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Contra o negacionismo, o Jornalismo sob ataque
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Jornalista (UFC-CE) e licenciada em Letras (Uece), é doutoranda em Linguística (PPGLin-UFC), mestra em Estudos da Tradução (UFC-CE), especialista em Tradução (Uece) e em Comunicação e Marketing em Mídias Digitais (Estácio). No O POVO, já atuou como ombudsman, editora de Opinião, de Capa e de Economia, além de ter sido repórter de várias editorias. É revisora e tradutora.

Contra o negacionismo, o Jornalismo sob ataque

Tipo Opinião

Ao expor os dados que apura, o jornalista sempre precisa ter a certeza de que terá como provar aquilo que publica. É basilar no exercício da profissão. Se não há provas para sustentar, não há publicação. É da responsabilidade do Jornalismo. Foi isso o que levou o jornalista Demitri Túlio a apresentar alguns fatos envolvendo o Colégio Militar de Fortaleza (CMF) na sua coluna do domingo 26/7.

Em "Um colégio que nega a pandemia?" (https://is.gd/nSHwjh), Demitri relaciona uma série de argumentos com os quais critica a "postura negacionista" do Colégio em relação à Covid-19 e cita alguns pontos como base para esse negacionismo. São eles: a recomendação do Comando do colégio aos professores para que evitassem questões relacionadas à doença, o desrespeito a decretos locais quanto à antecipação de feriados e uma consulta feita a pais de alunos que mostrou que a maioria (69%) era contrária ao retorno das aulas presenciais por ora.

A repercussão que o assunto tomou demonstra a delicadeza que é abordar a educação em ambiente militar e escancara o quanto nos desvirtuamos do debate, enviesando para a truculência desmedida sem abordar o cerne da discussão. O jornalista e o jornal foram atacados pelas redes sociais e por e-mail. Recebi algumas dessas queixas.

Muitas delas acusam o jornalista de ter sido "desrespeitoso" com o colégio, ao publicar calúnias. Outros defendem a qualidade do ensino do Colégio Militar. Há os que insinuam que o jornal "persegue os militares, tentando manchar o nome das instituições".

Ora, em momento nenhum, a coluna questiona a qualidade da educação do colégio, indiscutível. A petição on-line, capitaneada por "pais e amigos do CMF de Fortaleza" (sic), repudia um texto que parece ter gerado incômodo porque jogou luz em um tema para o qual não podia haver confronto.

Violência

No abaixo-assinado virtual de repúdio ao texto, citam que o "fato jornalístico" é "inveridico e não passível de provas" (sic). Até a noite de sexta-feira, havia 687 assinaturas.

O que o Demitri escreveu não foi uma matéria. Mas é um texto jornalístico dentro do seu espaço de crônica, baseado em dados que ele apurou. De fato, a diferenciação entre os gêneros é uma confusão constante para o público leigo. "Como a coluna é um espaço de crônica/opinião, assinada por um cronista/articulista, o cronista/articulista recebe do Jornalismo essa permissão sabendo da responsabilidade de provar o que escreveu. O texto 'Um colégio que nega a pandemia?' não é uma matéria factual ou uma reportagem - casos em que o Jornalismo determina a escuta obrigatória", justifica.

O colunista discorre baseado em fontes, que, segundo ele, foram alguns pais de alunos, professores e militares. "Tenho documentos oficiais. Um assinado por um coronel gestor do Colégio Militar determinando: 'Para a 2ª AE, evitar formular questões relacionadas à Covid-19'. E outros ordenando não usar hashtags como #fiqueemcasa #isolamentosocial com os alunos".

Demitri se sustentou no caráter de sua coluna para a publicação dos dados. A fim de obter mais um lado da mesma história, deveria ter procurado o Colégio para um contraponto. O Colégio poderia até não comentar o assunto - como silenciou -, mas a ele havia sido dada a chance de se manifestar. A propósito, tentei contato com a Comunicação Social do CMF por telefone e por e-mail. Não obtive resposta.

O que não se admite é o linchamento virtual que se tenta criar nas redes sociais, como se a intimidação e o ataque, reproduzidos pelos habituados à intolerância, fossem capazes de tolher a liberdade de imprensa da atividade jornalística, cravada sem subterfúgios em regimes democráticos.

"O que aconteceu em relação a mim, como jornalista e cidadão, e ao O POVO foi uma reação desmedida de autoritarismo e contra a liberdade jornalística de informar. Não me incomodo com críticas, é da profissão. O que não pode existir é a violência. Caluniar, injuriar e difamar são tentativas de intimidação e passíveis de ação judicial", analisa Demitri.

Em contraponto aos ataques, há uma série de mensagens de apoio. A nota de solidariedade on-line "Quando o autoritarismo e a ignorância se sobrepõem à educação e à liberdade de expressão" foi encabeçada pelo médico Mário Mamede e pelo sociólogo Hebert Lima e ganhou o apoio de colegas e entidades ligadas à defesa do jornalismo. Até a noite de sexta-feira, havia 2.334 assinaturas.

No meio de uma pandemia, quando todos os esforços estão (ou deveriam estar) voltados para os cuidados sanitários e mentais de um povo, intensificando medidas protetivas, assistimos a mais uma tentativa de desqualificar o trabalho da Imprensa.

Negar o negacionismo não é só uma tosca metalinguagem que invade redes sociais contra o Jornalismo. É o desvio inescrupuloso de uma discussão que desrespeita infectados e mortos pela Covid-19. Se existe confronto, que a internet seja usada como ferramenta de mobilização para a crítica, não como via de disseminação de ódio.

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