Logo O POVO+
Descriminalização da maconha
Foto de André Haguette
clique para exibir bio do colunista

Sociólogo, com formação em Filosofia. Professor aposentado do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Ceará (UFC). Conjuga as atividades acadêmicas de professor, pesquisador, sempre engajado em atividades públicas, à participação como conselheiro em diversas instituições nacionais e internacionais

Descriminalização da maconha

O STF está prestes a dar um primeiro passo no longo caminho da descriminalização, caminho percorrido por diversos países, entre os quais Uruguai e Canadá
Tipo Opinião

Por razões sociológicas, sou favorável não somente à descriminalização, mas também à liberação da maconha (cannabis) tanto para fins terapêuticos quanto para fins recreativos. Na verdade, tomei conhecimento do uso de drogas com o advento dos hippies e do Festival de Woodstock, no final dos anos 50 do século passado, festival que teve alta repercussão no comportamento de jovens. Como consequência, nos anos setenta, desencadeou-se uma verdadeira guerra às drogas custeada por dinheiro público com o objetivo de banir para sempre o consumo de todas as drogas, com exceção do cigarro e do álcool. Guerra perdida, já que as drogas se multiplicaram e o número de seus usuários de todas as classes sociais não fez senão aumentar. No Brasil, o combate ao consumo de drogas vem levando ao encarceramento de adolescentes, jovens e mulheres pobres flagrados com pequena quantidade de material psicoativo, confundidos com traficantes, enquanto os endinheirados em nada são incomodados.

O STF está prestes a dar um primeiro passo no longo caminho da descriminalização, caminho percorrido por diversos países, entre os quais Uruguai e Canadá. O STF, com efeito, está para retomar o julgamento da inconstitucionalidade da criminalização do porte da maconha para consumo próprio. No projeto a ser votado pressupõem-se como usuários e não traficantes pessoas flagradas com 25 a 60 gramas de maconha ou que tenham até seis plantas fêmeas para cultivo. No momento, a votação está com 5 votos pela liberação e 1 voto contrário. Não se trata, portanto, de uma liberação geral de todas as drogas, mas somente da maconha. Mesmo assim, a oposição a essa liberação é agressiva, com certeza por desconhecimento dos benefícios dessa droga ou sob o anátema das religiões. A minha geração cresceu sub o efeito da demonização da cannabis, considerando-a tão nociva quanto qualquer outra droga.

Mas as avalições científicas tomaram uma outra direção, como explica um recente e excelente livro sobre o assunto: "As Flores do Bem", do neurocientista e biólogo Sidarta Ribeiro. O subtítulo expressa bem o rumo do livro: "A ciência e a história da libertação da maconha". O livro apresenta e discute os benefícios dessa planta do bem, que teria sido descoberta há doze mil anos e utilizada para funções medicinais ou religiosas, como forma de induzir o transe espiritual em vários países como China, Índia, Coreia e Japão e daí se difundido para todos os continentes e países. O autor insiste no uso da cannabis para tratar dores, epilepsia, tétano, raiva, ansiedade, reumatismo, infecções, verminoses, diarreia, cólica, inapetência e asma. Diz o autor: "O fato inquestionável é que a maconha é uma planta extremamente útil, herdada de quem veio muitíssimo antes de nós". No Brasil, o problema não é a legalização, pois seu uso terapêutico está efetivamente autorizado. O problema são seu custo, seu acesso e seu estigma social.

Este artigo não visa outro objetivo senão encorajar a leitura do livro de Sidarta Ribeiro e contribuir para o debate do tema e eliminação do estigma social que pesa sobre os usuários da maconha. n

 

Foto do André Haguette

Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?