Em um País que perdeu cerca de 7 milhões de leitores em quatro anos, de acordo com levantamento realizado em 2024 pela pesquisa "Retratos da Leitura no Brasil", observa-se um contraste nas estantes das livrarias: capas de livros cada vez mais coloridas, edições esteticamente trabalhadas e clássicos sendo relançados com novas roupagens. O que explicaria o fenômeno no mercado editorial que valoriza e retoma o senso estético na literatura?
Para Deglaucy Jorge, gerente educacional da Fundação Demócrito Rocha, a justificativa para essa tendência é lógica, à medida que a estética do livro não é apenas um complemento, mas parte integrante da narrativa e da experiência do leitor.
Contudo, materiais exclusivos e acabamentos luxuosos, conforme agregam valor ao livro físico, também valorizam exacerbadamente sua materialidade, gerando uma falsa concepção de que possa existir um público específico para esse consumo.
"Embora essas obras não impeçam o acesso aos mesmos conteúdos em outros formatos mais acessíveis, elas podem contribuir para a percepção de que determinados livros são objetos de status. De certa forma, essas edições também podem reforçar a ideia de exclusividade e, consequentemente, de elitização", pontua.
O doutor e mestre em Design, com pesquisa em livro e narrativa digital interativa, explica, ainda, que a pandemia não criou essa tendência, mas acelerou a busca por formas de valorizar o livro físico. "Evidenciou a necessidade de reinvenção do livro físico, explorando seu potencial estético e emocional para competir com a crescente digitalização da leitura", afirma.
Para o diretor editorial da Planeta, Felipe Brandão, o trabalho estético que vem sendo ampliado na editora está diretamente atrelado a esse cenário, consistindo como uma estratégia para resgatar o valor do livro físico, a partir da experiência que só o formato impresso pode oferecer.
"Esses detalhes não só aprimoram a experiência sensorial do leitor, mas também transformam o livro em um objeto de desejo e colecionável. Sem falar que, quando essas características são pensadas de maneira cuidadosa e com propósito, elas conseguem criar uma conexão emocional com o público", justifica.
Englobando todas essas razões, Tayná Pantoja busca uma explicação para a sua coleção de mais de 500 exemplares, que conta com diversas edições especiais. No fim, ela conclui que a justificativa é afetiva.
Na oitava série, a adolescente se encantou com "A Última Música", de Nicholas Sparks, sem saber que aquele seria o primeiro livro que iria compor a sua extensa estante literária. Passando por séries clássicas como "Harry Potter", a jovem contou com a ajuda da mãe e da avó, que lhe davam R$ 50, valor integralmente destinado a sebos no centro ou à feira de livros usados que acontecia na Praça dos Leões.
Hoje, aos 25 anos, a estudante de moda afirma que manter esses exemplares é também uma forma de relembrar as diferentes versões de si mesma. "Quando leio, quero sair do corre-corre cotidiano, e busco um envolvimento e imersão na história. Acredito que cada detalhe desses engrandece a experiência, pois aproxima a história do leitor e torna a narrativa mais palpável", defende.
Orgulhosa de sua coleção, Tayná não deixa de apontar uma contradição: "A valorização estética traz benefícios, mas também surgem absurdos em relação ao valor. Estamos falando de um momento em que a leitura decaiu e, ao mesmo tempo, estão sendo priorizadas edições que custam R$ 150", argumenta.
Como solução, a supervisora de comunicação aponta para ações que permitam que essas edições circulem de forma livre pela Cidade. "Não tenho medo de emprestar ou de que o livro se estrague. Mesmo que meus livros sejam de coleções especiais, gosto que eles tenham marcas, pois o livro é vivo. Futuramente, penso em criar uma biblioteca comunitária, pois é gratificante ver o acervo que tenho em casa", finaliza.