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O nome de cada um (parte 1): a origem galega dos Araújo
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Ariadne Araújo é jornalista. Começou a carreira em rádio e televisão e foi repórter especial no O POVO. Vencedora de vários prêmios Esso, é autora do livro Bárbara de Alencar, da Fundação Demócrito Rocha, e coautora do Soldados da Borracha, os Heróis Esquecidos (Ed. Escrituras). Para além da forte conexão com o Ceará de nascença, ela traz na bagagem também a experiência de vida em dois países de adoção, a Bélgica, onde pós-graduou-se e morou 8 anos, e Portugal, onde atualmente estuda e reside.

O nome de cada um (parte 1): a origem galega dos Araújo

A partir de hoje você vai ler três crônicas sobre as dificuldades de quem busca antepassados, para a árvore genealógica. Na primeira, a história da origem do sobrenome Araújo, nome que porta minha família. Atrás de saber mais, fui até Lindoso, em Portugal, na fronteira com a Galícia, onde os primeiros Araújo construíram castelo e fama de brigões
Tipo Crônica
Lindoso, as terras dos primeiros Araújo, fica na fronteira entre a Galícia, na Espanha, e Portugal. Está dentro do Parque Nacional Peneda-Gerês (Foto: Robert Frans - Especial para O POVO)
Foto: Robert Frans - Especial para O POVO Lindoso, as terras dos primeiros Araújo, fica na fronteira entre a Galícia, na Espanha, e Portugal. Está dentro do Parque Nacional Peneda-Gerês

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Perguntada de chofre, e pela primeira vez, “qual é o vosso apelido, minha senhora?”, fiquei a fazer contas na cabeça. Anos atrás, a recém-chegada ainda não estava atualizada que, em Portugal, o termo “apelido” usa-se no sentido de sobrenome. E não como damos, comumente, no Brasil. Principalmente no Ceará, povo dado a invencionices e criatividades nas artes de batizar. Desafio um cearense que não tenha tido na vida pelo menos um apelido sequer. Eu tenho comigo uma lista. Então, foi por pouco que não olhei nos olhos da funcionária pública, que queria saber detalhes epítetos da minha vida pregressa, e disse assim.

Olhe, hoje eu atendo mais por galega. Mas, pode me chamar também de Ari. No passado, já fui chamada de fogoió, comadre folharal e louruda. Mas, menina pequena, respondia por sibite baleada, rã de bananeira, espiga de milho e Rapunzel. Gostou? Mas, ao invés desses memoráveis nomes que carrego comigo, saiu mesmo, para completar o formulário oficial, e num fio de voz, o velho e bom Araújo. O que, de todas as formas, me faz voltar ao apelido de galega, já que está na Galícia a origem do nome do meu pai. Sei disso porque a curiosidade levou-me a empíricas pesquisas genealógicas. Um quebra-pedras para achar o tronco velho dos Araújo, em Acaraú, Norte do Ceará, de onde vem o lado paterno e materno da família.

Para fazer tal árvore genealógica, tenho as mãos ainda cheias de vento. Ou hipóteses, se preferir. Tudo começou com a história de três irmãos portugueses. Ao que tudo indica, o José de Araújo Costa, o Manuel de Araújo Costa e o Pedro de Araújo Costa desembarcaram em Pernambuco, vindo do Norte de Portugal. Chegando por Recife, rumaram para o Norte do Ceará, para as ribeiras do Acaraú. Até onde se sabe, vinham a chamado de um tio português, já ali instalado, para ajudar com as terras concedidas pela Coroa. O José, inclusive, tornou-se capitão-mor e tesoureiro das contas do porto do Acaraú. Um dos filhos dele, aliás, foi o poderoso capitão Diogo Lopes de Araújo Costa. O homem viveu com três mulheres e teve 16 filhos. Com tal prole, quem sabe não é ele a raiz do tronco velho dos meus ancestrais?

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A pesquisa pelo apelido levou-me longe. Nas fronteiras entre a Galícia, na Espanha, e Portugal, fui buscar as terras dos primeiros Araújo. Fica em Lindoso - e, como o nome indica, o lugar é lindo. Para se ter ideia, está dentro do parque nacional Peneda-Gerês. Aliás, segundo J. Sobota, em O Livro Ancestral dos Araújo, o primeiro a portar esse nome foi o galego Rodrigo Annes de Araújo. E isso aconteceu porque o gajo recebeu, como dote de casamento, o condado Terras de Araújo, na Galícia. Ele, sabidamente, incorporou o nome das terras ao apelido. Resumo da ópera, os 3 netos desse primeiro oficialmente Araújo envolveram-se em sangrentas lutas geopolíticas da época, perderam as terras do avô e fugiram para o lado português, onde construíram um castelo, em Lindoso. Lá, continuaram as escaramuças. Araújo ou não Araújo, aviso de amigo, vale a pena visitar o lugar.

Há tropeços e surpresas na pesquisa genealógica. O tema, inclusive, tem atraído, cada vez mais, a atenção de brasileiros, principalmente nordestinos. São centenas como novos clientes em escritórios de genealogia, em Portugal. Cearenses, os primeiros da lista. Querem levantar a descendência judia sefardita. Para além da possibilidade de uma cidadania, saem com as mãos cheias de histórias. Eu que levantei apenas a ponta do véu, soube, por Sobota, o escarafunchador da raiz de Araújo, que, ao que tudo indica, o nome vem do celta galaico. Língua falada também na Galícia, antes da chegada dos romanos. Vejam só o quão longe se vai na arqueologia dos cacos-velhos. Perdida nas lonjuras do tempo, dou mais um nó neste ponto, sem abrir mão, claro, dos nomes que me deram, ao longo da vida, amigos e parentada. Galega, sempre.

Na crônica da semana que vem, desfiam-se os rosários da difícil pesquisa genealógica. Um dos passos é saber o significado do sobrenome Araújo. Esquece a história que é o nome de uma planta. A solução para o enigma é mais para o lado espiritual, no passado da velha Península Ibérica. Depois, na sequência, no terceiro e último texto, vou contar como, na viagem no tempo dos meus “escanchavós”, peço ajuda até a robôs e testes genéticos. Porque os rápidos algoritmos também se meteram no negócio de buscar parentada. E a minha árvore, que começou como pequena muda, vingou um raminho, abriu-se em copas, engrossou o tronco e transformou-se em um monstro com múltiplos galhos de octopus. E a galega aqui em meio a espinhos.

Foto do Ariadne Araújo

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