Na bancada coletiva de “Motel Destino” no 77º Festival de Cannes neste ano, um dia após a estreia mundial, ele estava lá sentado ao lado de Karim Aïnouz, Iago Xavier e Nataly Rocha, os astros do momento. Ao longo da conversa, porém, falou pouco e desviava das atenções sempre que era colocado sob holofotes. Apesar da timidez, Wislan Esmeraldo é o roteirista principal do filme que chegou aos cinemas brasileiros depois de fazer tanto barulho, da pré-estreia concorrida no Cineteatro São Luiz a abertura congelante no 52º Festival de Cinema de Gramado.
Nascido no Crato e formado em Cinema e Audiovisual pela Universidade Federal do Ceará, Wislan conta ao O POVO detalhes da sua contribuição em “Motel Destino”, tanto na construção do roteiro original quanto nas adaptações propostas por Karim e Mauricio Zacharias, além de falar sobre sua afeição por comédias. Ele adianta também seus próximos passos com a direção do primeiro longa-metragem em parceria com Hilton Lacerda, autor pernambucano responsável pela criação de filmes como "Baile Perfumado" (1996), "Amarelo Manga" (2002) e "Capitães de Areia" (2011).
Previsto para ser gravado em 2025, “O Rio” conta a história de amor entre dois jovens de 15 anos em Aurora, no interior do Ceará, que é brutalmente interrompida. Cinquenta anos depois, um deles volta à cidade para enterrar sua mãe e reencontra o passado. Os dois senhores, agora distantes dos garotos que foram um dia, deparam-se com a urgência de uma reconciliação.
O POVO: Vem se falando muito sobre “Motel Destino” e, como o filme chegou há pouco nos cinemas, essa conversa inevitavelmente começaria por ele. Você é creditado como roteirista principal do filme. Como foi essa dinâmica com a direção?
Wislan Esmeraldo: O projeto surgiu em 2015 quando o Karim estava montando um núcleo criativo sobre crime e ele tinha me conhecido no ano anterior porque foi tutor de um dos meus projetos em outro laboratório. Eu não tinha nenhum projeto sobre crime, mas eu me arrisquei a desenvolver alguma coisa. O argumento que eu apresentei para ele era mais dramático. Ele achou legal, mas o foco era filmes de crime mesmo. Ele me deu algumas referências, me apresentando livros e filmes, eu me isolei num fim de semana e surgiu o argumento do “Motel Destino”. Quando o Karim trouxe o Mauricio para colaborar a gente já estava no quarto tratamento. Foram cerca de 12 versões, uma seguida da outra, com muitas alterações. Os atores ensaiavam, propunham coisas, eu ia lá e mexia. Foi muito dinâmico e frenético.
O POVO: Em Cannes, Karim nos disse que a história do filme originalmente se passava no sertão e, neste mês em Gramado, a produtora Janaina Bernardes revelou que esse sertão seria Juazeiro do Norte, no Cariri. Em que momento essa mudança aconteceu no roteiro?
Wislan: Foi uma mudança já perto de a gente filmar. Karim me pediu para mudarmos para o litoral porque ele já tinha feito “Céu de Suely” no sertão e estava cansado. Por eu ser uma pessoa do Cariri, sempre tive essa sensação de espelhamento com o Heraldo, porque ele achava que a grande mudança da vida dele estava longe dali. No começo deu um bug na minha cabeça porque como é que a pessoa mora em Beberibe, esse lugar tão idílico, e quer sair dali? Mas depois eu fui entendendo e costurando isso. ‘
O POVO: Apesar desse perfil mais dramático dos seus filmes, você também está presente no roteiro de algumas comédias para a televisão, como "Guerra da Tapioca" (2017), "Se Avexe Não" (2024) e "Trago a Pessoa Amada" (2024). Você gosta de aprimorar também esse seu lado do humor?
Wislan: O cinema de gênero, em si, me interessa muito. Comédia é um lugar que eu nunca imaginei que estaria, mas fui percebendo que dá para ir quebrando as situações dramáticas com humor e isso vai ficando divertido. Eu assisti muito TV aberta, novelas, Chaves, Os Trapalhões... Essas referências reverberam na forma como se comunica hoje.
O POVO: Seus primeiros trabalhos de direção foram com os curtas-metragens "Tenho um dragão que mora comigo" (2014) e "Para minha mãe" (2015). E agora você está se preparando para dirigir o primeiro longa. Como você lida com esse processo de direção?
Wislan: Dirigir sempre foi uma coisa que eu gostei muito, e sempre foi um processo desafiador porque eu sou uma pessoa muito tímida. Quando você se coloca num lugar de estar a frente de uma equipe, você se desloca da sua zona de conforto. Me dá um frio na barriga, mas me dá também uma excitação grande de ver as coisas acontecendo.
O POVO: Seu próximo trabalho se chama “O Rio” e você vai dividir a escrita e a direção com Hilton Lacerda, autor já com grande experiência no Cinema Brasileiro. Esse projeto tem mais a ver com o trabalho dele, com o seu, ou é mesmo uma colaboração integral?
Wislan: Esse trabalho começou em 2014. Já passou por muitos laboratórios, recebeu vários retornos e está bem desenvolvido. O Hilton chegou agora para codirigir comigo por intermédio do nosso produtor João Vieira Jr. da Carnaval Filmes, e eu achei que tinha tudo a ver conhecendo o trabalho dele. Eu assino o roteiro, mas a gente vai mexer a partir de agora. Ele tem uma idade próxima dos personagens, o que eu acho que facilita o diálogo dele com a história. Vai se tornar um filme de nós dois.
O POVO: O filme já tem previsão de quando será gravado e onde?
Wislan: O filme provavelmente vai ser gravado no interior de Pernambuco. Sabemos que vai ser gravado em 2025, mas estamos estudando a questão climática para entender se vai ser no primeiro ou no segundo semestre. O trabalho com o roteiro já começou e a nossa previsão é entregar uma versão finalizada ainda neste ano.