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Lázaro Ramos comenta novo filme de diretor cearense em entrevista exclusiva
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Lázaro Ramos comenta novo filme de diretor cearense em entrevista exclusiva

Novo longa-metragem cearense "Feito Pipa" estreia em 2025 com Lázaro Ramos e produção de Allan Deberton
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Foto: Paris Filmes/Divulgação "Feito Pipa", longa cearense com Lázaro Ramos, é ambientado no Ceará

Lázaro Ramos é protagonista do longa-metragem cearense "Feito Pipa", obra de Allan Deberton que acaba de ser gravada em Quixadá e estreia no segundo semestre de 2025. O projeto foi comemorado pelo ator, que conheceu o diretor pelo seu filme de estreia, "Pacarrete" (2019).

A nova produção acompanha Gugu (interpretado por Yuri Gomes), um adolescente queer de 11 anos que vive com sua avó, Dilma (Teca Pereira), que está no estágio inicial do Alzheimer. Devido ao desenvolvimento da doença, o menino vai morar com seu pai, Batista (Lázaro Ramos), que é homofóbico e não aceita o garoto da forma como ele é.

Além dos atores que protagonizam a história, "Feito Pipa" traz no elenco Georgina Castro, Carlos Francisco, Alda Pessoa, David Santos, Neidinha Castelo e os atores mirins Luan Vasconcelos, Beatriz Carwile, Pablo Vinicios, Nathyel Martins, Manuela Paulino e Enzo Takeshi. Confira entrevista com Lázaro Ramos sobre seu novo projeto com o cineasta cearense. (Colaboraram Raquel Aquino e Líllian Santos)

O POVO - Como surgiu o convite para esse filme e o que te fez aceitar?
Lázaro Ramos - Na verdade, eu me ofereci para fazer esse filme. Eu assisti "Pacarrete", o longa-metragem do Allan Deberton, em Gramado, e falei 'Olha, Alan, quando você for fazer outro filme, pensa em me convocar'. Passaram-se alguns meses e ele me enviou o roteiro do"Feito Pipa" e o pedido veio como uma grata surpresa, porque é um filme que contempla tudo aquilo que eu acredito que o cinema pode oferecer para o espectador. É um filme que provoca uma bela experiência, fala sobre um assunto absolutamente relevante, com personagens muito bem definidos, carismáticos e envolventes. Quando eu li o primeiro tratamento do roteiro, eu já sabia que eu queria fazer parte dessa família. Hoje em dia, a gente tem tantos roteiros previsíveis, que a gente já sabe como vai terminar. Às vezes a gente assiste, volta para casa com a sensação meio morna, mas não é o caso desse filme. Esse filme é para se apaixonar.

OP - Como está sendo o processo de gravação? Quais têm sido os desafios?
Lázaro - Olha, não tem sido um filme desafiador, não é assim em relação a questões técnicas. A parte de gravação está indo muito bem, porque os profissionais que estão envolvidos no filme são muito qualificados, tudo isso é muito tranquilo. Talvez o meu maior desafio seja com o personagem mesmo, porque é um personagem assim que, em alguns momentos, ele parece comigo, mas, na maioria do tempo, não tem nada a ver comigo e eu não gosto de contar um personagem rejeitando ele, eu gosto de me envolver. Eu lembro da primeira cena que fiz, que, quando eu li o roteiro, achei a mais difícil de fazer e foi logo no meu primeiro dia. Eu fiquei muito sem jeito, desconcertado, sem saber como fazer a cena. Quando eu fui assistir, eu entendi que a cena era sobre isso também, sobre essa desconexão. E aí aconteceu. As cenas que eu tenho são um desafio de levar esse coração, essa alma que o filme precisa, para não cair num lugar óbvio. Eu acho que tudo que esse filme merece é contar, com aprofundamento, as relações que os personagens têm.

OP - De que forma você está construindo o personagem do longa?
Lázaro - Eu vi sair algumas matérias falando sobre meu personagem, com a descrição que não é mais real. O Batista, para mim, é um. Cara que teve um grande amor com uma mulher e teve um filho com ela. Essa mulher acabou sendo assassinada e o filho foi criado pela avó. Ele acaba criando uma nova família, com uma nova esposa e uma filha. Ele cuida de duas casas, na verdade. Uma que ele é muito presente, apesar do trabalho como motorista de caminhão e de carro pipa, e outra com esse filho, que é de outro jeito, é um menino que grita por liberdade. O filho grita para ter o direito de ser quem ele é de verdade, e quando eles têm que conviver, o Batista não sabe como criar essa criança. Ele sabe que ama essa criança, mas ele não tem os recursos necessários para ser o pai que essa criança precisa. Eu acho que meu personagem é um cara que está vivendo a experiência do nascimento de um pai ideal para o filho. Sem uma fórmula definida, mas, conhecendo esse menino, ele passa a se permitir transformar em todos os seus preconceitos.

OP - Para além do preconceito, a trama traz as relações familiares como mote. Como você percebe a relevância de tratar esse tema, de modo a ilustrar que relações familiares não devem ser só pautas do conservadorismo?
Lázaro - Eu acho que as relações familiares muitas vezes são pautadas no abuso. A gente, de vez em quando, cai nesse erro de ser abusivo nas relações, de não escutar, de não se envolver emocionalmente, de não aceitar o outro, de manipular afetivamente. O filme trata disso. Eu acho que tem identificação geral, porque, às vezes, nas nossas famílias, a gente acaba criando esse tipo de relação. É o que eu acho bonito do filme. O ponto que ele traz a mais é sobre a possibilidade do afeto, que transforma um e outro. É isto que eu acho que a gente está oferecendo: entender onde mora essa impossibilidade do amor que acolhe o outro do jeito que ele é. Para mim, o filme é sobre isso. Eu tenho achado lindo, lindo mesmo, porque eu acho que traz um ponto de identificação fundamental para nos tornarmos pessoas melhores.

OP - Como tem sido trabalhar com Allan Deberton?
Lázaro - Estou adorando trabalhar com o Allan. Eu já intuía que eu ia gostar de trabalhar com ele quando eu me ofereci para fazer o próximo projeto dele. Ele é um cara muito gentil, muito delicado. A gente fez um trabalho prévio, que o roteiro chegou muito maduro para filmar. Isso já é uma grande vantagem. Mas, quando chega no set, ele tem um jeito de dirigir com essa delicadeza, com essa informação, criando um imaginário. Nem sempre o Alan fala coisas precisas, como 'faça assim', 'eu faço assim'. Ele cria um imaginário em nossa cabeça e a gente faz a cena. Isso é muito positivo, muito legal como diretor, aliás, é uma das características que eu procuro em diretores. Me incomoda um pouco quando, por exemplo, quando um diretor fala que não gosta de ator que pensa, 'faz aí e pronto'. Mas o Allan, não. Esse apaixonamento que ele provoca faz toda a diferença para o trabalho.

OP - Como estão as expectativas para o filme?
Lázaro - Nossa, é um filme que eu acho muito surpreendente. Eu estou cheio de boas expectativas, porque eu acho que ele não vai ser um filme que vai atingir somente a bolha de quem se interessa por esse assunto. Ele está sendo feito com tanta poesia, com tanta qualidade técnica, com tanta entrega dos atores, com tanta qualidade de direção, que eu acho que é um filme que ele vai falar com muita gente. Eu acho que o tema merece e é isso que a gente precisa. Acho que vai ser um filmão que a gente vai ter no próximo ano.

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