Palavras, símbolos, figuras, textos e um infinito de histórias que se eternizam cada vez que um livro é aberto. Ler é um processo intelectual em que podemos encontrar significados em frases ou símbolos, e o ser humano é a única criatura com a linguagem desenvolvida o suficiente para praticá-la – em outras palavras, a mente humana é extraordinária.
“A leitura, qualquer que seja ela, é necessária, pois proporciona conhecimento. Em se tratando especificamente de literatura, essa arte que utiliza a palavra, os benefícios se multiplicam”, diz a jornalista e escritora Celma Prata, membro da Academia Cearense de Letras (ACL).
Celma cita que a literatura é sedutora, eterna, prazerosa, reflexiva, transformadora, provoca e espanta, muda as pessoas e o mundo. “Para ilustrar, trago o pensamento do saudoso poeta Ferreira Gullar, de que precisamos de arte – literatura, música, dança, artes plásticas, teatro, cinema etc. – porque a vida não basta.”
E o hábito faz bem para todas as idades. Desde a infância até a vida adulta, ler permite criar conexões e conhecer novas histórias e sensações, além de colaborar com o desenvolvimento intelectual. A escritora Caroline Chaves, mãe de Bento, 4, e Vital, 2, conta que os filhos têm contato com os livros desde os primeiros dias de vida.
“Quando eles eram bem recém-nascidos, eu lia qualquer coisa e livros meus, e eles prestavam atenção. Eu sempre digo que realmente eles não conseguem entender o contexto de uma leitura, mas eles já conseguem entender que existe um ritmo, uma cadência e um hábito”, relata.
Chaves comenta ainda que a leitura é um momento de elo, os filhos dela gostam de ler em família e isso cria memórias afetivas. “Eles pedem ‘mãe, lê pra gente’, eles gostam de estar juntos, de receber afeto, de ter esse momento. Os meninos comentam a leitura depois, eles se lembram desses momentos. É um momento muito afetuoso.”
É o caso de Madalena Hermínio, 23, que tem contato com a leitura desde muito nova. Quando perguntada sobre o que mais gosta de fazer, prontamente responde: “ler”. A jovem relata que a leitura apareceu em sua vida por volta dos 12 anos, na escola, e ela lembra que ficou encantada com o universo literário ao ler “Alice no País das Maravilhas”.
“A minha relação com os livros é a melhor que eu já tive na minha vida, porque eu sinto que na minha adolescência, quando eu estava descobrindo os livros, eles não só influenciaram a minha vida, eles praticamente a moldaram. Eu via os livros como uma válvula de escape, sempre li muito, e na pandemia foi uma grande ajuda pra mim”, relata.
Madalena diz que a leitura lhe permitiu viver experiências por meio de histórias e que isso fez muito bem, não só para o desenvolvimento intelectual, mas também para o desenvolvimento pessoal. “A leitura impactou a minha vida de uma forma gigantesca, me ajudou a trabalhar a minha criatividade, a minha escrita, mas também me fez enxergar o mundo com outros olhos”, aponta.
E como para todo hábito é necessário constância, com a leitura não seria diferente. Juracy Farias é um exemplo. Aos 59 anos, ele conta que seu interesse pela leitura surgiu nos tempos de escola com os clássicos da literatura como José de Alencar e Machado de Assis. Ele lê sobre tudo, desde romance, ficção à literatura infantojuvenil.
“O conhecimento que vem por meio das leituras oportunizam criar senso crítico. Lendo você consegue ter outra visão do que nos é contado, de certa forma, nos livros didáticos, que lá a gente vê mais o que a gente estuda para os vestibulares. Eu tinha um professor que dizia que ia passar o conteúdo pra gente estudar, mas que se a gente quisesse conhecer a história, pesquisasse na biblioteca, então sempre fui muito curioso”, relata.
Juracy complementa dizendo que gosta de estimular as pessoas. Quando presenteia alguém, prefere dar um livro para que os outros tenham uma experiência prazerosa com livros. “Eu sempre dou livros, e digo que se a pessoa não gosta, pode passar para outra, mas que passe. Porque de gotinha em gotinha a gente consegue criar um novo hábito nas pessoas.”
A leitura desperta em nós inúmeras sensações, em todas as idades. Na infância, a era da curiosidade; na adolescência, a era de conhecer mais a si mesmo; e na vida adulta, quando o aprendizado é contínuo e necessário. E nas três fases da vida, ela tem inúmeros benefícios para o cérebro.
Do neném sentindo as texturas e formatos de seus brinquedos até quando uma criança começa pegar os lápis coloridos e desenhar e escrever pelas paredes, a infância é descoberta e aprendizado. A leitura é uma das formas pelas quais é possível desenvolver o cognitivo de crianças.
“O cérebro infantil se modifica de acordo com os estímulos que recebe e o que é vivido nesta fase vai impactando diretamente, criando e modificando conexões no cérebro. Um som, uma imagem, um pensamento, um afago, tudo isso é estímulo, estímulos que vão nutrindo esta cabecinha ainda em desenvolvimento”, explica o neuropediatra André Manganelli.
O médico aponta que uma história pode conter muitas camadas de informação e que crianças abaixo de 2 anos provavelmente se atentarão para as formas e cores da imagem. À medida que sua linguagem cria repertórios, elas passam a compreender conteúdos e associações.
