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Moro, Prem Baba, o divino e o humano
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Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.

Moro, Prem Baba, o divino e o humano

Arte (Foto: CARLUS)
Foto: CARLUS Arte

Pensei em escrever sobre Sérgio Moro e os procuradores tramando e conversando besteira no Telegram. Todo mundo trama e escreve besteira nos aplicativos. Pensei em comparar o conteúdo de uma entrevista que li do Prem Baba e a aura do ex-juiz transformado em super-herói num País carente por "salvadores".

Prem Baba, acusado e confesso de transar com duas seguidoras casadas, meses depois do escândalo veio a público dizer que um de seus erros no episódio foi ter se sentido "divino" e, por isso, perdido a dimensão de que era um "ser humano".

Sem querer entrar no julgamento do desvio de conduta (ética, moral ou sei lá o que) do guru, penso que ele foi feliz em reconhecer o quanto se perdeu ao acreditar que seria um predestinado deífico.

Sergio Moro, Dallagnol e Carlos Fernando teriam uma chance, feito Prem Baba, de enxergar que não são investidos de poderes celestiais na forma como nos fizeram crer nas igrejas, nos terreiros, nas mesas espíritas, nos templos evangélicos, nas sinagogas...

E também nas universidades, numa cozinha, na política, nos tribunais, nas ruas, nas redações de jornais, numa governadoria, nas procuradorias e em qualquer espaço possível de se exercer o micropoder (ou o exacerbado poder) sobre o outro.

Até compreendo a narrativa (essa palavra está se tornando chata da maneira que passou a ser usada) de Moro ao querer negar os diálogos ou tentar carimbar as revelações jornalísticas do The Intercept Brasil de criminosas. Porque a captação seria duvidosa e não tem autorização de quem detém as chaves da lei. É a defesa do homem diante do desmanche da imagem divinal.

Mas as revelações, independente dos efeitos eficientes de uma Lava Jato contra práticas escrotas de criminosos na administração pública e privada, são encaradas por quem está na outra margem do rio como contraponto a um discurso messiânico (super-heroico e justiceiro) que tomou o País. Falsos céus, falsos olimpos.

Talvez uma das versões sobre a verdade é que adoramos a hipocrisia do divino. Ela nos faz gozar ao extremo e quando a borra dos discursos vem à tona, a dimensão humana se revela como ela é.

Nisso Bolsonaro é mais humano. O cretino nele se revela límpido. Seus equívocos como ser humano estão transparentes. Ele é belicista, acredita que atirar para se defender é uma forma de convivência e política de segurança. É homofóbico. Crê que seu senso comum individual é mais importante do que o bem-estar coletivo.

Sua encruzilhada, talvez, seja ter se aproveitado do torpor de quem lhe elevou ao patamar de "mito". A fantasiosa história de um consagrado turbinado por manipulações de pastores evangélicos, bispos católicos e publicitários. "Ele sangrou por nós". Tem algo mais cínico do que isso? Sim, tem.

Moro, Bolsonaro, Lula, Dallagnol e Carlos Fernando se encontram na quimera da divindade atribuída pelos outros e acreditada por eles. Cada um com seus convencimentos, crenças e certezas. O justiceiro, o sobrenatural, o salvador, o Moisés do Egito, os paladinos...

Lula crê de verdade que não cometeu nenhum crime enquanto esteve no poder. Se houve algo de podre no derredor, se justifica porque a fome no País diminuiu, porque os pobres chegaram às universidades, porque os direitos humanos tiveram vez, porque nunca banqueiros e empresários lavaram tanto suas burras...

Moro, acuado na defensiva, não enxerga delito nem tramoias com os procuradores. Se houve alguma quebra de isenção, se justifica porque nunca se prenderam tantos corruptos de 2015 para cá no Brasil e em outros países da América do Sul, porque a Lava Jato descobriu uma sangria na Petrobras, porque nunca tantos empresários milionários foram para o xadrez...

Moro e Lula perderam a chance de traçar trajetórias feito a de José Mujica, de não misturar o interesse público com desfrute particular e partidário. Jogaram fora a oportunidade de expor defeitos e resolvê-los feito o papa Francisco, talvez o menos santos de todos.

Poderiam ter contribuído, obstinadamente e com os outros, para a erradicação de velhas crenças perenes do Brasil. Mas, não! Infelizmente, têm vocação apenas para o efêmero e alguma biografia.

Quanto a Bolsonaro, coitado! Ele é isso mesmo que está aí, não adianta se iludir. É esperar pela próxima eleição.

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