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Fazer sucesso ofende
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Daniel Maia é professor doutor de Direito Penal da Universidade Federal do Ceará (UFC), sendo também advogado criminalista e colunista semanal do O POVO

Daniel Maia opinião

Fazer sucesso ofende

O sucesso não é um privilégio; é o resultado de esforço, visão e coragem. Paradoxalmente, quanto mais difícil é alcançá-lo, mais ele deveria ser celebrado - especialmente num país onde vencer é remar contra tantas correntes
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Detalhe da inveja representada no quadro A Calúnia, da pintora mineira Irma Renault (Foto: Acervo do Autor)
Foto: Acervo do Autor Detalhe da inveja representada no quadro A Calúnia, da pintora mineira Irma Renault

Fazer sucesso no Brasil, mais do que um mérito, parece ser um ato de provocação. É quase um pecado social. Quem prospera, cresce ou simplesmente se destaca em qualquer área logo desperta um tipo curioso de ressentimento coletivo.

Não é inveja pura - é algo mais sofisticado e disfarçado: um incômodo com o sucesso alheio, uma necessidade de justificar que o outro "teve sorte", "foi ajudado", "conhece alguém", ou, no mínimo, "deve ter feito alguma coisa errada".

Vivemos em um país que admira o fracasso humilde mais do que a vitória orgulhosa. O brasileiro simpatiza com quem luta e sofre, mas desconfia de quem vence. É como se o sucesso fosse uma traição silenciosa a um pacto não escrito de mediocridade: "não vá longe demais, não brilhe demais, não se destaque demais".

O talento, quando reconhecido, precisa vir acompanhado de desculpas, de modéstia excessiva, de uma espécie de pedido de perdão por ter dado certo.

Nas redes sociais, esse fenômeno se amplifica. O sucesso incomoda porque é público, visível, quantificável em curtidas e seguidores. Basta alguém subir um degrau para choverem comentários ácidos, críticas travestidas de opinião e análises morais que nada têm a ver com o mérito real.

É o linchamento social do mérito - uma forma de nivelar tudo por baixo, para que ninguém se sinta pequeno diante do brilho alheio.

Mas o sucesso não é um privilégio; é o resultado de esforço, visão e coragem. E, paradoxalmente, quanto mais difícil é alcançá-lo, mais ele deveria ser celebrado - especialmente num país onde vencer é remar contra tantas correntes. Ainda assim, fazer sucesso no Brasil segue sendo um ato quase subversivo: ofende, provoca e incomoda.

Talvez porque o sucesso de um lembre o outro do que ele mesmo poderia ter sido, se tivesse ousado mais, sonhado mais ou persistido além das desculpas. E é por isso que, no fim das contas, fazer sucesso no Brasil não é apenas vencer - é resistir.

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