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Sérvulo Esmeraldo e o Crato: uma relação umbilical
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Sérvulo Esmeraldo e o Crato: uma relação umbilical

Cidade de origem de Sérvulo Esmeraldo, Crato era tratada como a grande paixão do artista, com influências na sua criação
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O casarão da Bebida Nova, onde Sérvulo Esmeraldo viveu sua infância e juventude. Onde ele instalou o seu primeiro atelier (Foto: Gentil Barreira)
Foto: Gentil Barreira O casarão da Bebida Nova, onde Sérvulo Esmeraldo viveu sua infância e juventude. Onde ele instalou o seu primeiro atelier

"Sérvulo e o Crato são um. Ele volta sempre, porque nunca saiu de lá". Ao falar sobre a relação de Sérvulo Esmeraldo com sua cidade de origem, o professor, escritor e jornalista cearense Gilmar de Carvalho contextualiza como essa se tornou uma conexão umbilical ao artista.

Como afirmou no livro catálogo da exposição "A Linha, A Luz, O Crato", o município estava sinalizado em sua obra de diferentes maneiras, como na tradução "em forte poesia visual" na série "Suíte Araripe". "O Crato do Sérvulo não é um 'retrato na parede'. É uma cidade que se movimenta e se transforma, ao sabor dos ventos, da luz do sol, das cores que se intercambiam e que ele, egoísta, captou para ele e usou em sua obra", atesta Gilmar.

Presidente do Instituto Cultural do Cariri, o escritor e dramaturgo José Flávio Vieira lembra da infância de Sérvulo Esmeraldo, quando, no sítio Bebida Nova, pôde observar a Chapada do Araripe. No Crato, teve relação muito próxima com profissionais da xilogravura. Começou, então, dedicando-se à arte.

"Era uma infância bem lúdica, no Pé da Serra, com cachoeiras pequenas, ele brincava por lá, então é claro que isso o influenciou. Ele acordava com o relevo da Chapada do Araripe na sua frente, não há dúvida de que isso contribuiu. A ligação dele com o Crato sempre foi muito forte", compreende.

Embora tenha tido passagens de longos anos por outras cidades, como Fortaleza e Paris, ele sempre tinha o Crato em mente. À medida que envelheceu, foi ficando mais próximo da cidade, não à toa fez no município uma de suas últimas exposições antes de falecer.

De certa forma, a luz do Crato também é um fator relevante apontado por Fred Sidou, professor da área de Tridimensionalidade do Curso de Licenciatura em Artes Visuais da Universidade Regional do Cariri (Urca). O profissional tem afinidade com o trabalho de escultura de Sérvulo Esmeraldo.

Ele aponta que a "vivência campestre" do artista "foi muito importante na formação de uma sensibilidade talvez muito estimulada pelas linhas de horizonte, pelos relevos extensos visíveis das partes altas da Chapada" e pela localidade do sítio Bebida Nova, onde passou grande parte de sua infância.

"A paisagem do entorno da Chapada do Araripe, as mudanças de luz, os relevos extensos, tudo isso é muito intenso como experiência de observação. Acredito que isso tenha tido um papel fundamental na formação da sensibilidade de uma pessoa que viveu uma imersão tão significativa nesse ambiente", analisa.

Além disso, Fred Sidou pontua que há relatos de experiências de Sérvulo Esmeraldo com grupos de pessoas que quando passavam pelo Cariri faziam concertos de utensílios domésticos e ferramentas. Assim, o artista teve os primeiros contatos com o metal, o que provavelmente foi uma experiência precursora do que ele depois "desenvolveu muito bem como gravura".

Isso se estendeu para criação de objetos e até joias: "O Sérvulo foi muito versátil, um artista inventor. Essa bagagem de experiências culturais e também de observação da natureza deve ter contribuído, sem dúvidas, para a formação da personalidade artística, o que se refletiu no trabalho, essencialmente".

Atualmente, o professor desenvolve trabalho que foca na joalheria do artista, "uma parcela pouco conhecida do conjunto de sua obra", mas que, em sua análise, contribui para a inscrição do cratense como um dos precursores da joalheria contemporânea brasileira.

Sérvulo Esmeraldo e Dodora Guimarães   (Foto: Fábio Lima)
Foto: Fábio Lima Sérvulo Esmeraldo e Dodora Guimarães

A ação é feita em parceria com o Instituto Sérvulo Esmeraldo e funciona como um trabalho de restauração, replicação e, eventualmente, de recriação de obras do cearense. Ele percebe diálogos com o legado de Esmeraldo em sua rotina de professor de artes na Urca, que também contribui institucionalmente para o Festival Sérvulo Esmeraldo (FSE).

Com quatro edições já realizadas, o FSE ocorre no Crato desde 2019 como forma de fomento à produção contemporânea nas artes visuais, tanto na criação artística quanto na formação de público. A Urca é uma das apoiadoras do evento. A primeira exposição do cearense no Crato ocorreu onde hoje é o pátio da Reitoria da instituição.

A Universidade faz atividades em parceria com o Instituto Sérvulo Esmeraldo, tanto no FSE quanto na exposição que será inaugurada no Centro Cultural do Cariri. "Nosso papel enquanto Universidade nessa parceria é promover esse reconhecimento da arte de rua do Sérvulo, como a arte cinética, da luz e as esculturas", aponta o Professor e ex-reitor da Urca, Francisco do O' de Lima Júnior, docente do Departamento de Economia.

Uma das obras presentes no Crato é a escultura "Pirâmides" na Encosta do Seminário. Com essas ações, a ideia é aproximar o público do Cariri do trabalho de Sérvulo Esmeraldo, com exposições nas ruas de Juazeiro do Norte e do Crato, por exemplo, para envolver a população. Em 2016, a exposição "A Linha, A Luz, o Crato" foi realizada na Urca.

"Foi importante não só para trazer a obra do Sérvulo às novas gerações de cratenses e de todas as pessoas que acessam a Universidade, mas para mostrar como valorizar a arte. O papel da universidade não é só formar, fazer ciência e conhecimento, mas promover as artes", destaca.

"O Sérvulo é um cidadão universal, um artista reconhecido e famoso em diversos países, e que levou as luzes, as cores, as curvas e as retas do nosso Crato e do Cariri. É isso que o particulariza: luz, tons bem chamativos, o movimento da cinética que lembra a Chapada do Araripe em diálogo com essa paisagem e o platô da reta… É muito importante esse amor dele pelo seu território", enfatiza.

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