Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.
Em meio a uma semana tomada por mais uma guerra, as rotas de escape do corpo precisam ser acionadas. Qualquer que seja o alento está valendo. Até chupar um pipper ou comer uma rodela de abacaxi e se "açucará" na Senador Alencar.
É uma tentativa de desvio do bombardeio noticioso sobre a indústria da morte, que sempre vai bem e agradece ao antropocentrismo. O lucro com o extermínio do outro é alto para alguns e a justificativa é sempre a paz.
Além das histórias sobre as vítimas da guerra, assassinadas ou tangidas do lugar de viver, ainda temos os BOs domésticos para desatar e as situações pendentes do cotidiano amoroso.
"Uma besteira, mas tão alentosa que desejei que outras pessoas do meu carinho também estivessem lá e experimentassem o acaso dos encontros graciosos"
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Pois numa locação para um documentário do O POVO, não menos doído o assunto, passei umas três horas de bem com uma quarta-feira que iria terminar comum e igual a quase todos os dias.
Uma besteira, mas tão alentosa que desejei que outras pessoas do meu carinho também estivessem lá e experimentassem o acaso dos encontros graciosos. Para suspender o juízo atarantado.
Estávamos eu, Mariana Lopes e Fco Fontenele colhendo imagens de aviões aterrissando no aeroporto Pinto Martins. Por causa de uma dessas estranhezas da Cidade que se demole e que se substitui constantemente, a construção da Estação Expedicionários-Aeroporto, do metrô de Fortaleza, acabou virando uma plataforma de observação de voos.
"No "novo e internacional Pinto Martins", os antipáticos alemães da Fraport proibiram o avistamento. Era um programa besta e singelo aos domingos"
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Entre o fim da tarde e o começo da noite, mais ou menos a partir das 17 horas, uma revoada de aviões - vindo dos mais diversos cantos do País e do mundão - iniciam um desce-e-levanta alucinante.
Nem gosto assim de aviões, mas talvez a aparência com pássaros gigantes me fez ficar encantado com o inusitado em uma estação comum de metrô, em Fortaleza. Ela deveria ser banal, fria no vai e vem de cansados, mas não. Ficar sentado em suas cadeiras, ou em pé, a olhar as aeronaves descerem e voarem tem algo de especial que não sei definir. Queria uma palavra abarcante.
Talvez chafurdar a memória do menino dos anos 70 e 80, quando o pai e a mãe levava-o mais os cinco irmãos para o "aeroporto velho". E, do alto de uma área com vidraças, viam chegar e partir Varigs e Vasps.
No "novo e internacional Pinto Martins", os antipáticos alemães da Fraport proibiram o avistamento. Era um programa besta e singelo aos domingos, mas os abestados ainda não se permitiram misturar-se e entender o povo de Fortaleza.
"O menino é tão contagiante de alegre que parece voar e pousar a cada avião. Ele tem asas, é autista verbal, brinca de torre de comando e muda a voz na aproximação das aeronaves"
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O melhor da história é que a Estação Expedicionários-Aeroporto me fez conhecer o Arthur. Um camarada de dez anos de idade, que todos os dias, na companhia do pai Tarcísio Medeiros, vem contar os aviões que pousam em Fortaleza. É um deleite vê-lo no regalo.
Uma graça. Sem timidez, Arthur e seu aplicativo de mapear aeronaves passaram a nos guiar sobre as chegadas e partidas dos bichões. "Tá vindo um Air France. Ele tá, agora, na Maraponga". E o gigante rasga, de repente, o céu ao lado da estação do metrô. Na cara da gente.
O menino é tão contagiante de alegre que parece voar e pousar a cada avião. Ele tem asas, é autista verbal, brinca de torre de comando e muda a voz na aproximação das aeronaves. Arthur anuncia aos passageiros imaginados a aterrissagem em Fortaleza. Depois se abraça com o pai que declara amor pela cria.
Por alguns momentos daquela quarta-feira comum, houve algo de especial em mim. Arthur fez o reverso. Nem as notícias sobre a arrogância de Israel e o desespero acuado de civis palestinos me fizeram refém mais ainda.
Esperar pelos aviões da Estação da Expedicionários-Aeroporto foi uma trégua para o aperreio dos pensamentos.
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