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13 de maio: historiadores debatem como a data se faz presente em Fortaleza
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13 de maio: historiadores debatem como a data se faz presente em Fortaleza

O 13 de maio é palco de duas datas importantes na Capital; historiadores discutem como a data se faz presente nos dias de hoje
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FORTALEZA-CE, BRASIL, 09-05-2025: Espaços com nomes de Abolicionistas. Na foto, a Rua Dragão do Mar. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo) (Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS FORTALEZA-CE, BRASIL, 09-05-2025: Espaços com nomes de Abolicionistas. Na foto, a Rua Dragão do Mar. (Foto: Fernanda Barros/ O Povo)

Todo 13 de maio, devotos fortalezenses se encaminham em uma procissão a caminho da Paróquia Nossa Senhora de Fátima para celebrar o dia dedicado à santa padroeira. A data marca a primeira aparição da divindade para os três pastorinhos - Jacinta, Francisco e Lúcia - que aconteceu na cidade de Fátima, em Portugal, em 1917.

Vinte e nove anos antes, no mesmo dia, a princesa Isabel assinava a Lei Áurea, documento que tornava a escravização de pessoas negras no Brasil ilegal. Contudo, no Ceará, o comércio e o emprego de trabalho escravizado haviam sido abolidos em 1884 - começando na cidade de Redenção e depois na Capital - com levante orquestrado por escravizados e libertos.

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A primeira cidade alforriou 116 pessoas negras em 1º de janeiro em 1883, em um movimento que teve participação dos próprios escravizados e da Sociedade Cearense Libertadora - formada por Martinho Rodrigues, Justiniano Serpa, Liberato Barroso, padre Silveira Guerra, João Cordeiro, general Antônio Tibúrcio Ferreira de Sousa.

Em Fortaleza, a proibição da escravização de pessoas negras ocorreu em 25 de março de 1884. A legislação foi assinada após uma série de levantes realizados pela população preta, em maioria liderados por Preta Tia Simoa, Chico da Matilde - o "Dragão do Mar" - e Ana Sousa - a "Aninha Gata" -, que barraram o tráfico de pessoas escravizadas realizado internamente.

13 de maio e 25 de março

Desde 2011, a data virou feriado no território cearense, diferente do 13 de maio, no qual a simbologia religiosa acaba tendo maior protagonismo. Para Cícera Barbosa, historiadora pela Universidade Federal do Ceará (UFC), essa distinção se deve à mudança de perspectiva sobre quem de fato protagonizou a emancipação da população preta no Brasil.

"Não é mais a Isabel que deu a liberdade, e sim as pessoas negras que através dessas estruturas de coletividade, ancestralidade, dos terreiros, dos quintais, das religiões de matriz africana, das rodas de capoeira, dos congos, da resistência mesmo, foram acolhendo uns aos outros, construindo as suas noções de liberdade", argumenta a também mestranda em História pela UFC.

O coordenador especial da promoção da Igualdade Racial do município de Fortaleza, Isaac Santos, destaca que, para a Cidade, faz mais sentido celebrar e lembrar o 25 de março em vez do 13 de maio, principalmente porque a segunda data é atravessada pela devoção. "Até que você tem a avenida 13 de maio, que faz referência então ali à aparição mariana que existe em Portugal, a primeira aparição mariana que existe em Portugal. Então, seria nesse sentido", defende.

"Mas em relação à questão da escravidão, a gente tem esse propósito de reivindicar muito mais o 25 de março do que o 13 de maio", continua o especialista. "Fortaleza foi palco de várias ações que foram decisivas no processo de fim da escravidão, como a greve dos Jangadeiros, por exemplo", detalha o professor sobre o levante liderado por Chico da Matilde e Preta Tia Simoa, na Praia do Peixe, em 1881, que foi fundamental para a abolição em todo o País.

Isaac não tira a relevância do 13 de maio, afinal, foi resultado de lutas não só do 25 de março, a chamada Data Magna cearense, mas também da Revolta dos Malês na Bahia (1835); da Conjuração Baiana (1798); da Balaida (1838-1841), no Maranhão; da Revolta de Manoel do Congo (1838), no Rio de Janeiro; da Seita do Divino Mestre (1846), em Recife; e tantas outras manifestações lideradas por negros libertos ou escravizados em todo o Brasil.

O cientista social Hilário Ferreira lembra que, apesar dos esforços para alcançar a emancipação e findar com o trabalho escravo, as duas legislações oficializadas não trouxeram políticas de integração para os escravizados. Segundo o também mestre em História pela UFC, não houve uma preocupação em oferecer possibilidades de melhores condições de vida para as vítimas do regime escravocrata.

Assim, desde sua chegada no País, pessoas negras tiveram que lutar para sobreviver e ter acesso a coisas básicas, como educação e saúde. "Então, o 25 de março aqui, a gente não poderia, de certa forma, analisando profundamente, dizer que houve libertação, porque a condição da população negra até hoje, 2025, é claramente marginal", afirma Hilário, que é também doutorando em História pela UFC.

"Originalmente, grande parte dos desempregados continuam sendo negros, dos sem-terras, as condições das comunidades e das comunidades negras e quilombos, é marcada pelos conflitos, tentativas de retirá-los desses territórios, então essas mesmas condições elas ocorrem nacionalmente", conclui o docente.

 

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