Ana Márcia Diogénes é jornalista, professora e consultora. Mestre em Políticas Públicas, especialista em Responsabilidade Social e Psicologia Positiva. Foi diretora de Redação do O POVO, coordenadora do Unicef, secretária adjunta da Cultura e assessora Institucional do Cuca. É autora do livro De esfulepante a felicitante, uma questão de gentileza
É necessário que poder público e iniciativa privada se juntem e criem ilhas de bem-estar para proteger estes trabalhadores
Foto: Thais Mesquita em 28.12.2021
ParaTodosVerem: um homem pedalando em uma bicicleta. Ele carrega uma mochila térmica vermelha com a logo do iFood
Algumas situações no mundo do trabalho, principalmente as que não garantem os direitos trabalhistas, sequer deveriam existir em uma sociedade onde a preocupação com o bem-estar de todos fosse realmente uma realidade. Mas, diante dos fatos de que as grandes cidades estão tomadas pelo crescente mercado de entregadores, a grande maioria sem carteira assinada, faz-se cada vez mais necessário que o poder público e a iniciativa privada atuem para garantir a qualidade de vida desses trabalhadores.
Ano passado, o Ministério do Trabalho e Emprego fez uma consulta pública para atualizar critérios sobre atividades que devem ser consideradas insalubres devido ao calor. Até que alguma mudança aconteça, são apontadas como atividades ou operações insalubres deste porte, somente a exposição ocupacional ao calor decorrente de ambientes fechados ou ambientes com fonte artificial de calor.
Independentemente dos resultados que venham a ser divulgados, o certo é que não é mais possível pensar na insalubridade do calor apenas a partir de fontes artificiais. Basta acompanhar a rotina dos entregadores, que circulam por ruas e avenidas, em suas motos ou bicicletas, expostos diretamente ao sol.
Se antigamente o senso comum indicaria que as cidades nordestinas seriam as que provocariam mais calor nestes trabalhadores desassistidos, é importante lembrar das alterações de temperatura e clima trazidas pelas mudanças climáticas. Em fevereiro deste ano, uma onda de calor fez dez capitais do Centro-Sul registrarem temperaturas acima de 30°C. Porto Alegre chegou a 38ºC.
Em algumas cidades, a sensação térmica tem alcançado 50°C. A elevação da umidade prejudica a evaporação do suor pelo corpo, proporcionando que a percepção do calor seja ainda mais forte. Em momentos assim, o ser humano está mais exposto a ter problemas de saúde, a exemplo da desidratação.
É neste calor sufocante que trabalha por quase todo o dia, grande parte dos trabalhadores que garantem a entrega de alimentação, objetos, remédios, roupas e documentos de muitos de nós. Uma das cenas mais comuns é ver entregadores disputando sombra de árvores e prédios tentando fugir do calor. É impossível não sentir empatia por eles enquanto sociedade, e é necessário que este assunto seja discutido em câmaras de vereadores e prefeituras de todo o País.
Há alguns anos cheguei a ver, na praça Matias Beck, próxima à avenida Antônio Justa, em Fortaleza, o lançamento da iniciativa “Ponto do entregador”. Era uma ação da prefeitura, envolvendo a Fundação de Ciência, Tecnologia e Inovação (Citinova), a Secretaria da Gestão Regional (Seger), a iniciativa privada, o iFood, e a Associação de Trabalhadores e Aplicativos.
Release da época detalha que o equipamento de apoio tinha “banheiro, copa equipada para refeições, local para descanso, wi-fi, tomadas para carregamento de celular e estacionamento para motos e bicicletas”. Atualmente o equipamento não se encontra mais na praça. As últimas informações que obtive foi que atualmente o que está em funcionamento é o da Praça Portugal, resultado de colaboração entre Prefeitura e o iFood.
Fiz contato com a Coordenação de Comunicação da Citinova e soube que, em 2023, o projeto passou para a responsabilidade da Seger. E ainda que, na nova gestão municipal, a iniciativa deverá ter outro nome: Paradinha.
O fato é que a ideia é muito interessante e deveria ser tomada como ação a ser desenvolvida em todas as cidades brasileiras. Além dos entregadores, trabalhadores como carteiros, garis e outros, que têm as ruas como local de trabalho, poderiam se beneficiar de ilhas de bem-estar, com sombra, água e banheiro. Questões básicas que fazem a diferença na vida de qualquer ser humano.
Essas ilhas de qualidade de vida para os trabalhadores das ruas nas cidades devem ser resultado de parceria entre poder público e iniciativa privada. E precisam existir urgentemente. As alterações climáticas indicam que o planeta vai ficar ainda mais quente. É uma questão de compromisso com a saúde destes trabalhadores.
Histórias. Opiniões. Fatos. Acesse minha página
e clique no sino para receber notificações.
Esse conteúdo é de acesso exclusivo aos assinantes do OP+
Filmes, documentários, clube de descontos, reportagens, colunistas, jornal e muito mais
Conteúdo exclusivo para assinantes do OPOVO+. Já é assinante?
Entrar.
Estamos disponibilizando gratuitamente um conteúdo de acesso exclusivo de assinantes. Para mais colunas, vídeos e reportagens especiais como essas assine OPOVO +.