Das tantas palavras que podem definir o americano Arto Lindsay enquanto artista, “múltiplo” certamente é uma das mais precisas. Ao longo de mais de 40 anos de carreira, o compositor, cantor, produtor e artista multimídia ficou notabilizado pela experimentação, com projetos que trafegam da música às artes visuais e à instalação.
Conceituado, o músico retorna a Fortaleza para uma semana recheada de atividades. A primeira ocorre neste domingo, 15, no Museu da Imagem e do Som do Ceará (MIS-CE), quando faz show que dialoga com membros de casas de matriz afro-brasileira e de umbanda do Ceará. Ele também participa de residência artística.
Nascido nos Estados Unidos em 1953, Arto veio com os pais missionários ao Brasil aos 3 anos e se instalou na cidade de Garanhuns, em Pernambuco. Em 1970 voltou aos Estados Unidos, onde se formou em Literatura e Teatro. Ele fundou a banda DNA, referência no No Wave, movimento artístico underground que rejeitava os elementos comerciais do gênero new wave, popular naquela década.
A carreira é marcada por álbuns solo e participação em discos de artistas brasileiros e estrangeiros, como Caetano Veloso e Laurie Anderson. Ele também se dedicou a instalações sonoras e desfiles de rua que unem música, tecnologia e coreografia a alimentos alegóricos. Trabalhos com Matthew Barney em Salvador em 2004 são um exemplo.
Segundo Arto Lindsay, o desejo de experimentar e a ambição por novas possibilidades artísticas vem desde a juventude, porque cresceu em um lugar “onde soluções eram necessárias”. Desde criança observava pessoas “aproveitando o que os outros jogavam fora e as pessoas buscando soluções”.
Foi uma época também de “liberdade pessoal”, em que não tinha problemas de segurança e tinha “muito para conhecer”. Depois, na adolescência, a música popular tanto brasileira quanto internacional era lugar de experimentação.
“Jimi Hendrix, meu grande ídolo, era um cara que tocava música baseada nos blues, mas que fez uma pesquisa sonora profunda. Foi muito longe com a guitarra elétrica. Os próprios Beatles, as batidas novas do João Gilberto, de Jorge Ben, as experimentações dos tropicalistas, Caetano, Gil… Quando comecei a fazer música pensei que era para isso mesmo. Era para experimentar e ir mais longe”, destaca.
O músico relata que de alguma forma “se sente brasileiro”, tanto pela sua criação quanto pelo que escutava. Ele, porém, “não se preocupa muito com essa história” de nacionalidade. “Meus pais são americanos, mas também me sinto bastante brasileiro. Não é uma preocupação minha. Acho que a biografia da pessoa é só uma parte do resultado artístico. Ela também tem a possibilidade de sair inventando, de querer ir além. A geografia e a história do lugar onde crescemos são importantes, mas não são tudo”, pontua.
Na carreira, o guitarrista produziu discos de artistas brasileiros como Caetano Veloso, Marisa Monte, Tom Zé, Gal Costa e Carlinhos Brown, mas também se dedicou a projetos próprios, como os recentes “Cuidado Madame” (2017) e “Encyclopedia of Arto” (2014).
Entre os momentos históricos de sua trajetória, lembra de quando montou bandas como as jazzísticas Lounge Lizards e The Lounge Lizards, bem como o Ambitious Lovers. Como afirma, existiam muitas ideias e muita vontade. Ele também destaca quando decidiu aprender a cantar em português, com referências à tradição da Música Popular Brasileira.
“Sempre me considerei um artista em uma definição maior, como poeta e como músico. A música utiliza todas essas referências. Você tem que se apresentar no palco igual às pessoas do teatro. Você tem que escrever letras como um poeta ou romancista. A música se integra a várias artes”, enfatiza.
A passagem de Arto Lindsay por Fortaleza é recheada de atividades, indo de shows à residência. Os passos do músico passam primeiramente pela praça do Museu da Imagem e do Som do Ceará (MIS-CE), com show neste domingo, 15. Às 17h30min, ele revisita canções de sua discografia e de parcerias com compositores.
Além disso, leva ao público peças sonoras, músicas e procedimentos criativos em torno de seu repertório como compositor, cantor e performer. Nesta apresentação, ele dialoga com membros de casas de matriz afro-brasileira e de umbanda do Ceará reinterpretando pontos e batuques. A direção musical e de pesquisa é do compositor e instrumentista Eric Barbosa (que realiza os processamentos sonoros ao vivo) e Arto Lindsay.
O músico americano também age em parceria com Barbosa na residência “Narração e abstração na performance”, realizada no Porto Iracema das Artes na próxima quinta-feira, 19, e sexta-feira, 20. As inscrições já foram encerradas. A dupla aborda “abstrações, referenciais, sonoridades e discurso no âmbito da arte contemporânea”.
Essa não é a primeira vez na qual Arto visita o Porto Iracema das Artes. Em 2017, ele deu a masterclass “Se a música é uma casa, o que é que está no telhado?”, em que tratou das aproximações entre a linguagem sonora e outras expressões artísticas, em especial as artes visuais.
No período, Lindsay orientou o projeto “Ode ao Mar Atlântico”, do qual Eric Barbosa fez parte. O grupo responsável pelo trabalho desenvolveu uma obra instalativa, que resultou em performances sonoras, instalações e álbuns musicais. Nesta residência, o americano examinará propostas sonoras de cada participante e discutirá também a história da performance nas artes visuais. No próximo sábado, 21, é a vez do Anfiteatro Dragão do Mar receber ambos os artistas para apresentação.
Como próximos passos, Arto Lindsay segue fazendo discos de canções - ele, aliás, já tem um finalizado, mas está atrás da “melhor maneira de lançar”. “Continuo também fazendo discos mais abstratos e ‘experimentais’. Não sei se ‘experimental’ é o termo certo, porque já fazemos isso há muito tempo, o que as pessoas chama de ‘experimental’ é um jeito de trabalhar que não é mais novidade”, complementa.
Arto Lindsay no MIS
Quando: domingo, 15, às 17h30min
Onde: MIS (Av. Barão de Studart, 410 - Meireles)
Gratuito