
Chico Araujo é cearense, licenciado em Letras, professor de Língua Portuguesa e de Literatura brasileira
Chico Araujo é cearense, licenciado em Letras, professor de Língua Portuguesa e de Literatura brasileira
A produção de um evento não é nada fácil e bem sabe disso quem nele se insere... “por dentro”, cumprindo os passos do processo que vai da idealização até a realização.
É muito chão a se andar do começo ao fim. Quem usufrui do evento, ele já devidamente pronto, preparado nos mínimos detalhes, organizado em sua plenitude e já ocorrendo nem sempre tem a dimensão do que ele “é” em toda sua extensão.
Quem o pensa para desenvolvê-lo e pô-lo em evidência deve refletir sobre muitas sutilezas, como, por exemplo: O evento é sobre o que mesmo? Para que público é primordialmente direcionado a quem? Ocorrerá em lugar aberto ou fechado? Esse lugar apresenta condições climáticas favoráveis ao acontecimento? O espaço da realização dele é adequado aos propósitos almejados? Haverá necessidade de aparelhagem de som?
São apenas exemplos, certo? Há muito mais reflexões e ações envolvidas em um projeto, qualquer que ele seja. Mas quero trazer para essa minha pauta o Projeto Tributo Musical que acontece no bairro José Walter desde 2017 e que teve sua vigésima edição realizada no recente sábado, 16 de agosto, no estabelecimento Casa de Rogério.
A respeito do projeto, disse Roberto Gomes – historiador, ex-auditor fiscal da Secretaria da Fazenda, gestor, produtor cultural e idealizador do projeto –, em documento que o oficializou sob inspiração após a morte de Antônio Carlos Gomes Belchior: “Ainda impactado pelo falecimento do eterno poeta, ocorrido no dia 30 de abril de 2017, um grupo de amigos se reuniu cinco depois da fatídica data, em 05/05/2017, para prestar homenagem póstuma e celebrar a vida e a obra do grande trovador sobralense. Provavelmente foi um dos primeiros tributos dedicados a Belchior, in memoriam. O evento aconteceu, a ideia prosperou e o tributo se tornou um projeto”.
Roberto Gomes afirma ainda que “O Projeto Tributo Musical cresceu na perspectiva de enaltecer o melhor da cultura musical brasileira, nordestina e cearense, e os seus mais legítimos representantes”. Não é por acaso, portanto, que o projeto já chegou a sua vigésima edição, sendo coordenado pelo próprio Roberto em parceria com Jean Dumont, músico, produtor, cantor, compositor, zabumbeiro e morador do bairro. Nas palavras de Jean: “O evento acontece de dois em dois meses e atualmente tem o formato de show, contando com uma banda de apoio”.
Dumont prossegue: “O repertório é pré-definido, realizamos ensaio, o que traz a conotação de uma vivência de produção de espetáculo musical. No dia do evento, monta-se a melhor estrutura possível. Previamente, um tema é escolhido, como, por exemplo, ‘As cantoras do rádio’, ‘Homenagem ao Belchior’, ou, ainda, ‘Homenagem a Chico Buarque’. O legado é o sentimento de pertencimento ao território, a própria música sendo evidenciada pelos moradores e atuantes deste cenário, os reencontros, oportunidades profissionais musicais/culturais assim como o lançamento de livros”.
Pelas palavras de Jean Dumont, percebe-se que o Projeto Tributo Musical se expande e acolhe outras expressões artísticas. De fato, no sábado 16 de agosto, pude constatar no evento a presença, no palco, de parte do público, professores que se inseriram para declamar poemas. Lindo e rico momento! O público não fica alheio às apresentações; em verdade, acolhe, participa, canta junto, aplaude, se insere, enfim, na formação do legado citado por Jean Dumont.
Retomamos aqui o que dissemos no início desse texto refletindo sobre a produção de um evento: “É muito chão a se andar do começo ao fim”. Então, para que o Projeto Tributo Musical aconteça da melhor forma, muitas ações e “muitos braços” antes do evento propriamente dito são necessárias e elas precisam estar bem concatenadas para que tudo pensado dê certo. Ou seja, acima de tudo um evento se faz com pessoas e para pessoas.
Sobre isso nos diz Lilian Cass, referindo-se diretamente ao Projeto Tributo Musical: “Um evento só se faz com pessoas. Um evento com vínculos, sem a coerção da hierarquia e dos títulos, sem medo de perder dinheiro ou lugar e se sustentar num interesse que una o suficiente para acontecer”. E prossegue: “Ninguém é chefe de ninguém. Fazer entender que estamos juntos pra fazer um ‘favor comprometido’, eis um dos desafios. Não é uma obrigação, mas é um compromisso”. E afirma ainda: “É só pra gente não romantizar e não perder de vistas os percalços. Só acontece [o projeto] pela força da vontade de alguns que conseguem convencer e influenciar a maioria. Eu suspeito que é assim em quase todos os empreendimentos humanos. Pessoas são universos... juntar esses universos é sempre um desafio”.
O percurso do Projeto Tributo Musical é vitorioso e suas edições se firmam cada vez mais a partir da percepção, pela comunidade, de sua importância, reconhecimento que agrega e traz mais pessoas para que os eventos aconteçam. Iniciado com o “Tributo a Belchior”, em 2017 (Belchior já mereceu três outros tributos em sua homenagem) e realizada já sua edição de número 20 – “Tributo à Música Nordestina” – o projeto conta com homenagens a Raul Seixas, Luiz Gonzaga, Gonzaguinha, Elis Regina, Maysa, entre outras, e já se prepara para a edição vigésima primeira, com data prevista para 4 de outubro de 2025: “Tributo ao Brega”.
Todos devidamente convidados desde já.
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