Como Mike Tyson deu origem a uma coluna sobre diversidade sexual no esporte
Jornalista formado na Universidade Federal do Ceará (UFC). Foi repórter do Vida&Arte, redator de Primeira Página e, desde 2018, é editor de Esportes. Trabalhou na cobertura das copas do Mundo (2014) e das Confederações (2013), e organizou a de 2018. Atualmente, é editor-chefe de Cidades do O POVO. Assinou coluna sobre cultura pop no Buchicho, sobre cinema no Vida&Arte e, atualmente, assumiu espaço sobre diversidade sexual e, agora, escreve sobre a inserção de minorias (com enfoque na população LGBTQ+) no meio esportivo no Esportes O POVO. Twitter: @andrebloc
Eu tinha 9 anos, "quase 10". Era noite e meus pais resolveram levar o caçula para uma festa de adultos. "Vai ter criança", dizem. Não que eu me interessasse por elas — ou elas por mim. Eu queria era ficar acordado até tarde para ver a revanche de Mike Tyson com Evander Holyfield.
A luta aconteceu bem tarde. Talvez fosse reprise — anos depois, já com internet, soube-se que a Globo gostava de fingir que exibia lutas já encerradas do UFC como se fossem ao vivo. Eu era time Tyson, claro.
Cabeçadas de cá, mordidas de lá, deu Holyfield na mais infame luta de boxe da história. Mas a memória que me persegue é o caminho de volta. Meu pai parou o Ford Escort em um sinal, já dispensando um pedinte com voz de quem bebera. Foi então, nunca se saberá por que, que o moço insistiu que "o Mike Tyson é um 'homem-sexual'".
Não que eu tenha entendido. Eu só passei a encarar o significado da palavra em 2006, na faculdade, quando um amigo me perguntou se eu já tinha sentido atração por um homem. Foi a primeira vez que eu me senti visto e a vontade era responder que sim, sentia naquele exato momento.
Homem-sexualidades à parte, Tyson sempre me fascinou. O porte físico "diminuto", como eu me via, e a capacidade de derrubar gigante, que eu invejava. A fúria nos olhos, que eu tão bem entendia, mas com a qual soube lidar melhor por ter tido uma juventude mais justa, na qual aprendi que não havia respostas na violência.
Há cerca de 10 anos, eu tinha 27, passei a treinar boxe. Um colega de trabalho, que devia ter ali pelos 58, chegou a me desafiar para um round. Declinei. Talvez pela certeza de que eu, ao contrário de Jake Paul, apanharia. Talvez porque fui criado de maneira a rejeitar violência. A ideia de socar alguém não me atrai, por mais intenso e irrascível que eu sempre tenha sido.
A minha memória de 28 de junho de 1997 me fez criar um carinho por Mike Tyson. Um laço. É como se fosse uma história de origem de um super-herói, ou supervilão.
Mike Tyson é uma figura fascinante. Vê-lo tentar lutar boxe aos 58 anos me partiu o coração. Milhões de pessoas devem pensar o mesmo. Mas cá venho lembrar das marcas da violência e citar o nome de Desiree Washington, ignorado no noticiário da luta da lenda do boxe com o youtuber fanfarrão.
Tyson é vítima de muitas coisas e algoz de outras tantas. A celebração pela garra dele não pode apagar os pecados — os crimes — que ele cometeu. Em 1992, ele foi julgado e condenado pelo estupro de Desiree. Não estou aqui para celebrar ou condenar. Até sei que foi um julgamento com certa dose de controvérsia, o que em nada me motiva a duvidar de uma vítima.
Talvez essa ideia de um homem rico e poderoso que cumpriu pena — algo que costuma ser reservado aos pobres sem poder — seja capaz de ampliar o fascínio que envolve Tyson. Ou quem sabe a gente prefira ignorar os "pecados" daqueles de quem gostamos. A mim, o que resta é me apegar aos talvezes.
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