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Bolsonaro, Lula e o "pai" da transposição
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O jornalista Carlos Mazza já foi repórter de Política, repórter investigativo, coordenou o núcleo de jornalismo de dados do O POVO e atualmente é colunista de Política

Carlos Mazza política

Bolsonaro, Lula e o "pai" da transposição

Tipo Opinião

Na primeira viagem ao Ceará desde o início do mandato, Jair Bolsonaro tem presença esperada no dia 20 de junho em Jati, na Região do Cariri. A passagem, que busca acompanhar a chegada de águas do rio São Francisco no Estado, reedita também um dos debates mais persistentes na política cearense recente: quem, afinal de contas, é o "pai" da transposição? Ao vir pessoalmente marcar a conclusão da etapa mais importante da obra, Bolsonaro irrita sobretudo petistas, que depositam em um empenho pessoal do ex-presidente Lula o crédito pela viabilização do projeto. E, não vamos fingir inocência, é óbvio que o presidente sabe disso.

Novela iniciada ainda em 2007, no início do segundo mandato do petista, a transposição já deve dezenas de "imprevistos" e datas de inauguração. Prevista inicialmente para ter conclusão em 2012, ainda no governo Dilma Rousseff (PT), a obra acabou tendo longevidade maior que a da ex-presidente, alvo de impeachment em agosto de 2016. Naquele mesmo ano, o Ceará vivia sua pior fase de seca prolongada, o que deu uma nova relevância para a conclusão da transposição. Em dezembro de 2016, o governador Camilo Santana (PT) chegou a dizer que, "sem as águas do São Francisco", Fortaleza corria risco de "colapso hídrico".

A pressão acabou provocando reação forte do governo Michel Temer (MDB), que apertou o passo e a liberação de recursos para a conclusão da obra. Naquela época, cresceram também os embates entre petistas e emedebistas no parlamento local, um acusando o outro de "roubar" créditos da obra. A disputa escalou e envolveu figurões de ambos partidos, com Dilma e Lula saindo inclusive em defesa da obra como legado petista no Nordeste. Em março de 2017, Temer rebateu, afirmando que a paternidade da obra era "do povo". Balela, era óbvio que o emedebista buscava garantir também sua parcela de louros pela transposição. Mesmo com o bate-boca e troca de acusações, a obra também não foi concluída de forma integral.

BOLSONARO deve inaugurar transposição
Foto: José Cruz/Agência Brasil
BOLSONARO deve inaugurar transposição

Assumindo a gestão com a obra em vias de conclusão, Bolsonaro planejava inaugurar a chegada das águas ao Ceará já em março deste ano. Novos problemas técnicos na barragem Negreiros, em Salgueiro (PE), acabaram atrasando a data mais uma vez. O prazo atual é justamente para em torno de 20 de junho, data em que o presidente vem ao Estado. Conhecendo Bolsonaro, se o seu discurso em Jati não vier repleto de deboches e provocações da incompetência de seus antecessores para concluir a obra, eu ficaria muito surpreso.

A base de Bolsonaro

A visita do presidente serve também para delimitar de forma mais clara qual o tamanho da base bolsonarista no Ceará. Atualmente, a posição do deputado federal Capitão Wagner (Pros), principal nome da oposição hoje no Estado, tem sido de apoio com relativa independência com relação ao governo federal. Vereadores de Fortaleza de dentro da zona de influência do parlamentar, como Márcio Martins (Pros), Sargento Reginauro (Pros) e Julierme Sena (Pros), seguem rumo parecido. Nos bastidores, se comenta que Wagner busca atrair base de Bolsonaro para sua candidatura a prefeito de Fortaleza, mas tem receio de absorver também desgaste local do presidente, mal avaliado principalmente em capitais do Nordeste.

No campo do apoio mais radical ao presidente, se destacam hoje principalmente os deputados André Fernandes e Delegado Cavalcante, já "pré-filiados" ao partido que Bolsonaro tenta viabilizar, o Aliança pelo Brasil. Também está na Assembleia Legislativa Dra. Silvana (PL), outra bolsonarista fiel. Completam o grupo mais ideológico o marido de Silvana, o deputado Jaziel Pereira (PL), e a vereadora de Fortaleza Priscila Costa (PL).

Eleito em 2018 com o apelido de "o federal do Bolsonaro", Heitor Freire (PSL) acabou se afastando do presidente durante a crise do racha no PSL, mas segue afirmando que apoia a gestão. Outro eleito pedindo votos para Bolsonaro, o senador Eduardo Girão (Poemos) também apoia a maior parte das agendas do presidente, mas se diz independente. Outros deputados do chamado Centrão, como Domingos Neto (PSD) e AJ Albuquerque (PP), também tem boas conversas com o governo.

Conhecido por exigir fidelidade e mostras públicas de defesa, Bolsonaro certamente tentará reunir parte deste pessoal em Jait. O tamanho da bancada vai mostrar, enfim, qual o real tamanho da base bolsonarista no Ceará.

 

Foto do Carlos Mazza

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