Uma trajetória iniciada há 12 anos, mas um conhecimento de clube que ultrapassa duas décadas. A história de Everaldo Gonçalves Santana, conhecido como “Taffa” — em alusão a Taffarel, ex-goleiro da seleção brasileira —, está interligada ao Ceará Sporting Club.
Atuando como preparador de goleiros do Alvinegro desde 2012, o pernambucano de 45 anos teve passagem pelo clube de Porangabuçu como atleta profissional em 2004, sob o comando do ex-treinador Lula Pereira, e construiu a família a partir do time cearense.
Natural de Camaragibe (PE), Everaldo Santana iniciou a trajetória no futebol como jogador em 1997. A carreira durou pouco tempo, com o ex-goleiro tendo passagens por clubes do Norte e do Nordeste do Brasil e também do exterior, na Bélgica, mas sem conseguir atingir o topo do esporte. Em solo cearense, atuou em Uniclinic, Icasa, Guarany de Sobral e Ceará. Em 2011, decidiu, com muitas dúvidas, iniciar a carreira como preparador de goleiros a convite de um conhecido.
“O início, pelo fato de ter sido goleiro e o meu cunhado ter sido atacante na Bélgica, o vizinho dele, que era presidente de uma equipe, me convidou para ser preparador de goleiros e jogar na equipe e o meu cunhado para ser treinador e jogar na equipe. […] Quando retornei para Fortaleza, chegando na cidade, recebi o convite do Ceará para integrar a categoria de base. Ingressei, claro, cheio de dúvidas, é diferente de ser um atleta de futebol, onde você é comandado”, explicou.
No início, devido à inexperiência, Everaldo se questionava sobre quais treinamentos iria aplicar para os goleiros. Para isso, buscou no mundo acadêmico as respostas para as dúvidas: formou-se em Educação Física, realizou cursos e hoje tem Licença B pela Associação de Treinadores do Futebol Argentino (ATFA). A experiência obtida em mais de 10 anos de carreira o colocaram na prateleira de um dos principais preparadores do país.
O trabalho à frente do Ceará trouxe networking, potencializando o aprendizado de Everaldo Santana. O preparador, além de contatos com outros profissionais da área do futebol brasileiro, dialoga com preparadores de potências europeias, como Arsenal, da Inglaterra, e Paris Saint-Germain, da França, para entender processos e compartilhar metodologia de trabalho.
“Antigamente, quando iniciei minha carreira, a informação era muito difícil. Se eu quisesse ser treinador de goleiros, mesmo sendo goleiro, para poder saber o que é feito em algum clube, até mesmo aqui no lado, eu não tinha acesso. Teria que fazer estágio, ficar 30 dias para ver. Hoje, a informação é muito vasta. Tenho feedback de pessoas de outros países, do PSG, do Arsenal, de grandes centros, onde eles compartilham o que eles fazem”, contou.
O dia a dia do “Taffa”, ao lado de Marcos Paulo, passa por preparar os arqueiros do Vovô nos aspectos físico, tático e psicológico. Além disso, os profissionais participam ativamente da comissão técnica de Vagner Mancini, sendo, muitas vezes, responsáveis pela escalação — como voto final — do goleiro titular.
“Somos responsáveis por preparar o goleiro fisicamente, taticamente, de acordo com o modelo de jogo do treinador. Tecnicamente, ajustar as carências que tem. Mas o mais importante de um goleiro, pelo fato de ser uma posição que o erro tem que estar próximo a zero, é a parte mental. Não é só o treino que é importante, é um departamento, que a parte de confiança tem que ser extremamente importante”, pontuou.
Em mais de uma década, Everaldo teve a oportunidade de trabalhar no Ceará com goleiros de destaque no cenário nacional, como Fernando Prass, multicampeão por Vasco e Palmeiras, e Renan, bicampeão da Libertadores e campeão do Mundial de Clubes pelo Internacional.
“Você acha que vai ser mais difícil, ter vaidade, mas é totalmente o contrário. Tive o privilégio de trabalhar com todos esses nomes, mas todos eles são atletas que se cuidavam, porque tinham o entendimento da dificuldade. […] É difícil manter regularidade, eles sabem disso. Eles me ajudaram também, eu pedia para fazer e faziam, não questionavam, davam respostas com performance. Foi um aprendizado muito grande”, comentou.
