
Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis
Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis
Ele disse sim.
Ele disse sim a oito pessoas que nunca conheceu nem conhecerá.
Alguns familiares não concordaram, presos a ideias antigas. Mas outros lembravam claramente que ele havia dito sim – e isso era o que importava. Os pais concordaram. A esposa apoiou. Os filhos compreenderam.
O sim foi anunciado.
Do outro lado da cidade, uma moça chorou de emoção ao receber a notícia.
Um jovem pai abraçou os filhos com lágrimas nos olhos.
Uma menina deu pulos de alegria.
Uns pais rezaram por ele.
Uma mãe cumpriu uma promessa.
Um homem pediu a namorada em casamento.
Uma mulher finalmente poderia ter filhos.
Um rapaz, cansado da escuridão, resolveu voltar a estudar.
Oito vidas foram modificadas porque ele disse sim.
Ele disse sim à vida.
E aquele sim percorreu distâncias que ele jamais poderia prever.
A menina que pulou de alegria convivia com a incerteza. Um coração frágil fazia o tempo escorrer, obrigando-a a despedir-se dos sonhos antes mesmo de vivê-los. O transplante foi o presente que trouxe de volta suas tardes de bicicleta, seus aniversários, seus planos de adolescência. Agora, o nome dele é sussurrado em orações e agradecimentos que atravessam gerações.
O rapaz que resolveu voltar a estudar via o mundo escurecer dia após dia, como se o tempo o apagasse devagar. Até que o telefonema veio, prometendo-lhe uma córnea saudável. Agora, ele vê não apenas as cores, mas um horizonte de possibilidades. Ele deu-lhe não só a visão, mas a esperança.
A doação de órgãos, no entanto, ainda se faz tabu. É um território onde medo, desinformação e misticismo lançam sombras espessas. Alguns acreditam que o corpo precisa estar “intacto”, como se a alma pudesse se esconder em algum canto do fígado ou dos pulmões.
Outros temem conspirações, desconfiando que médicos possam negligenciar cuidados, como se esses profissionais fossem juízes cruéis. Há quem cite crenças religiosas que, muitas vezes, sequer compreendem por completo.
Mas ele sabia que a morte, quando inevitável, pode ser um ponto de virada – não só para quem parte, mas para quem fica. Ele entendeu que doar é um ato poético de eternizar-se: é permitir que a própria despedida se transforme em reencontros, em novos passos, novos suspiros, novas vidas.
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Ele sabia que a generosidade pode se manifestar de várias formas. Em vida, podemos doar sangue, plaquetas, rim, parte do fígado, medula óssea. E quando a vida se esgota, o coração, os pulmões, as córneas e outros tecidos podem continuar a bater, respirar e enxergar em novos corpos. O impacto de um único gesto é imenso.
Assim, a doação ressignifica o conceito de milagre: não algo etéreo, mas concreto, com bisturis, fios de sutura e profissionais dedicados. Um milagre que nasce do altruísmo, da empatia em estado puro e da preocupação com o destino dos outros, quando o nosso já não mais importa.
Ele, o doador desconhecido, vive agora em outros passos, outros sonhos, outros abraços. Ele disse sim à vida e nos lembrou que o corpo, por mais sagrado que seja, não é eterno. O que é eterno é o impacto que deixamos nos outros. E isso, em essência, é o maior sim que se pode dar.
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