“Todo esse cruzamento de informações em sua cognição acaba sendo utilizado para suas criações em brincadeiras, seus pensamentos, criações e até mesmo concepções do seu dia a dia. Ler expande seu raciocínio, entendimento de mundo, enriquece suas brincadeiras e imaginação”, explica.
Além disso, a leitura é uma forma de livrar os pequenos do contato precoce com as telas. De acordo com o neurologista da Sociedade Brasileira de Neurologia Infantil, André Pessoa, a exposição precoce à tela e o excesso do uso de telas na primeira infância.
“O uso de telas é muito prazeroso, ele libera dopamina – neurotransmissor ligado ao prazer – , mais até que a leitura. E nosso cérebro fica cada vez mais dependente, com a necessidade de usar as telas. Então, a leitura anda no sentido oposto, se eu tiro o tempo de tela, e aquela criança é estimulada a ter o hábito de leitura, ela terá prazer em ler. Então, é uma saída para o uso de telas, é uma estratégia de mudança de foco”, diz.
Nas demais idades, a leitura se torna importante para a ampliação do vocabulário. O neurologista e médico do sono do Hospital Universitário Walter Cantídio, Samir Magalhães, pontua que ler fortalece a boa adequação ao idioma e fortalece as conexões neuronais.
“A leitura pode prevenir o aparecimento precoce de demências. Um dos fatores que protegem o cérebro é o conhecimento de base, ou seja, a reserva de conhecimento que o indivíduo tem. Então, quanto mais informação aquele cérebro detém, quanto mais leitura ele fez ao longo da vida, a chance de desenvolver um processo demencial – mesmo que ele apareça naturalmente – vem de forma tardia”, explica o neurologista.
Além disso, a leitura também trabalha a atenção de quem lê, a concentração e o foco. Na idade avançada, também estimula caraterísticas do nosso cérebro como a retenção de conhecimento, a formação de novos conhecimentos e novas memórias e a ativação de memórias anteriores.
“A leitura ajuda no processo de uma retenção de memória justamente por treinar efetivamente aquele cérebro na capacidade de retenção. Indivíduos que lêem têm maior contingente de conexões cerebrais, naturalmente maior conhecimento adquirido e, também por conta disso, caso sejam expostos a um quadro degenerativo, a progressão de um quadro de demência aparece com menos força", completa Samir.
“A leitura pode melhorar o bem estar mental e emocional das pessoas de várias maneiras, e na terapia cognitiva comportamental, acreditamos que a leitura é uma válvula de escape, proporcionando uma pausa mental para reduzir os níveis de estresse e ansiedade acumulados durante os dias.” É o que explica a psicóloga Vivane Menezes sobre como a leitura contribui para a saúde mental.
A pausa se torna necessária e atua como um hobby, funcionando como uma das ferramentas para enfrentar os desafios emocionais, ajudar de forma significativa no autoconhecimento.
“Além de estimular o pensamento crítico, a leitura amplia muito a percepção que temos sobre nós, sobre o outro. vejo a leitura como um hábito benéfico que contribui para a construção de uma mente resiliente, equilibrada, que pode proporcionar uma melhoria para o bem-estar emocional”, explica a psicóloga.
Como já citado, ler melhora a concentração e, por isso, é de grande ajuda para quem sofre de ansiedade pois pode desviar o pensamento ansioso. “A leitura estimula ferramentas tranquilizantes que induzem a sensação de calma, até mesmo para regular o nosso sistema nervoso, diminuir a intensidade da ansiedade, sem contar que a prática trabalha a atenção plena incentiva a respiração e contribui para a regulação emocional.”.
Por Gabriela Monteiro*
Aos 12 anos, li “O Pequeno Príncipe” pela primeira vez. Lembro-me de ter ficado maravilhada ao olhar que na capa também tinha o desenho do menininho que um dia enfeitou a farda do colégio que estudei quando era novinha, que se chamava "Pequeno Príncipe".
Foi a minha primeira experiência com a literatura e com as sensações extraordinárias que uma leitura causa em nós. E muito além de sensações, ela consegue trabalhar muitos aspectos, desde a concentração e foco até ser um passaporte para conhecermos outros mundos.
Peço licença para parafrasear “Esquadros”, da Adriana Calcanhoto. “Transito entre dois lados de um lado, eu gosto do oposto”, e não ironicamente todo leitor vive em vários mundos: o real e o imaginário. A leitura consegue nos levar a vários universos que nós mesmos criamos e, ouso dizer, que prefiro o lado oposto da nossa realidade.
Até hoje fico boba com as reações que eu tenho lendo meus livros. Eu rio, eu choro, me dá frio na barriga, sinto raiva, me apaixono e me decepciono. Tudo isso na mesma leitura. Acho que por isso eu sou tão chegada às minhas leituras, porque eu consigo me desligar do mundo real e me conectar com outros mundos.
Ler trabalhou muito a minha concentração e o meu foco, que sempre foram uma grande dificuldade para mim, além de ter sido a minha válvula de escape para lidar com certas situações desconfortáveis que vivi na adolescência.
Ter contato com os livros é se permitir ver o mundo com outros olhos, aflorar instintos criativos e imaginários que às vezes nem sabemos que temos. Todo mundo deveria ter contato com a literatura. Ela faz bem. Pro intelecto, pro emocional, pro coração. E desde pequenino.
Gabriela Monteiro, 21 anos, estudante de Jornalismo