João Gabriel Tréz é repórter de cultura do O POVO e filiado à Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine). É presidente do júri do Troféu Samburá, concedido pelo Vida&Arte e Fundação Demócrito Rocha no Cine Ceará. Em 2019, participou do Júri da Crítica do 13° For Rainbow.
Presença de filmes que não são dos EUA em diversas categorias do Oscar neste ano reforça bem-vinda internacionalização da premiação, ainda que avanços sejam limitados
De acordo com uma análisepreliminar da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, divulgada no site IndieWire, quase 52% das indicações ao Oscar em 2022 foram para obras ou artistas de foradosEstadosUnidos. Uma forte presença global não é necessariamente algo inédito no prêmio, mas o espalhamento de produções "estrangeiras" — pelo menos aos EUA — em várias categorias, incluindo MelhorFilme, foi robusto e indica tanto avanços quanto pontos-cegos da premiação.
O representante em língua não-inglesa que mais despontou neste ano é o drama japonês "Drive My Car", do japonês Ryûsuke Hamaguchi. O filme é o 12º em outro idioma, além do inglês, a ser indicado a Melhor Filme (em uma conta que não considera o francês e mudo "O Artista" e o bilíngue e produzido pelos EUA "Minari" — que se destaca pela vitória, em 2021, da atriz sul-coreana Youn Yuh-jung).
Metade das indicações de filmesestrangeiros na categoria principal ocorreu até a 72ª edição do Oscar. A outra metade, nas últimas22 edições. Das seis mais recentes, três aconteceram nos últimos quatroanos.
O movimento pode ser fruto da entrada acentuada de novosmembros de fora dos EUA na Academia nos últimos anos. Conforme o jornalista Scott Feinberg, o percentual saltou de 12% em 2015 para 25% atualmente. Apesar do bloco de votantes estrangeiros não ser, naturalmente, uniforme, ele é inegavelmente menos reticente quanto à legendagem.
A possibilidade da presença de "Drive My Car" na lista de indicações veio se concretizando com o apoiocrítico ao filme, que foi premiado como o melhor do ano passado por três das principais associações especializadas dos EUA. O longa conquistou, além de MelhorFilme, outras trêsindicações: Melhor Filme Internacional, Roteiro Adaptado e Direção.
Junto de "Drive My Car" — que estava sem distribuidor no Brasil até o dia seguinte ao anúncio das indicações do Oscar, quando teve os direitos adquiridos pela Mubi —, outros três longas não-anglófonos conseguiram indicações também surpreendentes em categorias diversas.
"A Pior Pessoa do Mundo", comédia dramática norueguesa de Joachim Trier, teve indicação a Melhor Filme Internacional e rompeu a barreira em Melhor RoteiroOriginal. Já "Mães Paralelas", de Pedro Almodóvar, que não teve sequer como ser cogitado na categoria específica de produção estrangeira por não ter sido escolhido para representar a Espanha, apareceu em Melhor Trilha Sonora e Melhor Atriz (Penélope Cruz). Chama ainda mais atenção o caso da produção dinamarquesa "Fuga", que foi indicada como Melhor Filme Internacional, Melhor Documentário e Melhor Animação.
Observando a história recente de filmes em língua não-inglesa presentes no Oscar, é possível notar certos padrões. Em categorias como Animação e Documentário, é até comum a presença de obras internacionais — o Brasil já figurou na lista em 2020, com "Democracia em Vertigem". Em Direção, há histórico já considerável de indicações para cineastas não-estadunidenses, seja por produções dos EUA ou internacionais.
Já em RoteiroAdaptado, por exemplo, "Drive My Car" é o 1º estrangeiro indicado desde 2006. As categorias de atuação, por sua vez, revelam que é mais fácil conseguir menção entre os finalistas caso o artista seja europeu e já reconhecido. A atual indicação de Penélope Cruz é a 3ª da atriz.
No séculoXXI, foram 26 intérpretes que conseguiram indicações em língua não-inglesa, em um universo de 440 nomes (já que, a cada ano, são 20 as vagas nas categorias de atuação). Menos da metade, precisamente 11, foram para artistas da Ásia, AméricaLatina e África.
"Parasita" segue sendo paradigmático, um ponto fora da curva mesmo no histórico recente das produções não-anglófonas, mas nem ele — que reuniu bom timing, repercussão crítica e aceitação de público, aspectos não necessariamente controláveis em uma disputa como a do Oscar — conseguiu emplacar o elenco nas indicações. Se o filme sul-coreano seguirá sendo por muito mais tempo ainda o único a triunfar, é difícil e desnecessário tentar prever. Um olhar para os movimentosrecentes, porém, reforça a impressão de que cada vez mais indicações menos centradas nos EUA se somarão nos próximos anos e a "globalização" do Oscar pode se tornar, enfim, uma bem-vinda realidade.
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