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Palestina me fez defender a Copa do Mundo com 48 times
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Jornalista formado na Universidade Federal do Ceará (UFC). Foi repórter do Vida&Arte, redator de Primeira Página e, em 2018, virou editor-adjunto de Esportes. Trabalhou na cobertura das Copas do Mundo (2014) e das Confederações (2013), e organizou a de 2018. Atualmente, é editor-chefe de Esportes do O POVO, depois de ter chefiado a área de Cidades. Escreve sobre a inserção de minorias (com enfoque na população LGBTQ+) no meio esportivo no Esportes O POVO

André Bloc esportes

Palestina me fez defender a Copa do Mundo com 48 times

Com um país devastado, sem poder jogar nas próprias terras, os palestinos puderam sonhar com uma inédita participação em Mundiais
Comemoração do gol palestino (Foto: reprodução/palestina_fa)
Foto: reprodução/palestina_fa Comemoração do gol palestino

O Brasil participou de 22 Copas do Mundo. E estará na 23ª da história do futebol masculino. Para o brasileiro, não há qualquer mérito em simplesmente participar. Apenas uma hecatombe tiraria a Seleção do "esse" maiúsculo do maior palco do esporte global e essa tragédia não aconteceu nos últimos 95 anos.

A ideia de que o que vale é competir é alienígena à mente do brasileiro médio. E nessa obsessão pelo ganhar me vi torcendo para quem se contenta com fazer parte. Primeiro foi o desejo de ver a Venezuela conseguir uma vaga na repescagem. É o único país da América do Sul que nunca entrou no rol dos copáveis. Deu vontade de ver os venezuelanos — que convivem com longos anos de deterioração social sob o jugo de uma ditadura —, celebrarem a medalha de participante.

Nessa terça-feira, 10, a minha torcida viajou meio mundo rumo ao turbulento Oriente Médio. A Palestina precisava vencer Omã para manter vivo o sonho da estreia em Mundiais. Aos 52 minutos do segundo tempo, a seleção omani igualou o placar e cancelou o passaporte palestino para a Copa do Mundo de 2026 — e me pergunto como o governo de Donald Trump lidaria com a necessidade de vistos de entrada aos Estados Unidos caso os "Guerreiros" conquistassem a vaga.

A Palestina jogava "em casa". Assim, entre aspas, já que a seleção pela terceira vez mandou a partida na Jordânia. Houve ainda um jogo no Catar e outro na Malásia. Afinal, os palestinos não podem jogar nas próprias terras, ocupadas pelo horror. Em Gaza, há o genocídio cometido pelo governo de Israel. Na Cisjordânia, há tensão esgarçada.

O empate encerrou um grão de sonho que não existiria se a Fifa, por motivos estritamente econômicos, não tivesse decidido inchar a Copa do Mundo. Quando eu era menino, em 1994, eram 24 seleções. Quatro anos depois, viraram 32. Na América do Norte, em 2026, serão 48.

Esportivamente, o inchaço vai diluir a qualidade do esporte em pleno Mundial. Fui terminantemente contra o aumento de participantes. O verbo se fez pretérito quando vi a Palestina em campo. 

Uma Copa do Mundo de 48 times vai nos obrigar a ver confrontos desequilibrados, um sem-fim de jogos ruins. Vai também dar uma chance única de países periféricos entenderem porque o futebol é o maior esporte do mundo. Os dramas e as delícias que o Brasil vive desde 1930 poderão ser mais palpáveis para quem nem ousava sonhar em ouvir o próprio hino pela televisão.

O Brasil, representante maior do sul global em Copas do Mundo, vai ter de aprender a conviver com as novas companhias, com antigos torcedores que ousaram virar rivais.

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