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Sanfoneiro com deficiência visual, Guilherme Dantas apresenta projeto audiovisual
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Sanfoneiro com deficiência visual, Guilherme Dantas apresenta projeto audiovisual

Ao Vida&Arte, sanfoneiro fala sobre sensibilidade desenvolvida por meio da arte e relembra início da carreira na área
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Sanfoneira Guilherme Dantas fala sobre trajetória com músico (Foto: Enzo Souza/Divulgação)
Foto: Enzo Souza/Divulgação Sanfoneira Guilherme Dantas fala sobre trajetória com músico

Guilherme Dantas costuma afirmar que "enxerga com os olhos do coração" em todo local que vai e tem a oportunidade. Uma frase que pode soar metafórica, mas ele explica: "Nasci sem enxergar com os olhos e costumo dizer que Deus me deu essa missão de ver melhor com o coração, ou com os olhos do coração. Tenho esse lema para dizer para as pessoas que todos têm uma forma diferente de ver o mundo".

"Desenvolvi muita sensibilidade e uso isso ao meu favor. Se eu puder também passar (um conselho) para quem está perto de mim: esteja sensível às coisas, não se engane só pelo que está vendo. Observe com o tato e com os ouvidos", continua.

Sanfoneiro, o cearense coleciona em sua carreira parcerias com nomes famosos no forró, como Tarcísio do Acordeon e Xand Avião. O talento que o levou até aqui veio sendo maturado desde a infância: entre os 5 e 6 anos, Guilherme "já fazia barulho" com os objetos que podia, por exemplo, com uma garrafa plástica batendo na mesa.

Influência do forró e da música clássica

Em pouco tempo, o que antes era um batuque de mesa, se tornou uma melodia produzida por um teclado quando ele, ainda criança, foi matriculado em aulas do instrumento. Foi durante essas aulas que mais um talento foi encontrado: o professor de Guilherme descobriu que ele tinha ouvido absoluto — isso significava que ele poderia identificar qualquer uma das notas que escuta, sejam musicais ou outros sons.

"Sabendo disso, comecei a treinar e ouvir muita música. Sempre escutei muito forró, minha escola é Mastruz com Leite e Luiz Gonzaga — escutava bastante. Na verdade, era só que ouvia", relembra. Parecia quase como uma premonição do que estava por vir futuramente.

Aos 14, o artista viu surgir a oportunidade de morar em São Paulo e estudar piano no Conservatório Musical Souza Lima, "enfrentando mais esse desafio", em suas palavras". Comparando os dois instrumentos musicais, piano e teclado, ele relata:

"O piano é outra coisa, ele tem outras técnicas e eu resolvi pegar esse desafio. Passei três anos em São Paulo, dos 15 aos 18 anos, estudando. E lá aprendi bastante coisa, toquei nessas bandas de baile, casamento e formaturas; toquei muito em restaurantes fazendo piano instrumental. Tive essa bagagem".

Aos 18, optou por retornar ao Ceará para perseguir outro sonho: aprender a tocar sanfona. Toda a bagagem de conhecimento que havia adquirido nos últimos anos com os dois outros instrumentos foram reunidos para esse novo estudo, realizado por conta própria. "Juntei a paixão que tinha pelo forró e fiz daquilo meu projeto de vida", arremata.

"Não sabia como, porque nem sempre sabemos o caminho, mas já tinha esse sonho (carreira como cantor) plantado no meu coração. Eu sempre cantei, apesar de que não tive muitas oportunidades — tinha mais como músico, como tecladista. As bandas que eu tocava tinham cantores", conta, completando em seguida:

"De vez em quando, pedia uma oportunidade: 'Olha, quando puder um dia, se der certo, me chama para cantar alguma coisa'. Sempre pedi para os cantores que toquei para dar uma força, um tempinho para cantar uma música".

O que mais "impulsionou" Guilherme na carreira foi a composição. Para ele, compor é como uma terapia e um estímulo para a mente devido à escrita — é "incrível", em suas palavras. As abordagens nas letras podem variar: histórias cotidianas, "do povo, de sentimento". "As minhas músicas são muito românticas, têm histórias de tudo que for relacionamento, ligadas aos sentimentos: desde amor que deu certo, uma traição ou término".

Trajetória musical e comentários negativos

Ao longo desta trajetória musical, comentários negativos sobre sua deficiência visual, mencionada no início deste texto, foram alvos de comentários negativos de pessoas que estão no mercado musical. Era comum escutar falas como "será se é bom mesmo?" ou "mas será que ele faz um show legal?". A equipe também chegou a mencionar sobre olhares que já recebeu ao chegar em locais em que teve apresentações contratadas.

"Nunca deixei que isso me diminuísse ou que me desencorajasse. Mas escuto bastante, mesmo hoje com uma carreira de tantos anos, ou tendo resultados muito bons, como as parcerias, ou já ter tocado em todos os estados do Nordeste. E por que eu falo dos resultados? Porque se alguém vier tentar me diminuir por causa da deficiência, posso mostrar o que consegui", sustenta.

Ele também avalia que a sociedade não ajuda no encorajamento para que pessoas com algum tipo de deficiência engajem projetos artísticos, apesar de destacar que também há situações pessoais com a família que podem não estimular esse talento. "Duas coisas que preciso deixar aqui: é preciso que todo artista que tenha alguma deficiência, em qualquer linguagem, acredite em si próprio e não ligue para a opinião dos outros. Procure fazer coisas que dê resultados", inicia.

E continua: "O segundo ponto é um recado para quem contrata, que está na outra ponta. Podem ter certeza, o que o povo menos está ligando é para a deficiência de alguém. As pessoas querem saber do talento, daquilo que o artista tem para oferecer".

Animado e feliz pelos resultados conquistados nos últimos anos, Guilherme Dantas lançou em 2024 o projeto audiovisual "Prazer, Guilherme Dantas", trazendo participações como Dorgival Dantas e recursos de acessibilidade para o público. Para quem chega, é apresentado ao recomeço de uma carreira de 12 anos que só tem planos e sonhos de expansão.

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