
Chico Araujo é cearense, licenciado em Letras, professor de Língua Portuguesa e de Literatura brasileira
Chico Araujo é cearense, licenciado em Letras, professor de Língua Portuguesa e de Literatura brasileira
A lógica é perversa: alguém rico abre empresa em plataforma digital para oferecer o "serviço de apostas" e quem corre ferozmente para elas são as populações mais pobres, mais carentes de um quase tudo, seus integrantes sonhando ardorosamente em ficar ricos e resolver todas as suas necessidades materiais e da família. Resultado? Os pobres mais pobres, os ricos mais ricos.
Deputados e deputadas, senadores e senadoras com interesse em terem benefícios a partir da legitimação dos jogos aceitam falas de lobistas e propõem leis para tornar legais jogos que lesam o bolso já escasso de dinheiro das pessoas pobres. Alegam os lobistas e os políticos lobistas que a legalização dos jogos em ambiente digital servirá para maior arrecadação financeira do Estado; no entanto, boa parte do que o Estado brasileiro recolhe hoje através de impostos tem sido sangrado nas emendas parlamentares sem transparência, rastreabilidade, nominação do parlamentar propositor de "projetos" via emenda. Temos um “mais do mesmo”?
É muita bet, gente. É uma avalanche de bets. Bet do Fenômeno. Bet do Rivaldo. Bet do Galvão. Bet do Zico... Bet até de personagens que nem devem ser mencionados. Bet demais. Demais da conta. E então o que se vê se proliferando pelo País são plataformas de apostas online seduzindo pessoas a fazerem “fezinhas” esportivas e a se tornarem efetivas em bingos, jogos de cassino, poker...
É tanto apelo, é tanta tentação para que se pratique jogo online que a conta não está fechando, não está “batendo” na vida de muitos apostadores e apostadoras. Gente jovem e gente madura. Adolescentes e idosos. Homens e mulheres. De variadas profissões. O jogo se espalha ferozmente pelo Brasil e toma os trocados das populações, sempre sofrendo mais as de maiores carências.
A lógica é cruel: quem joga perde e faz alguém, em algum lugar, enriquecer, ou, como quase é praxe, ficar mais rico. Porque quem banca as casas de apostas já dispõe naturalmente de dinheiro para abrir o negócio. Ou é beneficiado por algum banco que empresta a crédito e que vê no negócio muito mais dinheiro como retorno.
A despeito dos múltiplos adoecimentos psíquicos causando sofrimento na vida pessoal e familiar de muitos apostadores, as casas de apostas virtuais se ampliam e se tornam cada vez mais fortes no país e adquirem poder tal que acabam interferindo na vida da sociedade. Há estudos abordando o mal que as bets estão causando no cotidiano de muitas pessoas. Em outubro de 2024, a então ministra da saúde Nísia Trindade defendeu, em entrevista à CNN a tese de que “as bets fazem mal à saúde”, devendo, portanto, ter “tratamento semelhante ao que damos ao tabagismo”.
As bets causam transtornos psíquicos em quem aposta, porque o apostador é levado a ficar compulsivo, a ponto de somente pensar em apostar mais e mais, acreditando que na próxima investida ganhará o dinheiro que o libertará de todas as necessidades materiais que tenha. O resultado costuma ser o inverso: o sonhador perde mais dinheiro e muitos, pelas perdas somadas, passam a sofrer de ansiedade, depressão, alguns se tornando irascíveis e violentos. Na soma de tudo, o sofrimento não é individual, somente de quem joga e perde, mas de quem está por perto, ao lado, como o cônjuge, os descendentes, a família, enfim.
O jogo com aposta pode disparar no cérebro a sensação de intenso prazer, podendo, portanto, ter comparação com o que acontece com quem tem dependência de álcool, cigarro e outras drogas e com quem tem dependências comportamentais relacionadas a alimentação, à compulsão por compras, entre outras. O excesso de dopamina no cérebro pode ter efeitos devastadores na pessoa e isso se realiza como um grande problema para ela, mas não só.
Ampliando-se a noção do problema, ele deixa de ser localizado em uma determinada pessoa, em uma família, em uma casa ou apartamento, condomínio, rua ou avenida, bairro e se expande para toda a sociedade, tornando-se algo com repercussão socioeconômica, ocasionando, inclusive, grave incidência na saúde pública.
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