Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.
Há algum tempo passei a acreditar na fé alheia. Desiludi-me com esse conto sobre "Deus" e a segunda vinda do "filho dele" para julgar os defuntos e os coitados. A Bíblia virou pra mim uma grande Macondo ou um livro do feitio das Mil e Uma Noites.
Mas creio desmedido na devoção pia dos outros. Sim, dos que não acham que tudo que é desarranjo dos diazinhos repetidos deve ser entregue nas mãos invisíveis de "Deus" e se resolverá. Como literatura é um gozo.
Um dos devotos que tenho fé no que ele pratica como sobrenatural, para conseguir ir existindo, é Tarcísio Matos. Um ser vivo que não derruba árvores nem joga lixo na rua. Tem defeitos, igual a qualquer passageiro da Terra, mas tem generosidades.
"À missa, de vez em quando ainda vou. Sou apaixonado por rituais e alguns sermões do povo da Teologia da Libertação, de Francisco - o desmantelador"
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Vive a me livrar de palavras ruins, a tentar me ajeitar na essência perturbada, a ajustar meus aperreios místicos e a trazer pontes para eu atravessar e ir se desfazendo do egocentrismo "cristão".
Por último, me convidou para uma gira. Conhecer o que nunca vi nem experimentei nos olhos e nos medos do diferente. Coisa de criança nascida no catolicismo, disciplinada para não crer no que fosse tribal, nas heranças "medonhas" dos corpos escravizados que trouxeram o sublime também.
Disse que iria, não na sexta-feira que passou depois do feriado de Corpus Christi. Num sábado, talvez no próximo. Ele me ofereceu um passe e conhecer quem me acompanha para ter uma leveza e suportar a semana. Gostei da oferta, um presente.
À missa, de vez em quando ainda vou. Sou apaixonado por rituais e alguns sermões do povo da Teologia da Libertação, de Francisco - o desmantelador. E vivo desejando a dramaturgia das leituras fora do mito e da crença insuspeita.
Pois bem, esta crônica não era para falar de minhas desilusões tardias com o perpétuo perenal. São conflitos particulares. Hoje acredito mais na insistência dos rios, na paciência do mar, na delicadeza dos ninhais de pica-paus do Cocó, na itinerância das teias fiadas por aranhas rendeiras do Parque.
"É, também, mais importante apresentar para leitoras e leitores, um artista em expansão do corpo, do traço, dos desenhos e das telas querendo romper o comum da existência fugidia e, algumas vezes, inexplicável"
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A crônica era para falar de outra oferta feita por Tarcísio Matos, a oportunidade de ter alguma parte com a vida de Daniel Lessa Ferreira. Um adolescente de 15 anos de vida, moço de Canindé de São Francisco.
Ele é um paciente do Hospital Albert Sabin abraçado pelo povo do Peter Pan. Tem um câncer ósseo há um ano e quatro meses, que o fez reaprender a andar. Ele luta. Luta imenso.
É, também, mais importante apresentar para leitoras e leitores, um artista em expansão do corpo, do traço, dos desenhos e das telas querendo romper o comum da existência fugidia e, algumas vezes, inexplicável.
Pois o rapaz, quem quiser conhecê-lo, vai expor a outra linguagem que o traduz um ser vivo em travessias e cheio de sonhos. Na próxima quinta-feira, às 9 horas, na Unifor, ele estará de artista partilhando sua obra recém-nascida.
Daniel desejou a exposição, o Peter Pan se movimentou e a universidade teve a sensibilidade de reconhecê-lo pintor. Queria escrever outros abraços sobre o adolescente, seus 15 anos por aqui e sua arte, mas não consigo.
Então, desejo que você seja a mais feliz das criaturas em transformação. Um grande abraço e parabéns porque você existe.
Minha fé efêmera não entende isso. A frase não é minha, tomei-a emprestada da Sudario.
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