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Na eleição podia aglomerar?
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O jornalista Carlos Mazza já foi repórter de Política, repórter investigativo, coordenou o núcleo de jornalismo de dados do O POVO e atualmente é colunista de Política

Carlos Mazza política

Na eleição podia aglomerar?

Tipo Análise
CAMILO destacou que não tem problemas em reavaliar ações ou ideias (Foto: Aurélio Alves)
Foto: Aurélio Alves CAMILO destacou que não tem problemas em reavaliar ações ou ideias

"Mas na eleição podia aglomerar, né?". O questionamento, quase sempre acompanhado por impropérios de toda espécie, tem se tornado resposta padrão de críticos do isolamento social nas redes sociais. A cada nova medida de restrição de circulação anunciada, versões semelhantes da expressão lotam perfis de governantes e caixas de comentários dos veículos de imprensa, sempre tentando expor a "hipocrisia" daqueles que tentam evitar o contágio da Covid-19. Ora, se todos os políticos estavam nas ruas até novembro do ano passado, como podem então ter a cara de pau para exigir alguma coisa agora?

Como é costume neste tipo de caso, no entanto, a bravata de redes sociais parece muito mais inteligente do que de fato é. Uma falsa equivalência que só faz sentido se partir de uma interpretação "conveniente" dos fatos - quando a pessoa quer apenas deslegitimar medidas de isolamento de qualquer maneira, não importando mais nada que se diga -, ou se tiver base em informações extremamente rasas ou equivocadas. Há várias razões para isso.

1. Não houve "Deus-dará"

O chavão das redes parte do pressuposto que houve grande clima de Carnaval nas eleições, com todos os candidatos praticamente saindo em "trenzinho" pelas cidades, cada um com as mãos sobre o ombro outro. Quase sempre acompanhadas por imagens dos candidatos em almoços ou momentos de aglomeração, as publicações tentam reforçar clima de "Deus-dará" no período de campanhas. Na prática, a realidade foi bem distinta: Quase duas semanas antes do 1º turno, em 4 de novembro, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-CE) emitiu resolução proibindo atos presenciais de campanha eleitoral.

Eventos como comícios, bandeiraços, passeatas, caminhadas e afins sofreram restrições. A fiscalização não ficava a cargo somente do TRE, mas era feita também pelos próprios candidatos, que moveram dezenas de ações um contra o outro na Justiça, várias delas ainda em julgamento. Na semana passada, o prefeito de Viçosa do Ceará, José Firmino (MDB), foi condenado pela Justiça por provocar aglomerações de campanha. Ele e o vice pagarão multa de R$ 250 mil, em condenação que não deve ser a última do tipo no Estado.

O próprio José Sarto (PDT), vitorioso em Fortaleza, sofreu baque grande na campanha após contrair a Covid-19. Por conta do diagnóstico, ficou duas semanas "fora de combate". Ou seja, a contaminação não era interessante nem para os próprios candidatos. Claro que é virtualmente impossível que a Justiça fiscalizasse todos os milhares de candidatos nos 184 municípios cearenses, ou que o rigor do isolamento ocorresse 24 horas por dia durante todos os meses do período. Mas nunca houve "liberou geral".

2. O contexto era outro

Este argumento nunca é bem recebido por quem não quer dialogar, mas é talvez o mais óbvio de todos: Não faz sentido comparar a situação atual com a de novembro do ano passado. O leitor pode escolher qual gestão prefere: Seja na base de dados de Camilo Santana (PT) ou na de Jair Bolsonaro, números da Covid no País eram os menores nos meses da campanha eleitoral do ano passado. Naquela época, quadro de proliferação da doença possuía certa estabilidade, com redução gradual de casos e óbitos em todos os meses.

Com o surgimento de variações mais contagiosas da doença e o peso da "segunda onda", no entanto, vivemos hoje o pior quadro da pandemia desde o início dos primeiros casos. No final de outubro de 2020, o Ceará confirmou em um dia 450 casos da doença. No início de fevereiro, eram 2.256. É óbvio que restrições são muito mais urgentes agora.

3. A postura de Camilo

Principal alvo do chavão anti-isolamento, o governador Camilo Santana (PT) sempre seguiu com cautela recomendações sanitárias contra a Covid-19. Não é questão de "puxar saco" ou bancar o advogado do diabo, são apenas os fatos. Imagens do petista em eventos em Jaguaruana ou outros municípios, que ainda circulam nas redes, são falsas e retiradas da campanha de 2016.

Claro que surgirão sempre aqueles que pinçam uma ou outra imagem isolada (quando não falsa) na busca por provar o contrário, mas o governador não foi participante ávido de eventos de campanha em 2020. Nem de carreatas de seu principal candidato, José Sarto, participou. Na época, o argumento utilizado pela assessoria para negar a participação nos eventos era justamente esse, o risco de contágio da Covid-19.

 

Veja vídeo de apoiadores de Bolsonaro, em visita ao Ceará, gritando "Fora, Camilo":

 

 

Foto do Carlos Mazza

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