![Foto de Danilo Fontenelle](https://mais.opovo.com.br/_midias/jpg/2022/09/02/100x100/1_juiz_federal_danilo_fontenelle-19608498.jpg)
Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis
Danilo Fontenelle Sampaio é formado em Direito pela UFC, mestre em Direito pela mesma Universidade e doutor em Direito pela PUC/SP. É professor universitário, juiz federal da 11ª vara e escritor de livros jurídicos e infanto-juvenis
Quando a gente é mais jovem, sempre desejamos eventos extraordinários. Vivemos esperando por algo que aconteça: uma notícia que surpreenda, um fato que nos arrebate do cotidiano, qualquer coisa que faça a vida vibrar e o destino se transformar em uma aventura.
Mas o despertador toca, como sempre. O café da manhã não é de hotel, mas está servido. As roupas não são de grifes, mas estão limpas e engomadas. O transporte não é exclusivo, mas nos leva ao destino em segurança.
O dia avança. No trabalho ou no colégio, os rostos conhecidos, as mesmas tarefas. Nada de extraordinário, mas constante. E o dia segue entediante, mas sem atropelos. Nada digno de selfie. Nenhum ambiente instagramável. Um dia previsível, próprio para o esquecimento. Então o tempo passa, e nós despertamos.
Quando achamos que tudo estava bem, um rim ameaça parar. Uma tendinite aparece do nada. O cachorro adoece. O gato deixa de usar a caixa de areia. Aparece uma goteira. A bateria do carro morre sem avisar. O telefone toca no meio da noite. A cada dia, uma surpresa.
O filho de uma amiga entra em surto. O marido de outra desaparece. Um conhecido perde o emprego e o rumo da vida. De repente, uma ponte cai. Centenas ficam sem teto por causa de uma tempestade.
Vivemos saudades surpreendentes. Enterramos amores inesperadamente. Dores surgem onde nem sabíamos ser possível. Deixamos de ver parentes, amigos e de visitar sonhos.
E é então que aprendemos a enxergar o valor de um dia em que nada acontece. O despertar tranquilo, sem dores ou notícias ruins, passa a ser uma bênção disfarçada. Não há chamadas urgentes, nem mensagens de madrugada, nem o peso de uma preocupação pairando sobre os ombros.
Apenas o som habitual do despertador, o cheiro familiar do café, o cachorro que nos olha com expectativa, o ronronar tranquilo do gato, a vida seguindo no ritmo silencioso do possível. Vivemos um dia trivial.
Aquele dia em que o ônibus atrasou, mas ninguém precisava correr para um hospital. Em que a reunião foi longa, mas não havia um filho doente em casa. Em que, ao fim da tarde, não havia um pôr do sol de cinema, mas o maior desafio era escolher o que jantar.
Quando a vida nos surpreende com suas tragédias cotidianas, a normalidade de outrora se revela um verdadeiro milagre. O barulho rotineiro das ruas, a falação sem fim dos colegas no trabalho, a fila demorada no supermercado, até o trânsito parecem menos insuportáveis quando percebemos que estamos vivendo uma paz preciosa. São sinais de que tudo está constante e no seu devido lugar, na serenidade do corriqueiro.
E talvez a maior graça divina esteja nisso: poder atravessar um dia sem precisar estancar saudades novas, sem carregar o fardo dos remorsos ou a angústia das urgências.
Um dia que não será lembrado por fotos nem memórias especiais, mas que nos oferece a discrição silenciosa de estar bem e ter todos aqueles que amamos presentes e em segurança.
Chega a noite e, ao deitar, o coração agradece sem alarde. Nada aconteceu, e isso foi o bastante. Deus nos deu, mais uma vez, a chance de repousar, embalados pelo conforto invisível de termos sido poupados do imprevisto, da dor e do vazio. Dormimos no milagre do ordinário, guardados pela graça silenciosa de um dia comum – o mais precioso de todos.
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