Jornalista, professora e consultora. Mestre em Políticas Públicas, especialista em Responsabilidade Social e Psicologia Positiva. Foi diretora de Redação do O POVO, coordenadora do Unicef, secretária adjunta da Cultura e assesora Institucional do Cuca. É autora do livro De esfulepante a felicitante, uma questão de gentileza
Foto: Ana Márcia Diógenes / Especial para O POVO
Portal das Estação das Artes: reflexões sobre o tempo I
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Estava caminhando no último domingo pela Estação das Artes, em Fortaleza, e uma frase, dividida e pintada em três portas da antiga estação ferroviária Engenheiro João Felipe, me levou a divagar sobre seus sentidos. Lida num gole só, demarca o tempo presente em nós. Mas, se for aberta só a porta do tempo para refletir, é possível seguir um caminho entre o ontem, o hoje e o amanhã. Na porta do presente, tanto posso ir do estar presente, como ao ganhar presente; e em nós, cabe o tempo, o presente e cada um.
As três portas e seus significados me levaram às imagens recentes do terremoto que matou mais de 37 mil pessoas na Turquia e na Síria, em números até dia 13 de fevereiro. Talvez essas imagens estejam tão fortes nos últimos dias, que eu as relacione a muitas realidades do cotidiano.
Difícil seguir a rotina sabendo que milhares de vidas sumiram em segundos, outras se esvaíram na longa, abafada e fria espera dos que morreram soterrados, e tantas definham no sofrimento da saudade de quem perdeu parentes, amigos, vizinhos e desconhecidos. Impossível não se incomodar com os milhares de sem teto, sem comida, sem trabalho, com os que sofreram ou fugiram da guerra e foram alcançados por outra tragédia.
(Foto: Ana Márcia Diógenes / Especial para O POVO)Portal das Estação das Artes: reflexões sobre o tempo II
(Foto: Ana Márcia Diógenes / Especial para O POVO)Portal das Estação das Artes: reflexões sobre o tempo III
Tempo. A palavra, dentre tantos significados nos dicionários, remete à medida arbitrária de duração das coisas. Tempo e vida estão na mesma régua de significado. A vida é a duração do tempo de cada um, e se estende pelos efeitos causados na vida do outro. Esta medida de tempo é arbitrária. Mas, quando o corte é brusco e se dá em massa, como em um terremoto desse alcance, deixa no ar a supressão de inúmeros instantes não vividos entre quem morre e quem fica.
Presente. Estar no lugar onde se fala, que está perto. São vários os sentidos do tempo presente e todos indicam que é preciso ser para estar. Em segundos, milhares de pessoas da Turquia e da Síria deixaram de estar ao alcance dos seus. Uma das imagens que marcaram esta tragédia foi a de um pai segurando a mão da filha adolescente. Ela estava morta, mas estava presente. E ele ficou presente para ela, à espera dos socorristas resgatarem o corpo. O tempo presente era de dor, e também de uma relação que se dá para além do que é visto.
Em nós. Todas estas significâncias das palavras são incorporadas em nós, na nossa fala, na nossa escrita, embora nem sempre as percebamos. A tragédia de alguém, tão distante, deve chegar fundo em todos nós. Por empatia, por respeito e também para que se reflita sobre a nossa inconstância de tempo futuro. Não somos senhores e senhoras do tempo, só passamos por ele enquanto estamos presentes. Números superlativos, como os desse terremoto, incomodam pelo absurdo da tragédia coletiva. No Brasil, nosso choque é diário e devemos ter cuidado para não banalizarmos as tragédias cotidianas dos mortos pela violência, pelo feminicídio, pelo infanticídio, pelas vítimas do tráfico, do trânsito, do suicídio. São números que se somam diariamente e fazem um cenário que não pode permitir a ninguém, com um mínimo de empatia, seguir sem se incomodar, sem refletir sobre o que fazer no tempo presente em nós.
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