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50 anos sem Lupicínio Rodrigues: "pai da sofrência" segue inspirando
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50 anos sem Lupicínio Rodrigues: "pai da sofrência" segue inspirando

Cinco décadas após a morte do compositor Lupicínio Rodrigues, o samba canção é ressignificado e o seu legado na música permanece
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Há 50 anos, o Brasil perdia o compositor Lupicínio Rodrigues (Foto: Luciano Carneiro/O Cruzeiro/Arquivo EM)
Foto: Luciano Carneiro/O Cruzeiro/Arquivo EM Há 50 anos, o Brasil perdia o compositor Lupicínio Rodrigues

“E por isso vivemos brigando/ Toda a vida, eu e o meu coração” é o que Lupicínio Rodrigues expressa na música “Eu e o meu coração”. Os lamentos do cantor nas composições não se limitam a esta obra, visto como a sua trajetória construiu um legado que reverbera ao longo das décadas.

Nesta terça-feira, 27, completa 50 anos da morte do “Rei da dor de cotovelo”, que mesmo deixando poucos registros em disco, compôs músicas nas décadas de 1940 e 1950 que atravessaram gerações e despertaram um novo modelo de escrever canções.

O gaúcho escreveu sambas-canção incorporados pela dor com letras diretas, sem medo de abordar os desejos de vingança diante situações fictícias e reais. Adepto a Boêmia, ele foi dono de bares, churrascarias e restaurantes na cidade de Porto Alegre. Assom como contribuiu com o trabalho de bedel da Faculdade de Direito da UFRGS.

Seduzido pela revolução cultural do samba no Rio de Janeiro, em 1939 ele foi conhecer a cena musical carioca, onde impulsionou sua carreira e resultou na gravação do seu primeiro álbum, “Roteiro de um boêmio” (1952). Para o jornalista, músico e pesquisador musical Felipe Araújo, as diferentes vivências do artista contribuíram nas canções.

“A obra é riquíssima, ele conseguiu compor unindo o samba com o cancioneiro tradicional gaúcho. De fato ele traz para as músicas essa experiência humana em relação ao amor, com muita intensidade refletida a dimensão humana do amor e da solidão”, destaca.

A cantora Mona Gadelha, completou enfatizando como Lupicínio desenvolveu o teor de suas composições. “Ele fala da dor da perda de modo poeticamente desconcertante. Aborda a traição (da perspectiva de quem trai e de quem é traída) e a vingança, entre outros dilemas humanos, sem o menor pudor. Vai direto ao ponto”, ressalta.

Além da fama de Rodrigues interpretando suas próprias composições, suas músicas ganharam vida na voz de outros cantores, como Orlando Silva e Linda Batista, cantora foi responsável por popularizar a canção “Vingança”.

Também teve como intérpretes nomes como: Elis Regina, Zizi Possi, Maria Bethânia, Caetano Veloso, Gal Costa, Paulinho da Viola, Gilberto Gil e Elza Soares. Sendo Caetano o cantor que difundiu no início da década de 70 com a regravação da canção “Felicidade”.

O jornalista Felipe Araújo aponta que o trabalho de Lupicínio atualmente também contempla a voz de artistas contemporâneos que regravaram suas canções, o também pesquisador destaca o nome da cantora Adriana Calcanhotto como intérprete contemporânea.

“A obra dele sempre esteve em evidência. Inúmeros artistas que em algum momento das suas trajetórias se voltaram ao trabalho do gaúcho. Por exemplo, Adriana Calcanhotto que é conterrânea Lupicínio, ela tem um livro e um disco espetacular sobre ele, assim como houve projetos de celebração da obra”, acentua.

Para além do samba

Após cinco décadas desde sua morte em 1974, Rodrigues desempenha papel fundamental na influência das novas gerações do samba e em outros gêneros musicais. Os sentimentos melancólicos e as dores de amores perdidos são temáticas presentes nas composições brasileiras.

Presentes em obras como a da cantora sertaneja Marília Mendonça, a “Rainha da sofrência”, voz que renovou o repertório da sofrência. A cantora Mona Gadelha acredita na influência das produções de Lupicínio nas canções atuais, ela ainda cita que no single autoral "Tudo bem comigo", que segue inspiração no trabalho do gaúcho.


“Dor de cotovelo, fossa e hoje sofrência. Lupicínio é o pai, ele é clássico, suas canções são eternas para quem ama a música brasileira e sofre de amor. Acho que Marília Mendonça foi uma herdeira dele, e todos que cantam as dores de amor têm um elo com sua obra”, pontua.

Gadelha é reconhecida como artista pioneira do rock em Fortaleza na década de 1970 e desempenha uma representatividade na cena de rock e blues na cidade. Para ela, as composições do “Rei da Dor de Cotovelo” traçam um paralelo com o blues, ritmo de origem norte-americana do século XIX, entre a população negra nas plantações de algodão.


“Ele em seus temas é muito ‘bluesy’. Remete à dor que o blues exala, ressaltando o sofrimento que a perda provoca na gente. Imagine passar uma noite ouvindo Janis Joplin e Lupicínio. O que vai sobrar desta pobre alma? Por exemplo, ‘Uma Canção pra Você(Jaqueta Amarela)’, de Assucena (gravada pelas Bahias e A Cozinha Mineira) é Lupicínio e blues”, compara.

Assim como o blues, o samba também segue o processo histórico advindo de negros escravizados no século XX. Com a influência da cultura africana no Brasil, o gênero musical nasce nas rodas de dança em que pessoas seguiam o som obtido por meio dos batuques.

Como um subgênero musical acontece a ascensão do samba-canção no final da década de 1920, momento de modernização do samba urbano do Rio de Janeiro, que deixava aos poucos o maxixe, um estilo de dança de salão.

Diante de todos os processos culturais, Felipe comenta que o autor das músicas “quem há de dizer”, “Foi assim” e “Nunca” foi um forte aliado para perpetuação do samba e todos os subgêneros do ritmo.

“O samba é uma grande matriz da música brasileira, logo ele permanece estruturando a música nacional. Então o samba ele tá mais vivo do que nunca, porém segue se renovando, seja esteticamente, ou pelo interesse das novas gerações sobre o ritmo. E o Lupicínio deu a sua contribuição para a permanência do samba”, conclui.

 

 

 

 

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