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Por onde andará Algodão?
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Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis

Por onde andará Algodão?

Em tempos de intensa interação digital, uma busca pelos afetos pode estar à mercê de cartaz no poste
Tipo Crônica
Calopsita, um pássaro curioso e divertido, assim deve ser Algodão (Foto: Simko | Shutterstock)
Foto: Simko | Shutterstock Calopsita, um pássaro curioso e divertido, assim deve ser Algodão

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Mesmo em um mundo cada vez mais tecnológico, repleto de meios rápidos de interação e comunicação, ainda é frequente nos depararmos com panfletos em postes prometendo trazer a pessoa amada em alguns dias.

Sempre me perguntei por onde andaria a pessoa procurada, os motivos da sua deserção e, principalmente, como ocorreria a volta.

Seria voluntária ou coercitiva? Uma vez ocorrendo o retorno do egresso, haveria nova fuga? Entre a ida e o regresso, teria ocorrido o ingresso de alguma coisa no seu coração, além dos feitiços e mandingas?

Interessante que desde a antiguidade clássica existem mitos de deuses e deusas frequentemente envolvidos no uso de magia ou encantamentos para influenciar o amor, não sendo de hoje os conceitos de “amarração” e os sortilégios para adoçar os relacionamentos.

Não deixa de ser curioso (e até mesmo assustador) as crenças e práticas de duvidosa eficácia que envolvem o uso de amuletos, porções ou rituais que afirmam serem capazes de manipular as energias do universo para influenciar as emoções e desejos da pessoa objeto de nossa cobiça.

Por outro lado, Freud propôs uma teoria especulativa sobre as origens da sociedade humana, baseada na análise de mitos e rituais, sugerindo que no início da civilização humana, as sociedades primitivas eram organizadas em torno de um sistema totemista, no qual um animal ou objeto natural era considerado sagrado e conferia identidade e coesão a um clã ou tribo.

"Se é para nos perdermos, que nos percamos apenas por amor e que sua sacralidade se manifeste de todas as formas, até mesmo através de um panfleto em um poste"

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É sabido que muitas religiões e mitologias associam determinados animais a deidades, espíritos ou figuras míticas importantes, sendo tidos como representantes dessas entidades divinas ou como mensageiros entre o mundo terreno e o espiritual.

Alguns animais são considerados sagrados devido à sua importância ecológica ou ao seu impacto na subsistência humana, sendo associados a virtudes e atributos como a sabedoria, transformação e fertilidade, atribuindo-lhes um significado espiritual e emocional profundo.

Tudo isso me pareceu resumido em um pequeno folheto pregado em um poste, nas proximidades dos Correios da Rua Maria Tomásia, no Meireles.

Ali oferece-se recompensa para quem encontrar Algodão, uma calopsita de tamanho médio, com olhos curiosos e plumagem branca. Não foi afirmado quando desapareceu nem as razões, nem dá para saber há quanto tempo o folheto está ali.

Certamente era muito bem tratado e estimulado a pequenos truques e até mesmo a falar algumas palavras. Provavelmente andava solto pela casa e se distraiu com os outros pássaros da região, aventurando-se a segui-los e acabou se perdendo, não mais conseguindo voltar.

Não sei se Algodão está mais feliz assim, ou se sente falta de casa, apenas gelo ao pensar que algum gato de rua possa tê-lo encontrado primeiro.

Gostaria que ele voltasse pelo menos para assegurar ao seu aflito tutor ou tutora que estava bem, alimentado e sem os efeitos das chuvas e que não seria necessário prendê-lo em nenhuma gaiola.

Os laços seriam confirmados como de amor e afeto e ele estaria voltando para ficar, sem amarrações ou encantos, porque sentiu saudades e falta das brincadeiras, carinhos e atenção.

Espero que Algodão e seus parentes se reencontrem o quanto antes.

Se é para nos perdermos, que nos percamos apenas por amor e que sua sacralidade se manifeste de todas as formas, até mesmo através de um panfleto em um poste.

Foto do Danilo Fontenelle

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