Reinvenção. Essa é a palavra que guia “Inacabado”, novo espetáculo do grupo Bagaceira de Teatro. Parte da programação da 12ª Mostra de Artes da Porto Iracema das Artes, a montagem também celebra os 25 anos do coletivo, a serem completados em maio de 2025. A data marca a estreia da companhia no Teatro da Praia, em 2000.
Fundado por Yuri Yamamoto, Rogério Mesquita, Rafael Martins, Isabella Cavalcanti, Luiza Torres e Lívia Guerra, o Bagaceira surgiu no Festival de Esquetes de Fortaleza. Os artistas já citados se juntaram para produzir esquetes, que são peças mais curtas de Teatro. “Nessa ocasião, a gente misturava linguagens”, relembra Rafael Martins, ator e diretor do grupo.
O grupo foi se formando em torno de um processo mais experimental, algo que se tornou a principal marca do Bagaceira e acompanha também “Inacabado”. A ideia para a produção surgiu “por acaso”, segundo detalha Ricardo Tabosa, uma vez que o projeto para o qual o elenco se inscreveu não exigia uma obra pronta.
Foi a oportunidade perfeita para o Bagaceira, conforme também relembra Ricardo: “A gente queria se jogar em sala de ensaio para fazer experimentos curtos que pudessem ser faíscas de criação para futuros espetáculos”. O artista revela que havia um desejo do grupo de voltar para o propósito inicial, trabalhando mais com cenas curtas e esquetes que “apontavam caminhos estéticos de conteúdo muito diferentes um do outro”.
Era um modo do grupo de se reinventar, já que nos anos anteriores passaram por momentos difíceis, como a perda de Rogério Mesquita, um dos fundadores da companhia. “Enfim, outros integrantes foram saindo, o repertório foi morrendo, então um grupo que tinha muitas peças em repertório que poderia se apresentar com vários espetáculos diferentes, a gente se viu só com um espetáculo no repertório que era interior”.
A partir disso, o grupo se viu diante de duas questões, segundo conta Ricardo: “Então, como reflorestar esse repertório? Como construir mais peças?”, que serviram como guia para o novo espetáculo. Cujo mote é justamente uma obra que não foi finalizada, aperfeiçoada.
“A gente não estava preocupado com acabamento, com uma obra exatamente, mas acabou nascendo”, rememora o artista, que chegou a realizar experimentações com o espetáculo na Mostra Cenas Germinantes, no Festival Nordestino de Teatro de Guaramiranga.
Em 2024, o espetáculo estreou em Recife e foi quando, de acordo com o ator, a montagem “foi tomando forma”.
E conforme as apresentações vão sendo realizadas, a obra vai mudando. “Porque o espetáculo realmente tem essa característica de ser inacabado”. Para o também produtor, a instabilidade é um dos aspectos positivos do trabalho. “O bom desse projeto é que ele realmente ficou com essa cara de experimentação. Então, com essa coisa do inacabamento, a gente está sempre em processo”.
O encenador Márcio Abreu foi quem acompanhou o desenvolvimento da montagem como tutor. Os encontros aconteceram durante sete meses, tanto de modo presencial quanto on-line. “O Márcio foi a pessoa perfeita para isso, porque ele também é uma pessoa de teatro de grupo, a Companhia Brasileira é uma companhia que é contemporânea do Bagaceira, tem vinte e poucos anos também, então era a pessoa que é uma referência para a gente”, pontua Ricardo.
Débora Ingrid, Isabella Cavalcanti, Rafael Martins, Ricardo Tabosa e Tatiana Amorim compõem o elenco de “Inacabado”. A atriz e produtora Isabella, tem sido um momento marcante estar no Bagaceira atualmente, já que ela foi uma das fundadoras do grupo. Apesar de ter se afastado durante alguns anos, a artista retornou em 2023 para a companhia, depois da morte de Rogério.
Mesmo com a ausência dela, a produtora afirma que ela e seus companheiros sempre estiveram próximos e que essa volta vai além de um “reencontro profissional”. “É um resgate emocional e artístico”, salienta Isabella. “Hoje, estamos vivendo um momento de ressignificação. Nossa estreia mais recente é um exemplo dessa força e reinvenção”.
“Fazer parte dessa história agora me emociona, pois estou ao lado de pessoas que admiro imensamente, artistas gigantes que marcaram a história do teatro cearense”, destaca a atriz. “Mais do que isso, tenho a chance de contribuir para a continuidade desse legado, celebrando os 25 anos do Bagaceira e sonhando com os próximos 25”.
A coordenadora do programa Laboratórios de Criação, também comemora a presença do grupo na iniciativa em um ano tão emblemático. “É uma honra pra escola Porto Iracema ter, dentre os selecionados para o Laboratório de Teatro, o Grupo Bagaceira, especialmente neste ano em que o coletivo completa 25 anos”.
Para ela, é um modo de consolidar a relevância de políticas públicas para a cena artística e cultural. “Sendo o Bagaceira uma referência para o teatro cearense e brasileiro, consideramos essa experiência do Grupo na Porto Iracema como mais uma possibilidade de afirmar na escola o exercício de permanente reflexão e construção cotidiana”.
12ª Mostra de Artes da Porto Iracema das Artes
Espetáculos de dança e música também fazem parte da 12ª Mostra da Porto Iracema das Artes. “Carnaval do Futuro” é um dos destaques na área musical, trabalho da banda de rock experimental Pira Coletiva. Com tutoria de Russo Passapusso, o EP traz uma reflexão sobre uma das principais festas brasileiras, segundo Lucas Montalto, um dos membros do grupo.
A produção surgiu a partir dos questionamentos sobre como o dub e o rock podem adentrar no cenário carnavalesco. O trabalho tem inspirações no rock Massafeérico, na Massafeira Livre no Movimento Armorial. O artista traz esses movimentos de referência como uma forma de compreender a relevância de quem veio antes na luta pela valorizaqção da cultura nordestina.
“Faz com que entendamos o que já foi feito, quem fez, onde chegou, parou e porque talvez não alcançaram a magnitude merecida, para que assim possamos buscar novos caminhos e dar continuidade a essa luta”, destaca o artista, que divide a banda ao lado de OTER.P e Skilo.
Espetáculo "Inacabado"