Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Ceará (2009), mestre (2012) e doutor (2016) em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFC. Apresentando interesse pela Sociologia Política e Ciência Política. Pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia (Lepem-UFC), atua como palestrante e analista político, colaborando com movimentos sociais, associações e imprensa
Nossa tradição é marcada por conciliações artificiais. Em 1979, a anistia foi apresentada como símbolo de pacificação, mas silenciou vítimas e perpetuou a impunidade. O país seguiu com feridas abertas
Foto: Pablo PORCIUNCULA / AFP
Sentados em frente a um telão em um bar de Brasília, frequentadores de esquerda gritam de alegria e aplaudem, nessa quinta-feira, 11, a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por tentativa de golpe de Estado.
O Brasil volta a discutir a "anistia". Agora, diante dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. O debate não é apenas jurídico, mas político: separa os que defendem a democracia dos que relativizam seus fundamentos. Hoje, esse movimento mira diretamente os envolvidos na invasão e depredação das sedes dos Três Poderes e alcança ainda os que elaboraram e difundiram a chamada minuta do golpe.
Sua existência comprova que os ataques de 8 de janeiro não foram espontâneos: eram parte de uma engrenagem golpista desenhada para substituir a Constituição por um regime de exceção. Nesse contexto, a fala do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, de que anistiar os envolvidos seria um gesto de "pacificação nacional", revela muito mais do que uma opinião. Ecoa o mesmo discurso usado em 1979 para justificar a anistia da ditadura, quando se vendeu a ideia de reconciliação, mas o que houve, na prática, foi a blindagem agentes do regime.
O risco é repetir o erro histórico: transformar o perdão em ferramenta de esquecimento e, pior, legitimar a ideia de que atacar a democracia é apenas um excesso a ser relevado.
A reação institucional mostrou a gravidade do problema. Entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil e a Associação Brasileira de Imprensa se manifestaram contra qualquer proposta de anistia, lembrando que a impunidade já custou caro ao país. Movimentos sociais e familiares de vítimas da ditadura foram além: pacificação sem justiça é apenas esquecimento imposto.
Nossa tradição é marcada por conciliações artificiais. Em 1979, a anistia foi apresentada como símbolo de pacificação, mas silenciou vítimas e perpetuou a impunidade. O país seguiu com feridas abertas e um Estado que, em diferentes momentos, naturalizou a violência.
O massacre do Carandiru, a chacina de Vigário Geral e a tragédia de Eldorado dos Carajás são capítulos dessa herança. Outros países da América do Sul seguiram caminhos diferentes. No Chile, a anistia de 1978 tentou blindar os militares de Pinochet, mas a mobilização da sociedade permitiu julgamentos décadas depois. Na Argentina, as leis de "ponto final" e "obediência devida" limitaram a responsabilização, mas foram revogadas nos anos 2000, abrindo espaço para condenações históricas.
A lição é clara: só verdade e justiça consolidam a democracia. Nesse sentido seguir o movimento político de anistia seria dizer que a democracia pode ser atacada e depois perdoada. O Brasil precisa escolher: repetir os erros do passado, acreditando que impunidade constrói paz, ou aprender com Chile e Argentina que não há democracia sólida sem enfrentar as veias abertas das ilegalidades mais brutais. A anistia encobre. A responsabilização afirma a democracia.
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