Cynthia Pettrus lembra bem de quando ingressou no rock. Foi aos 12 anos, no início dos anos 2000, que começou sua trajetória musical. Inicialmente, se apresentava em casas em diferentes bairros, mas depois passou a tocar em estabelecimentos mais centrais, como na Praia de Iracema. Noise 3D e Órbita foram alguns dos espaços. As casas de rock também marcaram gerações de músicos.
Hoje com 35 anos, a cantora recorda o período: "Tinha um namoradinho e sempre íamos para a Sexta do Rock no Órbita. Ele me pediu em casamento lá. Foi bem legal. Não estamos mais juntos (risos), mas era um ambiente muito diferente e muito legal. Eu me senti bastante acolhida pela comunidade roqueira de Fortaleza. Éramos muito unidos".
Para Cynthia, antigamente as casas eram marcadas pela informalidade e até pela "precariedade" em alguns momentos. Ela relata qualidade inferior dos equipamentos de som, diferentemente de hoje, em que percebe um cuidado maior. Entretanto, compreende a cena do rock "menos aquecida" atualmente.
"O diferencial que vejo da programação era a possibilidade de ter infinitas bandas tocando, porque eram realizados muitos festivais, existiam bandas diferenciadas por ritmos dentro do rock, não havia uma 'panela' de grupos que tocavam, era bem aberto. Hoje, a cena é um pouco mais restrita", analisa.
Frequentador da "multifacetada cena fortalezense" desde 1995 e músico desde 1997, o guitarrista cearense Márcio Benevides tem "ótimas lembranças" dessa época. Ele ia a casas como Jokerman, Padang Padang, Domínio Público, Gaia, El Bodegon, Casarão, Clube Santa Cruz, Brom's, Acervo Imaginário e 369.
Com passagens por "várias bandas e diversos estilos", foi um dos fundadores da banda Plastique Noir. Quando começou a se apresentar com o grupo em 2006, "tocou o terror" na Noise 3D e no Hey Ho. Em pouco tempo, passou a tocar em toda a Cidade e rodou pelo País - "uma época intensa e muito louca".
"Tudo era feito na raça, com recursos quase sempre escassos. A tosqueira era suplantada pela vontade de a gente se expressar e curtir o momento. Apesar do grande número de bandas, quase não havia o profissionalismo ao qual hoje chegamos (que se fortaleceu ali por 2007), fora a tecnologia, que foi se popularizando e facilitando a produção", destaca.
Para Márcio, houve uma "gourmetização" dos espaços, que investiram mais em infraestrutura (ar-condicionado, decoração e mobília) e redes sociais. Com isso, ficaram mais confortáveis, mas o movimento também refletiu "certa elitização", em que "a periferia não se mistura mais tanto com a Aldeota".
Por outro lado, percebe "reterritorialização", pois se antes a maioria das casas de rock se concentrava na Praia de Iracema, hoje o "burburinho rocker underground" anima sobretudo o bairro Benfica, a exemplo de locais como Barbarians Pub, Covil, Esconderijo e Snake Bar.
O ex-guitarrista do Plastique Noir também pesquisa sobre a cena de rock underground em Fortaleza, resultando tanto na sua dissertação de mestrado (2008) quanto na sua tese de doutorado (2019). Como afirma, a "Idade de Ouro" da cena na Capital ocorreu entre 2006 e 2016, com a massificação da internet, emissora voltada ao público jovem (TV União), surgimento de voos espaços e com a Cidade como sede de eventos nacionais e internacionais.
Segundo o sociólogo, "A Idade da Ferrugem" do rock em Fortaleza se deu a partir de 2017 - quando "o rock parecia ter deixado de ser a música jovem" - e a pandemia. Para ele, porém, o rock vem recuperando espaço desde 2022.
"Em Fortaleza, a cena gótica, por exemplo, cresceu de uma forma que eu nunca imaginei quando desbravamos a mata semivirgem das trevas em 2005", acrescenta. "Ainda perdura a chama da paixão pelo rock, que mobiliza centenas de adeptos em Fortaleza", indica.