Em um país que perdeu cerca de 7 milhões de leitores em quatro anos, de acordo com levantamento realizado em 2024 pela pesquisa "Retratos da Leitura no Brasil", a escolha das obras literárias que irão para a rede pública ultrapassa as premissas de atender às burocracias educacionais e preencher estantes.
Esmiuçar essa seleção é tratar de forma direta da formação literária da próxima geração de profissionais e, sobretudo, do papel transformador que um livro possui na vida de uma criança.
À medida que os processos realizados pela Seduc e FNDE são bem-sucedidos por atenderem a contextos educacionais diversos, para o professor de literatura da rede municipal, Gleison de Castro, a metodologia de escolha ainda apresenta algumas limitações.
“Embora esses processos busquem incluir uma variedade de gêneros e autores, muitas vezes deixam de lado questões sociais contemporâneas e importantes, como relações étnico-raciais e questões ambientais. Além disso, sinto falta de autores e autoras com perspectivas diferentes, especialmente de regiões periféricas, que poderiam enriquecer o acervo e promover uma maior identificação por parte dos alunos”, ressalta.
Além da representatividade, o educador revela que a preferência por gêneros considerados clássicos e tradicionais, quando é unânime entre os livros literários, gera um distanciamento dos alunos com as narrativas, um fator definidor na infância, que é quando deveria surgir esse elo entre a criança e o livro.
“Acredito que os gêneros literários alternativos, como a literatura gráfica, o conto fantástico ou até mesmo a literatura de mistério, poderiam ser mais explorados, pois são extremamente atrativos para os estudantes e incentivam o gosto pela leitura, ao mesmo tempo em que permitem discussões profundas sobre questões humanas universais. Obras como essas despertam a criatividade e conectam os estudantes com formas de expressão cultural mais inovadoras e dinâmicas”, argumenta o professor de literatura.
Para Zilvania Gomes, professora da rede municipal de educação, apesar das deficiências de alguns temas e gêneros, o processo de escolha vem melhorando à medida que fortalece a participação dos professores.
“O professor precisa, antes de tudo, ser leitor e se reconhecer como mediador, capaz de estabelecer conexões entre sujeitos e as diversas práticas de leitura. A pesquisadora Teresa Colomer (2007) é certeira quando afirma que a escola deve saber diferenciar material didático de livros literários, percebendo que a literatura exige níveis profundos de significados”, elucida.
Ao escolher um livro, Zilvania desenha uma etapa de fases mentais, que vai desde a análise do perfil da turma até o uso da linguagem literária, tema e ilustração, se houver.
No entanto, a professora de português destaca que, em um cenário ideal de educação literária, essas escolhas deveriam ser feitas pelos alunos, que, capacitados na leitura, estariam prontos para selecionar seus livros e ocupar o papel de mediadores também.
Ao ser questionada sobre as escolhas realizadas para os últimos ciclos letivos, Zilvania ressalta que já houve avanços, mas o caminho a ser percorrido para um acervo literário ideal é longo e sinuoso.
“Sei que esses temas já foram abordados, mas acredito que é necessário investir mais em memória, patrimônio, literatura afro-brasileira e povos indígenas. A escrita e leitura desses temas nos conectam à nossa ancestralidade e fortalecem o respeito”, elucida.
Entre avanços já conquistados, mas ainda carentes de melhorias, Gleison e Silvania partem do princípio comum de que a seleção realizada pelo FNDE deve ser valorizada, uma vez que obedece critérios educativos e é feita por profissionais qualificados.
“Quando agentes externos influenciam a inclusão ou exclusão de obras, muitas vezes o fazem com base em interesses ideológicos, o que pode limitar a liberdade de expressão e a diversidade de perspectivas. Isso enfraquece a possibilidade de os alunos serem expostos a diferentes pontos de vista, fundamentais para o desenvolvimento de um pensamento crítico autônomo”, finaliza Gleison.
Confira filmes que têm a escola como pano de fundo
O Sorriso de Mona Lisa
Uma professora recém-graduada consegue emprego no conceituado colégio Wellesley, para lecionar aulas de História da Arte. Incomodada com o conservadorismo da sociedade e do próprio colégio em que trabalha, Katharine decide lutar contra estas normas e acaba inspirando suas alunas a enfrentarem os desafios da vida.
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O Melhor Professor da Minha Vida
Neste longa francês, o professor François Foucault se encontra em uma situação delicada quando é transferido de seu emprego em uma instituição de elite para lecionar em uma escola pública na periferia de Paris. Mais do que ensinar, ele terá que aprender com os alunos e mudar sua visão de mundo para lidar com as dificuldades da classe.
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Escola de Rock
Um homem misterioso - que havia sido expulso de um grupo musical - se passa por professor de música em uma escola particular e, usando o rock, desperta o talento dos alunos para participar de uma competição de bandas.
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Sociedade dos Poetas Mortos
O professor de Inglês John Keating ingressa em uma escola preparatória de meninos, conhecida por suas antigas tradições. Ele usa métodos pouco ortodoxos de ensino, passando a enfrentar enormes pressões da escola e dos pais dos alunos. Com a ajuda de Keating, alguns dos jovens aprendem como não serem tão tímidos, seguirem seus próprios passos e aproveitar cada dia.
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Clube dos Cinco
Com personalidades completamente opostas, cinco adolescentes são obrigados a passar um sábado sozinhos na escola como punição imposta pela diretoria. Sem se conhecerem e sem interesses em comum, a partir da conversa e da escuta ativa, eles vão, pouco a pouco, se afeiçoando. E, diante de outras histórias de vida, vão enxergando o mundo sob novos pontos de vista.
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Operação Supletivo - Agora Vai!
Teddy precisa terminar o ensino médio para conseguir outro emprego. O atual diretor da escola é um antigo colega de classe que praticava bullying. A professora Carrie faz um teste e descobre que Teddy tem dislexia. Apesar das dificuldades, Teddy se sente querido no supletivo.
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Como acontece o descarte dos livros?
Apesar de o PNLD literário seguir os mesmos moldes do PNLD para livros didáticos, há particularidades que evidenciam diferenças na execução e, sobretudo, no descarte dos exemplares. Para os livros didáticos, ao final do ano letivo, todos os estudantes devem devolver esses livros à escola, para que sejam redistribuídos para outros estudantes no ano letivo seguinte.
Já os livros literários possuem uma permanência maior em cada instituição de ensino, que, ao fim de cada ciclo de atendimento, passam a ser patrimônio da escola, que pode disponibilizar uma parcela em seu acervo e/ou doá-los para a comunidade escolar ou entidades que prestam serviços educacionais. Para que o tempo de vida de um exemplar dure, as escolas são orientadas a realizar um trabalho de conscientização com os alunos, solicitando que conservem adequadamente os livros e evitem marcações e rabiscos.
“Quando o desgaste é excessivo e os livros são considerados inutilizáveis, eles são redirecionados para a reciclagem”, explica a Seduc.