
Daniel Maia é professor doutor de Direito Penal da Universidade Federal do Ceará (UFC), sendo também advogado criminalista e colunista semanal do O POVO
Daniel Maia é professor doutor de Direito Penal da Universidade Federal do Ceará (UFC), sendo também advogado criminalista e colunista semanal do O POVO
Na última semana, o caso da catarinense Mariana Ferrer tomou conta dos noticiários e das redes sociais da Internet, tendo inúmeras pessoas se manifestado contra a sentença que absolveu o empresário que ela acusou de estuprá-la em uma boate em Florianópolis.
Mais pessoas ainda, inclusive um ministro do Supremo Tribunal Federal, o Senado Federal, diversas personalidades do meio jurídico e outras autoridades, se manifestaram também não apenas contra o resultado do processo, mas principalmente contra a maneira como transcorreu a audiência de instrução desse caso, a qual, apesar de ser um ato de um procedimento sigiloso, foi vazada pelo famoso site de vazamentos de notícias e segredos, The Intercept.
A gigantesca repercussão se deveu ao fato de que na referida audiência vê-se o advogado de defesa fazendo afirmações extremamente fortes e grosseiras contra a vítima, a qual em prantos pede socorro ao magistrado. O Juiz, por sua vez, apenas oferta à vítima que a audiência seja pausada para que a moça possa beber água.
É verdade que o The Intercept errou feio ao propositalmente espalhar a fake news de que o promotor do caso teria utilizado a expressão “estupro culposo” – a qual não existe no dicionário jurídico -, bem como por ter vazado vídeos de um ato judicial sigiloso, o qual não poderia ter sido divulgado como foi. O referido site deve ser punido por isso, pois a liberdade de expressão não protege notícias falsas e nem a violação de sigilos judiciais.
Entretanto, parece-me muito mais grave a postura dos três profissionais que estavam no ato.
O advogado não deveria tratar com tanta grosseria ninguém, ainda mais com julgamentos de cunho machistas, pessoais e vexatórios. A ampla defesa, direito constitucionalmente garantido, bem como a Lei da Advocacia, não tutelam condutas desarrazoáveis e de extrema má-educação como as que o advogado realizou na referida audiência. A urbanidade e o respeito a todos, inclusive às partes contrárias em um processo, são as diretrizes que devem pautar a conduta de todo defensor. E tais diretrizes não foram seguida pelo causídico em questão, pelo quê a OAB/SC deverá leva-lo ao Tribunal de Ética.
Contudo, penso que a omissão do Promotor, que é em todo processo o fiscal da lei, bem como a absoluta inércia do Juiz ao não fazerem nada para brecar a atuação violenta e inadmissível do advogado, são tão ou mais graves do que a própria humilhação imposta pelo causídico à vítima, devendo, portanto, serem também apuradas e punidas pelas corregedorias do Ministério Público e da Magistratura catarinense.
Independentemente do mérito do processo em si, o qual aqui não podemos analisar já que não tivemos acesso às provas dos autos, o Poder Judiciário não pode ser palco de um circo de horrores em que as partes podem ser humilhadas pelos profissionais do Direito, sejam eles advogados, promotores ou juízes. Isso é inadmissível!
Espera-se que o caso não caia no esquecimento e que as condutas, inclusive as omissões, sejam devidamente apuradas e penalizadas, afim de que sirvam de exemplo para todos os profissionais do Direito de que não podem faltar com o respeito com absolutamente ninguém.
Como advogado, me envergonho da conduta do colega catarinense.
Como professor de Direito espero que meus alunos nunca se tornem omissos, como foram o promotor e o juiz desse caso.
E como cidadão repudio veemente a cultura machista do estupro que ainda reina no nosso tão machista país.
Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.