditadura militar. Buscando fugir de estereótipos, precisou se defender de críticas frontais.

“Eu era metido a valente. Meus amigos diziam que eu era descendente de Lampião, que eu não tinha medo de nada. E eu já me colocava contra o preconceito”, lembra o ator.

Esse respeito à diversidade, conta o cearense, foi ensinado em casa pelos pais Henrique e Ana. Num Ceará dos anos 1940, a família, inclusive, apoiou a decisão do menino de seguir a atuação como carreira – mesmo considerado um ofício “desviado” à época. “Aprendi sobre tolerância com a minha família. A pessoa é o que ela é”, ensina.

Sendo artista, Emiliano alçou voos pelo País com múltiplos personagens. Essa aventura é narrada agora em 105 fotos organizadas em mostra realizada pelo Sistema Fecomércio Ceará, por meio do Sesc. Agregando também troféus, cartazes e outras relíquias, a exposição permanece na Capital até o dia 19 de outubro, depois segue para Aracati.

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Entre as fotografias, uma caracterização não pode faltar: a batina. Nas novelas da Rede Globo, o cearense deu vida a muitos religiosos.

“Os padres são verdadeiros mestres dentro do panorama do Nordeste, independente da religião”, conta, ressaltando que, ao longo dos anos, os autores e diretores foram vendo nele uma representação dessa figura. O mais recente foi o Padre Romeu, da novela “Além da Ilusão”, de 2022.

Do desbunde ao sacro, o cearense quer mesmo é estar em cena. “Eu me formei com uma diversidade política e religiosa”, reflete, ressaltando ter crescido em meio às reuniões do pai, membro do Partido Comunista. “Eu tinha respeito por aquelas pessoas que se colocavam politicamente contra o que estava sendo pregado”, avança.

Após infância e adolescência no Ceará, Emiliano foi de pau-de-arara para o Sudeste, onde ganhou terreno, buscando manter consigo a liberdade de pensamento. “Tônia Carrero dizia: ‘Esse menino tem uma visão muito aberta da vida, muito aberta do mundo’”.

Ao lado de Tônia, inclusive, elevou a outras potências a subversão da arte. “Nós ficamos muito amigos e viajamos pelo Brasil com os militares correndo atrás da gente com o cacete na mão”, conta, aos risos.

De Dirceu Borboleta, de “O Bem Amado” (1973), à emblemática Geni, de “Ópera do Malandro” (1978), foram muitos os sucessos. Mas o “fracasso” também foi encarado no caso da novela “Anastácia, a Mulher sem Destino” (1967), de autoria de Emiliano. A audiência não abraçou e Janete Clair precisou assumir a trama. A autora criou, inclusive, um terremoto para matar 100 personagens e recomeçar a obra.

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“Eu não estava sabendo administrar. Não me interessava escrever uma novela de televisão. Eu preferia abrir mão disso”, conta. Com a decisão de desembarcar do posto de autor global, veio uma lição que levou para a vida: “(Decidir) é uma etapa que se vence. Não sei se para o bem ou para o mal. Na vida, você joga e as coisas acontecem”.

Consciente da importância do que viveu e entusiasmado pelas homenagens recebidas, avalia hoje o atrevimento do menino de Aracati que quis ganhar o mundo: “Eu não tinha medo das verdades”.

Exposição "Emiliano Queiroz - De Aracati para o Mundo

  • Quando: 20 de julho a 19 de outubro, de terça a domingo, das 12 às 17h
  • Onde: Museu da Fotografia Fortaleza (Avenida Desembargador Moreira, 2345)
  • Gratuita
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