De 20 a 27 de julho, aconteceu em Viçosa do Ceará a 19ª edição do Festival Música na Ibiapaba (MI). Contrariando qualquer pensamento raso de que cearense não se interessa por música de concerto, foram mais de 1300 inscrições para cursos de violino, baixo acústico, violoncelo e arranjo para orquestra, entre outros. Além do que se convencionou chamar de música "clássica", o evento - todo gratuito - incluía aulas voltadas para rock, chorinho e outros estilos.
Ainda com palestras sobre acessibilidade, gestão e produção cultural, além de uma programação de shows, o Festival Música na Ibiapaba mistura formação, fruição, diversão e uma miríade de sonhos. São adultos, jovens e crianças de municípios cearenses e de estados vizinhos que, tocados pela música, se dirigem para a cidade serrana em busca de contato com professores experientes em diferentes áreas e de espetáculos que fogem da agenda mais comum das festas de interior.
"Abranger a questão sinfônica é super importante, principalmente para o Ceará, onde é tão carente dessas informações e dessa perspectiva da música", aponta Arthur Barbosa, regente cearense radicado no Rio Grande do Sul, que veio pela terceira vez ao Festival MI, sendo a segunda cuidando da orquestra sinfônica. Para ele, essa orquestra já é "um avanço muito grande para o festival". "Uma orquestra sinfônica é algo que muita gente diz que é elitista, mas não é. É um equipamento tão importante quanto os museus. É um grupo que reúne capacitados músicos que podem fazer qualquer repertório da história da humanidade. Clássico, barroco, erudito, popular...", justifica.
Ele conta há muito tempo espera a montagem de uma orquestra sinfônica no Ceará, onde algumas iniciativas já foram criadas - como a orquestra de câmara Eleazar de Carvalho, de menor tamanho que uma sinfônica. "Eu trabalho com essas orquestras jovens também lá (RS), porque isso é muito importante: fomentar os jovens. A formação é muito importante e isso só pode ser dado se você dá uma perspectiva para os jovens músicos daqui terem um lugar para trabalhar", complementa. Sobre levar essa formação para interior do Ceará, Barbosa elogia e propõe uma ampliação. "É fundamental esse trabalho que a gente faz de interiorização da música de concerto. Já existe um trabalho muito importante de bandas, mas a banda não tem instrumentos de cordas, né? Na orquestra sinfônica a gente tem instrumento de cordas, é outra formação, é outro atendimento à história da música, outro repertório. Então eu acho super importante que se faça isso aqui, cada vez mais. porque é interiorizando que a gente também cria público para o trabalho. Vai ter gente aqui que vai ser a primeira vez que vai ver uma orquestra sinfônica na vida. Tem gente aqui que está tocando pela primeira vez numa orquestra sinfônica na vida. Essas experiências eles não vão esquecer", celebra.
Cearense de Camocim, Ney Vasconcelos trabalha há 31 anos na Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp). Convidado pela primeira vez para vir ao festival, ele se surpreendeu com a variedade de cursos e atrações, e com a vontade dos alunos. "Você vê que eles estão muito sedentos de informação. Os caras vivem, às vezes, sem professor há muito tempo e vão se virando do jeito que dá, uns ajudando os outros", destaca. "Uma orquestra sinfônica é algo que puxa todo mundo para cima, puxa toda a cultura para cima. A música nem se fala. Ela coloca o parâmetro mais para cima, pela exigência técnica e musical que tem. Se você não tem uma orquestra, pode até nivelar, mas é por baixo", analisa o contrabaixista. Segundo ele, Fortaleza tem muitos bons músicos. Tivesse uma sinfônica, teria também muitos bons professores. "Seria como um agente multiplicador. Acho um absurdo não ter uma sinfônica no Ceará", explica.
O maestro paulistano Marcos Sadao está pela terceira vez no Festival MI e destaca a evolução dos alunos nesse período. "A gente percorre vários locais do Brasil, muita gente sabe as dificuldades de cada região. Mesmo assim, chegando aqui, tive bastantes surpresas boas. Músicos muito bons tocando. Mas, também a gente sente a falta de informação, de conhecimento que eles precisam", analisa ele, acrescentando que festivais de bandas deveriam haver no Brasil todo. "Para a gente poder fazer com que a banda sinfônica seja cada vez mais reconhecida como um grande grupo. Não só como uma banda que é para tocar ali na festa. Mas que pode fazer concertos, apresentações de gala. A importância desse festival (MI) é deles virem e terem contato com todos os músicos dos instrumentos. Não pode jamais terminar. Aliás, é crescer cada vez mais".