"Coisa maluca, esse medo de mim. Eu não mordo e se mordo é pra me ver feliz", é assim que começa a música "Coisa de Saudade", de Ana Frango Elétrico, apresentando uma mistura de indie rock, MPB e jazz, além de transmitir a sensação de se estar escutando uma composição feita nos auge dos anos 1980 e com inspirações evidentes em Rita Lee.
A obra faz parte do segundo álbum do cantor carioca, "Me chama de gato que eu sou sua", que possui nove faixas. Seu nome verdadeiro é Ana Fainguelernt e ganhou destaque na cena musical independente em 2018, com o disco "Mormaço Queima".
Pela primeira vez em Fortaleza, ele se apresenta nesta sexta-feira, 13, na terceira edição do Fotofestival Solar, que acontece no Complexo Cultural Estação das Artes. Em entrevista ao Vida&Arte, Ana conta mais sobre suas obras, inspirações e experiência com a produção, principalmente com a banda Bala Desejo, com a qual ganhou o Grammy Latino em 2022, como co-produtor musical.
O POVO - Como você desenvolveu o interesse pela música e pela forma como ela é feita e construída?
Ana Frango Elétrico - Desde pequeno eu convivo com a música. Minha mãe ouvia muita música em casa, no carro, muita música brasileira e também o pop americano dos anos 1980. Acho que essa é minha primeira referência. Conforme fui crescendo, fui travando contato com outras sonoridades, através de amigos, de descobertas minhas, que ampliaram o meu horizonte musical. Nada excepcional, me parece que aqui no Brasil a música é antes a regra do que a exceção.
O POVO - Como funciona essa experiência assumindo a produção? Quanto você aprendeu, quanto ainda quer aprender e o que muda, durante a feitura de um disco? Em especial na banda Bala Desejo, que venceu o Latin Grammy 2022, como foi essa experiência?
Ana Frango Elétrico - A produção, para mim, não é exatamente uma novidade: fui produtora de todos os meus álbuns até aqui, só que antes tinha outras pessoas ao meu lado, me auxiliando a chegar nos lugares que eu imaginava. Acontece que, no meu terceiro e último álbum, a partir de tudo que vivi e aprendi nesses últimos anos, pela primeira vez me senti seguro para assumir essa condução. E uma vez que as pessoas, os artistas perceberam o que eu estava fazendo como produtor, elas começaram a se interessar e a me chamar para produzir. Já são quase dez discos, entre lançados e ainda no forno, que eu participo da produção. Eu penso a música de uma maneira artística e gráfica, gosto de pensar da composição, passando pela produção até a capa.
O POVO - E ainda falando do seu trabalho como produtor, o que você acha que vem mudando na forma como as pessoas encaram a produção e se informam sobre ela?
Ana Frango Elétrico - Acho que a internet é esse ponto chave. Aprendi e aprendo muito na internet, me informando e pesquisando como produtores e engenheiros que eu gosto faziam e fazem. Até hoje, quando vou gravar algo que nunca gravei, pesquiso como grandes engenheiros costumavam fazer. E também com muita liberdade pra inventar e saturar experiências.
O POVO - Seu nome artístico é uma brincadeira com seu nome de registro e você falou de como é um alter ego seu. Você pode me contar um pouco do processo de formação dele?
Ana Frango Elétrico - Essa história é engraçada: de tanto as pessoas me perguntarem, e de tanto eu contar - e quem conta um conto, aumenta um ponto - você vai encontrar mil versões por aí. E eu até prefiro assim, em aberto. Pode escrever que foi por conta de um choque quando era criança, que botei o dedo na tomada e nunca mais fui o mesmo… risos. Não foi algo conceitual milimetricamente pensado, foi algo que aconteceu a partir do meu sobrenome impronunciável, Fainguelernt. Tinha a ver com o "Clara Crocodilo", liberdade artística, outro nome, mulher homem bicho, personagem.
O POVO - Como você caracteriza essa nova cena musical que está acontecendo no Brasil?
Ana Frango Elétrico - São muitas cenas, graças a Deus. Se não seria um saco.
O POVO - Como funcionam suas parcerias musicais com artistas brasileiros, a exemplo de Marina Lima?
Ana Frango Elétrico - Minhas parcerias são sempre através da música. Conexões que surgem a partir de semelhanças que são encontradas dentro da minha obra. E às vezes tenho a sorte de elas esbarrem em ídolos meus e eu ter essa troca com referências.
O POVO - Quais suas principais referências?
Ana Frango Elétrico - Acho que minhas referências são muitas e vão além da música. Vão mudando de acordo com os projetos e pesquisas também. E aí, claro,tem coisas clássicas que ouvi muito.
O POVO - O álbum "Me Chama De Gato Que Eu Sou Sua" evidencia seu amadurecimento técnico e estético, onde você também dirige, canta, compõe, toca e assina a produção musical. Como funcionou esse processo?
Ana Frango Elétrico - Funcionou de forma natural. Basicamente a produção musical ditou esse processo. Acho que é meu primeiro disco que trata do meu gosto pessoal mais do que um processo/projeto/ideia.
O POVO - Acha que trabalhar gênero e identidade é cada vez mais necessário e esclarecedor para as produções musicais?
Ana Frango Elétrico - Não. Acho que o importante na produção musical é a textura e o conceito. E aí você ser fiel e tentar traduzir o artista que você trabalha de forma original e verdadeira.
O POVO - Essa vai ser sua primeira vez em Fortaleza. O que o público pode esperar dessa apresentação?
Ana Frango Elétrico - Vai ser um show especial porque vai ser o último do ano, de um ano que nunca fiz tantos shows. Muitos aprendizados, equipe completa, será uma festa de despedida e acho que o público pode se preparar pra sair suado. O show começa e termina pra cima, com um respiro no meio pras baladas do disco e do meu segundo álbum. Então espero que, nesse show, se traduza esses aprendizados do ano de muito giro. Meu último show do ano é o primeiro em Fortaleza. Estou bem animade.
Ana Frango Elétrico em Fortaleza