“Ele (Fernando Prass) era referência de trabalho para os que estavam aqui, Richard e os outros, porque ele trabalhava muito mais que os outros. Isso me ajudava a mostrar que o cara não ganhou tudo isso não por acaso. Vejam a conduta, a disciplina, chega cedo no clube, vejam por que que ele dá resposta, por que ficou rico no futebol. Tudo tem o seu preço”, concluiu.
Durante a trajetória, o ex-jogador também contribuiu para a evolução dos goleiros do clube, incluindo os mais vencedores. Apesar da quantidade de títulos, o preparador tinha atenção para identificar cenários de dificuldade e trabalhar, individualmente, para os arqueiros chegarem ao melhor nível.
“O Ceará me deu uma oportunidade de mostrar meu trabalho, mesmo sem estar pronto para executar ele. Tinha dúvidas sobre o que fazer. Muitas pessoas não sabem quem é o preparador de goleiros do Ceará. Sou muito grato ao Ceará por ter me aberto as portas. Pessoas do Paris Saint-Germain, Arsenal e de outros países me conhecem e, por contrapartida, o Ceará, graças a isso, graças ao Ceará", pontuou o pernambucano.
"Se não tivesse trabalhando no Ceará, poderia estar até trabalhando numa escolinha, mas quem iria observar uma pessoa que trabalha em escolinha? Graças ao clube, à visibilidade que o Ceará te dá, eu sou muito grato a esse clube. Por isso sinto muito quando a equipe não corresponde em campo, os insucessos afligem muito. Não consigo dormir quando perde, fico preocupado com as consequências. Só quem vê isso é a esposa e as filhas”, completou.
Everaldo Santana revelou que alguns atletas do elenco estavam indispostos para livrar o clube do rebaixamento à Série B do Campeonato Brasileiro, em 2022. Não é o caso dos arqueiros, que foram enaltecidos por ele. À época, no duelo contra o Avaí, João Ricardo, Richard e Vinícius Machado estavam com a delegação. Este, inclusive, foi o momento mais difícil para o preparador no clube.
“Para você conseguir sucesso tem que ter abnegação, honestidade, coisas positivas. Nesse grupo (de 2022) nem todos eram assim. Não citarei nomes. Quando a equipe realmente caiu, disse para todos os três goleiros, João Ricardo, Richard e Vinícius Machado: 'Vocês levantem a cabeça, vocês honraram camisa do Ceará. Deram o melhor de vocês. O resultado de vitória não depende apenas de vocês, é do coletivo'. A equipe não era ruim”, ponderou.
“O sonho é ver o Ceará novamente brilhando (na Série A). Sou de Camaragibe, no Pernambuco, e o Ceará me proporcionou vivenciar coisas desportivamente excelentes. A minha mãe, que é pernambucana, que não acompanhava nem futebol, hoje acompanha todas as redes sociais, sabe de notícias do clube mais do que eu. Chega a se envolver em escalar a equipe, dizer jogador A ou B. Hoje minha família é toda Ceará, quando vou para Recife, tenho que levar entre 10 e 20 camisas”, revelou Everaldo.
O preparador finalizou a entrevista de quase uma hora cheio de gratidão ao clube, afinal, foi a partir do Ceará que ele conheceu a esposa, filha de dona Helena, colaborada do Alvinegro de Porangabuçu há mais de 50 anos. Em Fortaleza, casou, construiu a família e contribuiu para o sucesso do Vovô.
“A minha sogra trabalha no clube há mais de 50 anos, a dona Helena. É uma pessoa que tenho um respeito absoluto. É alvinegra de coração, está no clube desde os 14 anos. Não gosta da cor vermelha. Minhas filhas e esposa são todas Ceará. Sou um pernambucano que chegou aqui em 1999 para jogar, conheci minha esposa, casei. A história do clube, uma grande parte, é contada por essas pessoas”, contou.
Durante os 12 anos de trajetória no Vovô, Everaldo recusou proposta de seleção e clubes do Oriente Médio e da Ásia. Pela equipe profissional, conquistou oito troféus, sendo três títulos do Campeonato Cearense, três da Copa do Nordeste, um da Copa dos Campeões Cearense e um da Taça Asa Branca.
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