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Vojvoda e Fortaleza: um abraço de despedida, luto e gratidão
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Jornalista formado na Universidade Federal do Ceará (UFC). Foi repórter do Vida&Arte, redator de Primeira Página e, em 2018, virou editor-adjunto de Esportes. Trabalhou na cobertura das Copas do Mundo (2014) e das Confederações (2013), e organizou a de 2018. Atualmente, é editor-chefe de Esportes do O POVO, depois de ter chefiado a área de Cidades. Escreve sobre a inserção de minorias (com enfoque na população LGBTQ+) no meio esportivo no Esportes O POVO

André Bloc esportes

Vojvoda e Fortaleza: um abraço de despedida, luto e gratidão

Em cena inédita no futebol brasileiro — até que me provem o contrário —, torcida é recebida dentro de um clube para se despedir de um técnico que acabou de ser demitido
Fortaleza de Juan Pablo Vojvoda finalizou o Brasileirão de 2024 entre as primeiras colocações.  (Foto: Fábio Lima/O POVO)
Foto: Fábio Lima/O POVO Fortaleza de Juan Pablo Vojvoda finalizou o Brasileirão de 2024 entre as primeiras colocações.

É fácil falar que Juan Pablo Vojvoda é o melhor técnico da história do Fortaleza. Os feitos falam por si. O que resta agora é dimensionar o quanto ele é gigante. Elogiá-lo como treinador é arredondar um clichê. O que falta ser dito é sobre as atitudes dele, quem ele se mostra como humano.

O Fortaleza, desde os tempos de Rogério Ceni, passou a restringir o acesso de torcedores e imprensa ao Pici. Mesmo sob Vojvoda sempre foi assim, sem treinos abertos. Nessa terça-feira, 15, os portões se abriram.

O inusitado faz o brilhante da cena. O sincero abraço da torcida tão leal, bradado no hino do clube, foi entre um técnico demitido e uma torcida insatisfeita — raivosa até. Vojvoda, emocionado, cumprimentou todos, ouviu todos, pediu desculpas a todos, acolheu e abraçou, quando os demais só estavam ali para se dobrar a ele.

Símbolo de abnegação, que em plena pandemia habitou por meses aquele mesmo Pici, buscando a forma de melhor entender o clube. Num destes dias ele deve ter absorvido a medula óssea do que significa o Fortaleza.

É muito estranha, muito tocante, a sensação de luto porque uma pessoa perdeu um emprego — em uma profissão que paga em um mês mais do que a maioria vai receber em toda a vida. Mas quem já terminou um namoro com aquele que via como o amor da sua vida conhece esse sentimento. As memórias podem ficar para sempre. Mas, distante, o abraço não se fecha.

Toda história de amor termina em tragédia. Toda idolatria é embalada por frustrações. Todo Carnaval termina.

Vojvoda se despede sabendo que sempre terá um lar no Pici. O Fortaleza abraça sabendo que ganhou o mais fiel dos torcedores.

PS.: Nunca achei um gancho para falar sobre o significado do nome de Vojvoda. Vamos aproveitar que essa talvez seja a última chance.

Há quem diga que Vojvoda é "duque", em croata, de onde advém a ascendência do técnico. O termo, porém, é mais antigo, e tem raiz eslava. Eu gosto de brincar com a verdade ao atribuir a expressão ao título da versão real do Conde Drácula, o príncipe Vlad Tepes, da Valáquia. "O Empalador", herói nacional da Romênia, era o voivoda da Valáquia. Isto é, o príncipe soberano cuja existência foi tão marcante que deu vida a um mito ainda maior do que si.

A mitologia draculiana é diferente daquilo que o técnico argentino construiu no Fortaleza. A lenda de Vojvoda, ao contrário daquela do Drácula, não vai conseguir ser maior do que a pessoa que ele provou ser.

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