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João Gabriel Tréz é repórter de cultura do O POVO e filiado à Associação Cearense de Críticos de Cinema (Aceccine). É presidente do júri do Troféu Samburá, concedido pelo Vida&Arte e Fundação Demócrito Rocha no Cine Ceará. Em 2019, participou do Júri da Crítica do 13° For Rainbow.

João Gabriel Tréz arte e cultura

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Com o fechamento de salas por conta da pandemia e o consequente adiamento de estreias, o que esperar do que virá por aí no cinema nacional?
Três Verões, de Sandra Kogut, tinha estreia agendada para março, o que não aconteceu devido à pandemia (Foto: Divulgação)
Foto: Divulgação Três Verões, de Sandra Kogut, tinha estreia agendada para março, o que não aconteceu devido à pandemia

Primeiro país a ser afetado pela pandemia do novo coronavírus, a China optou ainda em janeiro pelo fechamento, dentre outros espaços, das salas de cinema. Ações semelhantes foram sendo tomadas pelo mundo, chegando no Brasil a partir da segunda quinzena de março. Foram impactados, assim, filmes que haviam estreado no dia 12 daquele mês e os que tinham estreias marcadas para a partir do dia 19. No desejo de poderem estrear seus filmes com segurança, os cineastas Allan Deberton - cearense que assina o premiado "Pacarrete", filmado em Russas - e Sandra Kogut - diretora de "Três Verões", comédia dramática com Regina Casé - avaliam ações do governo a favor do audiovisual e dividem expectativas para o futuro do setor.

O POVO - Antes da pandemia, o audiovisual brasileiro já estava paralisado. Como avalia as ações que vêm sendo tomadas, ou não, a favor da indústria pelo governo?

Allan - A crise do audiovisual brasileiro precede a pandemia da Covid-19. Depois do impeachment da Dilma, foi notória uma mudança de “valores” dos processos seletivos da Ancine, diminuindo o valor do artístico e privilegiando as temáticas mais comerciais, quando na verdade o audiovisual brasileiro sempre foi elogiado por sua pluralidade e força. Apesar da excelente valorização do cinema nacional em importantes festivais internacionais e a produção para outras janelas crescendo de vento em popa, empregando milhares e com rendimentos para a economia, o governo Bolsonaro entrou em ação para suspender atividades do setor, boicotar projetos com temáticas plurais/diversidade/afirmativas, extinguir o Ministério da Cultura, nomear desqualificados e exonerar constantemente, gerando inoperância ou profunda letargia. Com a pandemia, os projetos que tinham a sorte de serem executados, em etapa de filmagem ou de pré-produção, tiveram que ser suspensos. Há uma tentativa atual de dar solução à crise e pôr destino aos recursos do audiovisual (que se retroalimenta), que estavam travados propositalmente. São muitos leões a domar. É muito triste.

Sandra - A crise trazida pela pandemia só veio agravar a enorme crise que já estávamos vivendo no audiovisual. Esse governo não respeita a cultura, ao contrário, está em guerra contra ela. Um dos primeiros atos do presidente foi extinguir o Ministério da Cultura. Em 2019, o audiovisual já viveu praticamente um ano perdido. Existiam, antes de estourar a pandemia, cerca de 400 projetos parados. Apesar do audiovisual responder por mais de 300 mil empregos e representar meio por cento do PIB – sem falar na importância que ele tem para a vida das pessoas, na identidade do país, e a riqueza criativa de uma população – o Governo segue atacando o setor. É uma tristeza. Agora na pandemia uma crise que já era grave ficou ainda pior. Enquanto países como França, Alemanha, Itália e muitos outros foram ao socorro dos setores do audiovisual, ouvindo os profissionais e agindo como parceiros, o Brasil fez o quê? A Ancine vem tentando implementar medidas de ajuda, o que é uma boa coisa, mas a agência também vem sendo fragilizada desde o ano passado por uma série de ataques. No Fundo Setorial do Audiovisual, existe mais de R$ 1 bilhão parado. É verba já aprovada para projetos já escolhidos. É uma lástima isso tudo, uma tristeza. Se hoje temos um setor do audiovisual no Brasil tão pujante, se nossos filmes viajam e recebem prêmios no mundo inteiro, fazem parte da vida das pessoas, se eles existem, é graças a uma série de políticas públicas implementadas ao longo de muitos anos. Eu sou de uma geração que começou a fazer cinema quando o cinema no Brasil acabou. Foi a época do Collor. Nunca imaginei que veria tamanha tentativa de destruição acontecer de novo. Não podemos permitir que isso siga assim, é muito triste.

O POVO - Já há nova previsão de estreia? Como espera que a indústria responda à crise?

Allan - Estaríamos estreando dia 30/4, um lançamento aguardado depois de uma excelente carreira em festivais, com 26 prêmios importantes e aprovação da crítica. Infelizmente tivemos que suspender a estreia e, agora, ainda sem data para lançar, nos resta esperar e entender qual vai ser o comportamento do público quando as salas de cinema retomarem. Falam que a pandemia surgiu para acelerar a supremacia do streaming, que chegou para ficar e falam ainda que o cinema como tradicionalmente conhecemos morreu. Eu gosto de pensar que cinema não morre, há 135 anos é um prazer coletivo e já superou diversas epidemias. Tudo vai passar! Há bastante público ansioso pelo encontro afetivo e com saudade do cheiro da pipoca na sala escura do cinema.

Sandra - Quem dera eu pudesse responder a essa pergunta! É a pergunta de um milhão de dólares. Nosso filme “Três Verões” estava com o lançamento marcado para o dia 19/3. No dia 11, a Organização Mundial da Saúde declarou a pandemia. Estávamos bem avançados na campanha de lançamento, que como todos sabem é um enorme esforço coletivo. O filme ia sair em mais de 100 salas. Mas antes de sermos obrigados a cancelar, decidimos suspender. Foi eticamente a atitude certa a tomar, sem nenhuma dúvida. Suspendemos no dia 13, no dia 14 fecharam todos os cinemas do Rio. Hoje continuamos com a esperança de fazer um lançamento bacana, mas ainda é cedo para dizer quando e como. É preciso que o governo ajude esse setor. Ninguém quer sair desse túnel e descobrir que os cinemas que você frequentava e mais gostava tiveram que fechar as suas portas. Olha um exemplo do que aconteceu com o filme. Ele entrou em cartaz na França no dia 11/3. Um lançamento grande, 70 salas no país todo. Estava indo bem, críticas ótimas, números crescendo. Em Paris, tinham colocado 280 outdoors do filme. Por onde andava esbarrava com um. Aí fechou tudo. O filme ficou só 4 dias em cartaz! Mas lá na França o que vai acontecer? O filme voltará aos cinemas depois da pandemia. Todos os exibidores se comprometeram a reprogramá-lo. Vão retomar de onde pararam. Estão num país que preza o audiovisual, com um governo que ouve e tenta responder às suas demandas.

Estreias em suspenso

Três Verões (inicialmente previsto para março)

Vaga Carne + Sete Anos em Maio (inicialmente previsto para março)

Pacarrete (inicialmente previsto para abril)

New Life S/A (inicialmente previsto para abril)

A Menina que Matou os Pais/O Menino que Matou Meus Pais (inicialmente previsto para abril)

Eduardo e Mônica (inicialmente previsto para junho)

Marighella (inicialmente previsto para maio)

Raia 4 (inicialmente previsto para junho)

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