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Alunos da UFC realizam desfile de moda no Lar Torres de Melo
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Alunos da UFC realizam desfile de moda no Lar Torres de Melo

Com criação de alunos da Universidade Federal do Ceará, projeto "Vestir com Emoção" leva moda autoral e desfile criativo ao Lar Torres de Melo
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Estudos de Ícaro Andrew para o projeto
Foto: Ícaro Andrew/Acervo Pessoal Estudos de Ícaro Andrew para o projeto "Vestir com Emoção"

Após seis anos desde a última realização, o projeto "Vestir com Emoção" retorna às atividades na quarta-feira, 19. A iniciativa está na 5ª edição e promove desfile de moda com criações realizadas pelos alunos do curso de Design de Moda da Universidade Federal do Ceará (UFC). A professora universitária Araguacy Filgueiras conta que idealizou o projeto em 2015, durante uma visita realizada ao Lar Torres de Melo. À época, pensou junto a uma assistente social: "por que não fazer uma ação de moda aqui?".

"Em qualquer lugar que a gente for falar de moda, principalmente em comunidades, a primeira coisa que se deve pensar é no desfile, porque ele é o mais prático, mas não se faz da noite para o dia. Aí eu pensei nessa ideia porque eu tenho uma disciplina que se chama 'Ergonomia de Produto' e trata do desenvolvimento dos processos e procedimentos", diz.

 

A partir dessa provocação, ela, com apoio da coordenação do curso, propôs a criação de um projeto de extensão e de uma atividade dentro da disciplina, ofertada no segundo semestre de cada ano letivo da UFC. A iniciativa começou apenas em 2016 e foi um sucesso desde então, com realizações anuais até 2019.

Na pandemia de covid-19, entretanto, o projeto pausou para resguardar a saúde de alunos e idosos. Sobre o processo de envolvimento dos alunos, Araguacy explica: "nossa primeira visita aconteceu em novembro (de 2024). Foi quando eles puderam fazer contato com os idosos pela primeira vez. Depois, passam a ir por conta própria e também no horário da disciplina".

"Neste mês, eles vão apresentar o desfile, a partir do que conversam com os idosos, conhecendo suas limitações e as histórias de vida. Os idosos gostam muito de se relacionar, de conversar", fala a professora. Sobre o conforto e a adaptação da moda aos idosos, ela afirma que esse é um dos assuntos debatidos na disciplina. Para isso, diversos elementos são pensados para a produção das peças, como tecidos e aberturas.

"Existem preocupações como o vestir e o despir daquela roupa. É entender os corpos e os tecidos, pensando na composição. Se é de linho, se as fibras são muito agradáveis ao tato da pele e, principalmente, no nosso clima, se absorve o calor e também se permite que a ventilação circule do ambiente para o corpo", destaca Araguacy.

A assistente social do espaço, Rita Sâmia, conta que o momento de receber os alunos e fazer o desfile é sempre uma euforia para os idosos, que valorizam muito a troca de experiências com os mais jovens: "quando eles ouvem falar dos alunos, ficam ansiosos e eufóricos e porque eles têm uma perspectiva diferente".

"Além disso, existe uma questão com a vaidade. Não é porque uma pessoa ficou idosa que perde seu jeito vaidoso, que deixa de gostar de ter uma roupa nova, de colocar uma bijuteria, de colocar uma maquiagem", diz Sâmia, que destaca o envolvimento maior de idosos do sexo masculino no desfile de 2025.

Aluno do curso e participante do projeto, Ícaro Andrew passou por uma situação inusitada ao chegar no Lar Torres de Melo: duas senhoras quiseram modelar para ele, Dona Hormicida e Dona Lazara. "Naquele dia, acabei me conectando com duas senhoras, ambas estão há aproximadamente dois e três anos como residentes no lar e possuem histórias emocionantes. Dona Lazara me contou sobre os estados que já passou, enquanto Dona Hormicida me falou sobre os cuidados que teve ao ser mãe solo", relata.

O jovem aponta que a absorção das histórias o fez "refletir sobre vários aspectos" para criar os looks. "Busquei a inspiração para o projeto nas histórias, características físicas e gostos pessoais das duas. Partindo do que escutei, elaborei 'moodboards' (ferramenta de organização) para direcionar a estética e guiar o processo criativo, respeitando os gostos e pedidos das senhoras", elabora.

Por se tratar de histórias diferentes, ele criou peças distintas: "para Dona Hormicida me inspirei na estética anos 1980 devido às histórias que ela me contou sobre sua época de vendedora, incorporando de maneira sutil seu gosto atual. Já para Dona Lazara, me inspirei na sua personalidade romântica e no seu nome diferenciado, segundo ela mesma".

Quem também participa da iniciativa é Raissa Moraes, sergipana que veio para Fortaleza cursar Design de Moda. Para o desfile, ela veste Graça, 77 anos, que está no lar há 18 anos. "Ela é maravilhosa e me ensinou muito durante as visitas. Além de ouvir sua história e aprender sobre força e a importância de correr atrás dos seus sonhos, independente de onde você está e do que os outros pensam, ela também me contou muito sobre o Lar Torres de Melo, que é um lugar que ela adora e que foi escolha dela ir morar lá, mostrando que há muita desinformação quanto aos lares para idosos", afirma a estudante.

A roupa que Graça deve usar é formal, a pedido dela: "ela é muito bem decidida e, desde o início, me pediu por um look monocromático e que tivesse uma calça. Atendendo aos pedidos dela, a visitei para que pudesse desenhar algumas opções de roupas até chegar exatamente no que fizesse o estilo dela".

Já Bianca Kelly, que escolheu Moda para seguir o legado de sua família e de sua terra, Maranguape, conhecida como a "terra de costureiras", trabalhou para vestir Maria Ferreira. A estudante brinca que foi escolhida pela idosa, que estava curiosa com a dinâmica quando os alunos chegaram ao Lar Torres de Melo.

"Ela tem 86 anos, é paulista, viúva e nunca teve filhos. Conheceu vários estados do Brasil e dedicou sua vida ao trabalho em indústrias. Sempre foi muito independente e me disse que gosta muito da vida e da rotina que leva", elucida Bianca.

Sobre a criação, ela explica que foi importante conhecer a narrativa de sua modelo, além dos seus gostos e desgostos. "Ouvir a história de alguém com o coração para transformar em uma peça de vestuário", define. Para Maria Ferreira, ela produziu "um vestido mais social, com recorte largo e reto, e detalhes em renda".

"A Dona Maria não gosta de roupas muito justas por conta de algumas cirurgias que fez e a causam desconforto, mas é uma mulher cheia de personalidade e muito vaidosa. Ama se arrumar - estava toda maquiada no dia em que a encontrei e disse que é assim como gosta de se ver dia a dia - e de lembrar de suas saídas e viagens. Por isso, queria uma peça que a fizesse sentir-se linda, pronta e a destacasse", argumenta a estudante.

O desfile ocorre na quarta-feira, 19, e é fechado. O acesso é possível apenas para os estudantes do curso de Design de Moda envolvidos no projeto e suas famílias.

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