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As vilas onde o Ceará nasceu: 16 municípios que originaram (quase) todos os outros
Reportagem Especial

As vilas onde o Ceará nasceu: 16 municípios que originaram (quase) todos os outros

O desenvolvimento das vilas e, depois, das cidades cearenses, ao longo dos anos, foi movido por ciclos econômicos e políticos, além de elementos religiosos, culturais e sociais

As vilas onde o Ceará nasceu: 16 municípios que originaram (quase) todos os outros

O desenvolvimento das vilas e, depois, das cidades cearenses, ao longo dos anos, foi movido por ciclos econômicos e políticos, além de elementos religiosos, culturais e sociais
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Nas eleições de outubro deste ano, serão eleitos os prefeitos dos 184 municípios do Ceará e dos outros 5.386 municípios brasileiros. São os gestores eleitos mais próximos à população, ao dia a dia e aos problemas.

No caso cearense, quase todos os atuais 184 municípios  são originários de 16 vilas originais que configuraram o primeiro mapa do território estadual. Foram os alicerces originais da rede de cidades do Ceará. Algumas delas são equivalentes aos municípios com as maiores populações e IDH do Estado atual, como a capital, Fortaleza, além de Sobral, Aquiraz, Caucaia e Crato. Duas delas foram os mais importantes polos econômicos no século XVIII, em torno da criação e comércio do gado: Icó e Aracati.

Cidade de Sobral (CE), em 1957 (Foto: IBGE)
Foto: IBGE Cidade de Sobral (CE), em 1957

Completam a lista alguns dos mais importantes polos regionais do Estado: Viçosa do Ceará, Baturité, Granja, Quixeramobim, Guaraciaba do Norte, Russas, Tauá, Jardim e Lavras da Mangabeira. Todos os outros municípios partiram desses. As únicas exceções são quatro municípios vindos de territórios resultados de permuta com o Piauí, num processo confuso e que provoca disputa até hoje.

As vilas foram as menores unidades territoriais com autonomia política e administrativa da fase da colonização até o Império, no fim do século XIX. A criação delas estava atrelada ao funcionamento econômico e político da colônia. No geral, não era um foco da Coroa portuguesa ocupar o território brasileiro, mas sim protegê-lo e explorá-lo. Todo o funcionamento do Brasil colonial se deu em torno de atender às demandas do mercado internacional, seguindo ciclos: pau-brasil, açúcar, cacau, café, borracha, algodão, dentre outros.

No Ceará colonial, para administrar o território e defendê-lo de invasores estrangeiros, ocupou-se o litoral (Aquiraz e Fortaleza). Já o interior (demais vilas) foi apropriado, em suma, em decorrência da economia da pecuária, que predominava no interior do Nordeste, com os criadores de gado. Eles cruzavam o território cearense, se firmando em fazendas ao longo do caminho, em direção ao Piauí ou, de volta, a Pernambuco. Esse traçado foi muito responsável por desenhar o primeiro mapa geopolítico do Siará.

 

 

Primeiras Vilas nas Bacias Hidrográficas(Foto: Lana Mary Veloso de Pontes/Ipece)
Foto: Lana Mary Veloso de Pontes/Ipece Primeiras Vilas nas Bacias Hidrográficas

O desenvolvimento dessas vilas e, depois, das cidades cearenses, ao longo dos anos, foi movido por questões econômicas e políticas. Segundo a professora Maria Clélia Lustosa Costa, do departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC), os fatores são os mais diversos. Eles vão desde históricos — internacionais ou locais, como a Guerra de Secessão, nos EUA, ou a Independência do Brasil (1822) —, até a alta e a queda do algodão — o ouro branco —, as secas e a construção de uma malha ferroviária. Além disso, há a influência da Igreja Católica, de elementos culturais, dos povos indígenas, afrodescentes e das elites locais.

Assim, segundo o professor Alexandre Queiroz, também do departamento de geografia da UFC, as 16 formações originais não têm qualquer vantagem econômica e/ou política sobre as demais, pelo fato de terem surgido antes. Muitas foram até “superadas” por territórios emancipados delas. “A lógica cronológica não indica uma lógica evolucionista. O que vai demarcar é como a localidade vai se adaptando a cada ciclo e aproveitando as vantagens de cada período”, diz.

Queiroz explica que a conjuntura atual do Ceará está muito focada em Fortaleza e Região Metropolitana, mas que a dinâmica de influência não mudou. Essas cidades precisam seguir atualizadas nas demandas globais e políticas para se manterem influentes. “Hoje vemos isso em Fortaleza. Na complexidade das funções econômicas, na infraestrutura, sediando empresas, um aeroporto internacional, investindo em energia verde. Isso é que eu estou colocando: como a cidade está se adequando com os processos globais”, considera.

As vilas passaram a se tornar cidades, aos poucos, a partir da independência de Portugal, no século XIX. Foram elevadas a municípios só em 1889, com a proclamação da República. Muitas perderam influência no Ceará, outras se fortaleceram. Apesar destas mudanças, o estado carrega elementos do período colonial até hoje.

Na época da economia pecuária, o poder era concentrado na mão dos latifundiários, com exploração das classes mais baixas e da população indígena. Atualmente, ainda mantém-se elementos de relações políticas clientelísticas, de forte desigualdades sociais, de concentração desigual de renda e discriminação racial. As mudanças na conjuntura política e econômica modificam por inteiro as localidades, mas rastros do passado tendem a seguir no presente.

Conheça mais sobre as 16 vilas que deram origem aos municípios cearenses

 


Metodologia

Essa matéria utiliza como fonte o estudo da professora Maria Clélia Lustosa Costa, denominado Fortaleza na Rede Urbana Brasileira, além de entrevistas com a pesquisadora. Também foi contatado o professor Alexandre Queiroz, em uma entrevista exclusiva sobre o tópico. Ademais, foi utilizado o livro Formação do Território e Evolução Político-Administrativa do Ceará: a Questão dos Limites Municipais, de Lana Mary Veloso De Pontes, publicado pelo Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica Do Ceará (Ipece); e o livro A Construção do Ceará: temas de história econômica, de Cláudio Ferreira Lima.

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