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Onde andará Caio Fernando Abreu? Relembre obras do escritor
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Onde andará Caio Fernando Abreu? Relembre obras do escritor

Caio Fernando Abreu completaria 76 anos nesta quinta-feira, 12, e segue no aqui e no agora com reflexões que ultrapassam gerações
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Caio Fernando Abreu completaria 75 anos nesta quinta-feira, 22 (Foto: Marcos Mendes/Agência Estado)
Foto: Marcos Mendes/Agência Estado Caio Fernando Abreu completaria 75 anos nesta quinta-feira, 22

Em "Onde andará Dulce Veiga?", romance publicado em 1990, Caio Fernando Loureiro de Abreu escreve sobre Passo da Guanxuma, local fictício presente em várias de suas obras. Em entrevista à TVE-RS, em 1994, ele o considera como um lugar onde as coisas seriam melhores: "Foi ficando sempre a nostalgia, a melancolia de um lugar perdido onde as coisas seriam melhores, como a nostalgia que a gente tem do útero materno, ou de Deus, a nostalgia de um paraíso perdido".

Passo da Guanxuma é a Pasárgada de Caio Fernando Abreu. A cidade esteve no vocabulário dele entre 1984 e 1995, tendo sua primeira aparição no conto "Uma praiazinha de areia bem clara, ali, na beira da sanga", no qual relembra com dor a localidade em que nunca mais poderia voltar.

A cidade fictícia contém muitas referências à Santiago, no Rio Grande do Sul, onde, em 12 de setembro de 1948, foi berço de Caio Fernando Abreu, que inventava histórias desde os seis anos. Estes aspectos urbanos são esquadrinhados pelo autor em praticamente todas as suas produções.

Sua antologia abrange desde contos e crônicas até romances e cartas, que revelam uma reflexão sensível sobre a solidão urbana e a busca por identidade em meio ao estranhamento de uma sociedade jovem, assuntos que continuam a ressoar com leitores de diferentes gerações.

O próprio dizia que muitos de seus personagens não tinham nome ou características específicas, pois eram "muita gente" ao mesmo tempo.

O jornalista e dramaturgo contagiava-se da música para escrever e seu entusiasmo ainda ecoa na abertura de inúmeras histórias. "Para ler ao som de Angela Ro-Ro", "Ao som de Simpathy for the Devil", "Ao som de Nara Leão"; Caio Fernando Abreu construía coletâneas impecáveis que trazem até hoje seus textos à vida.

Ele também utilizava com maestria a arte do cinema como ponto estratégico, sempre imaginando de que ponto está sendo vista a cena que compõe.

Vencedor de prêmios literários desde a adolescência e com escrita inicialmente prestigiada no período da ditadura militar, o autor nunca deixou de expor sua opinião acerca do regime vigente. Ele chegou a discutir com Rachel de Queiroz (1910 - 2003) durante o programa Roda Viva, em julho de 1991.

Caio, inconformado com a insistência da escritora em defender o presidente ditador Castelo Branco (1897 - 1967), decide encerrar sua participação antes do final do programa, em um discurso de protesto.

"Concluo que você colaborou para coisas muito negativas nesse País, no meu ponto de vista. Compreendo que todos nós somos humanos, mas estou me sentindo extremamente constrangido de estar na posição de render homenagem a um tipo de ideologia que profundamente desprezo", argumentou ao encerrar a participação no episódio.

O autor chegou a ser perseguido pelo DOPS durante a ditadura militar, sendo obrigado a refugiar-se na Casa do Sol, sítio da poeta, cronista e dramaturga Hilda Hilst em Campinas. A propósito, Caio era um ávido escritor de correspondências, escreveu uma infinidade. Um de seus mais famosos conselhos foi dado em correspondência a José Márcio Penido, onde discorre sobre a dificuldade de um escritor para encontrar seu texto:

"Zézim, remexa na memória, na infância, nos sonhos, nas tesões, nos fracassos, nas mágoas, nos delírios mais alucinados, nos lirismos mais idiotas, na confusão mais generalizada, no fundo do poço sem fundo do inconsciente: é lá que está o seu texto. Sobretudo, não se angustie procurando-o: ele vem até você, quando você e ele estiverem prontos".

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Entre as personalidades que receberam cartas de Caio, estão Adriana Calcanhotto, Maria Adelaide Amaral e João Silvério Trevisan. Conhecido principalmente pelos seus contos, o escritor se aventurou pelos romances apenas duas vezes: "Limite Branco" (1970) e "Onde andará Dulce Veiga?" (1990).

Em uma nota que antecede o conto "Introdução ao Passo da Guanxuma", do livro "Ovelhas Negras" (1995), ele até explicita a pretensão de fazer um romance inteiro ambientado no local. Entretanto, jamais iria escrevê-lo, pois esta foi a sua última obra publicada ainda em vida.

Caio morreu em 25 de fevereiro de 1996, aos 47 anos, por complicações da Aids. Ele é considerado o primeiro escritor brasileiro a escrever sobre o HIV e publicar textos viscerais sobre a vivência de pessoas homossexuais no Brasil durante o epílogo do século XX. "Alguma coisa aconteceu comigo. Alguma coisa tão estranha que ainda não aprendi o jeito de falar claramente sobre ela", redige Caio no início da crônica "Primeira Carta Para Além dos Muros".

No romance "Onde andará Dulce Veiga?" Caio escreve: "O mistério continua sem solução. Ainda não foi localizada a cantora Dulce Veiga, que desapareceu sem deixar pistas. Olhei a data, forcei a mente tentando lembrar onde andaria eu mesmo naquela época". Gosto de pensar que Caio Fernando Abreu anda lá, em Passo da Guanxuma, junto de Dulce Veiga e de tantos outros personagens que criou.

Como começar a ler?

1. Dama da noite

O conto presente no livro “Os dragões não conhecem o paraíso” insinua um monólogo feito por uma personagem intitulada “Dama da noite” que transborda reflexões sobre a insegurança de viver em um momento de massificação cultural da juventude dos anos 1980, tocando em assuntos como a morte e a espera de um grande amor.

2. Onde andará Dulce Veiga?

O segundo e último romance do autor conta a história de um jornalista em declínio que aceita a missão de encontrar e entrevistar a cantora há muito tempo desaparecida Dulce Veiga. Ao longo da investigação, o personagem principal, nunca nomeado, vive em um estado de crise existencial, misturando memórias de um romance conflituoso com experiências cotidianas em um antro de urbanidade chamado São Paulo.

3. O dia em que urano entrou em escorpião

Caio Fernando Abreu era do signo de virgem, com sol em virgem com ascendente em libra. Em diversos contos o autor explicita sua crença em astrologia. Neste conto, o autor descreve quatro amigos em um apartamento onde não há muito o que fazer. Até que um dos rapazes entra em uma crise de angústia por conta do evento astrológico que acaba de acontecer.

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