Logo O POVO+
Luiz Gonzaga: de releituras no TikTok ao museu criado por criança no Crato
Vida & Arte

Luiz Gonzaga: de releituras no TikTok ao museu criado por criança no Crato

Dos virais nas redes sociais a iniciativas de preservação da memória, o Rei do Baião segue provando sua atemporalidade cultural 35 anos após morte
Edição Impressa
Tipo Notícia Por
Fotos que a Dominique Dreyfus me enviou.  (Foto: Acervo Pessoal )
Foto: Acervo Pessoal Fotos que a Dominique Dreyfus me enviou.

Era época de São João e a Escola Raimundo Nonato de Souza — localizada no distrito Dom Quintino, na cidade de Crato (a 540 km de Fortaleza) — realizava uma festinha para os estudantes. Um deles era Pedro Lucas. Foi lá que o menino de cinco anos escutou, pela primeira vez, uma das composições de Luiz Gonzaga, "Numa Sala de Reboco".

A paixão pela música do ícone nordestino foi imediata e Pedro ganhou de uma tia um CD do Rei do Baião. Depois dali, a paixão só aumentou e, três anos depois, ao voltar maravilhado de uma visita que fizera ao Museu do Gonzagão, em Exu (Pernambuco), Pedro já sabia como demonstrar toda a sua admiração pelo artista: criar um museu dedicado ao cantor na casa em que sua falecida bisavó morou.

"Não tem como falar em Pedro Lucas sem falar em Luiz Gonzaga, não tem como falar em Dom Quintino sem falar no museu. Ele impactou e influenciou positivamente em toda minha vida, seja ela social ou profissional", afirma Pedro Lucas, hoje aos 19 anos. "A figura dele está presente na maioria das manifestações culturais em que os jovens estão inclusos hoje em dia", destaca, ressaltando a presença de Gonzagação em aplicativos como o TikTok.

O museu Luiz Gonzaga fica situado na rua Alto da Antena, em Dom Quintino, e reúne objetos que recriam a época em que Gonzagão viveu. Atualmente o espaço recebe visitantes de todas as partes do Brasil e do mundo, sendo considerado um ponto cultural da cidade e rendendo a Pedro prêmios e documentário.

"Através disso (do museu), consegui alcançar o objetivo de levar a mensagem de uma pessoa que batalhou tanto pela cultura nordestina e que, mesmo cheio de dificuldades, resolveu apresentar ao Brasil inteiro a sua cultura, nos ensinando a nunca perder a vontade de vencer", celebra o jovem. "Fico muito feliz com tudo que a gente tem conseguido através do museu e por estar contribuindo com a cultura da minha região", completa.

Na rua, nas rádios, na TV e nas redes sociais, o nome de Luiz Gonzaga é sempre trend quando o assunto é música nordestina. Regravações e adaptações de suas canções surgem frequentemente, levantando discussões acerca do uso das composições do Rei do Baião.

Segundo Gabriela Bez, guitarrista, violonista e diretora musical, a musicalidade de Luiz Gonzaga se manifestou na vida dela desde a infância, através da família que o escutava e de um tio que era sanfoneiro. Gabriela explica que o compositor é referência nos estudos de músicos da nova geração do forró.

"A música sempre está se modernizando. Quando se fala de forró, a gente deve até abrir um parêntese, porque ele não é apenas resumido em sua raiz. O novo sempre vem e a gente precisa se adaptar a isso", ressalta a musicista. Gabriela faz parte da banda Xote das Minas, composta só por mulheres que tocam o forró pé de serra e são influenciadas diretamente pelo o Rei do Baião.

A artista explica que o forró era caracterizado por zabumba, triângulo e sanfona. Com o processo de modernização, instrumentos como o contrabaixo, a bateria, a guitarra, o saxofone e o teclado foram inseridos nesse gênero.

"Hoje os estudantes de música de forró têm o Luiz como uma figura imortal, porque ele quem deu um pontapé nesse movimento. Costumo dizer que quem conhece o seu repertório consegue tocar qualquer música. As (canções) que vieram após sua partida são um reflexo do que ele já produzia naquela época", defende. "Ou seja, ele está presente na modernidade, é o velho que vira o novo, que acaba se tornando viral, tornando a cultura do Gonzaga mais viva do que nunca", finaliza.

Marcio Mattos, músico e professor da Universidade Federal do Cariri (UFCA), destaca a relevância do caminho deixado por Gozangão. "O legado de Luiz Gonzaga é demonstrar a importância de um compositor em estabelecer uma forte relação com o contexto no qual ele está inserido, o qual ele vive. Todo seu repertório musical se relaciona com o seu contexto social", reflete.

A admiração do hoje docente pelo Rei do Baião iniciou também na infância, por influência dos pais. Na graduação, começou a pesquisar sobre a música de Luiz Gonzaga e assuntos vinculados às suas obras. "As composições dele têm uma forte relação com a identidade das pessoas e a sua presença influencia diversas gerações, de maneiras e em momentos diferentes", afirma.

Mattos explica que muitos artistas brasileiros, de épocas diferentes, como os tropicalistas, a exemplo de Caetano Veloso, Gilberto Gil e Tom Zé, e nomes como Elba Ramalho, Dominguinhos e Alceu Valença, foram influenciados pelo repertório de Gonzaga. "Por meio dessas pessoas, conhecemos o trabalho dele. Além disso, o baião e o forró foram ganhando uma nova cara, mas sempre com uma associação direta com a música do Luiz Gonzaga. Sua presença sempre será muito forte", finaliza.

Luiz Gonzaga, um homem negro, nordestino e de uma origem humilde, deixou cravado na história um legado inesquecível. "Quero ser lembrado como o sanfoneiro que amou e cantou muito seu povo, o sertão, que cantou as aves, os animais, os padres, os cangaceiros, os retirantes, os valentes, os covardes e o amor", afirmou, nos últimos anos de vida.

A data de morte do Rei do Baião é lembrada em diversas cidades do Brasil, principalmente, no Nordeste, onde está presente um conjunto de tradições e de manifestações culturais que exprimem a identidade da sua população. É sempre uma oportunidade olhar para o céu e celebrar Gonzagão. 

Museu

Acompanhe o ponto de cultura e de memória no Instagram.

  • Onde: Rua Alto da Antena, 166 (Dom Quintino), no Crato

Acervo

Confira conteúdos organizados por Paulo Vanderley sobre Luiz Gonzaga no site 

O que você achou desse conteúdo?