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Evaldo Gouveia: Uma história além da canção
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Marcos Sampaio é jornalista e crítico de música. Colecionador de discos, biografias e outros livros falando sobre música e história. Autor da biografia de Fausto Nilo, lançado pela Coleção Terra Bárbara (Ed. Demócrito Rocha) e apresentador do Programa Vida&Arte, na Nova Brasil FM

Marcos Sampaio arte e cultura

Evaldo Gouveia: Uma história além da canção

Liduína Lessa e Evaldo Gouveia viveram juntos por quase 30 anos, partilhando uma casa, uma vida, muitas histórias e muitas músicas
Tipo Notícia

“Quando eu tinha cinco anos de idade, tinha um rapaz chamado Assis de Amâncio, que tocava violão, e eu era doido pra aprender a tocar por causa das meninas da rua. À noite, a gente juntava embaixo de um pé de benjamim e ficava tocando e brincando. Quando eu comecei a aprender os tons, cantando também, diziam que eu tava tocando direitinho. Aos oito anos, eu já cantava na radiadora na praça da estação”. Como contou às Páginas Azuis do O POVO, a paixão pela música chegou cedo para Evaldo Gouveia e o acompanhou por todos os dias dali em diante. Mesmo quando lhe faltou a visão, as forças, a disposição, de alguma forma, a música ainda estava ali.

“Todo dia ele acordava e a primeira coisa que fazia era colocar o violão no peito”, conta a advogada Liduína Lessa, esposa que acompanhou Evaldo na vida e nos palcos nos últimos 20 e tantos anos. A data precisa ela não lembra, mas não esquece de forma alguma a admiração pelo compositor de “Sentimental demais” e “Mulher à brasileira”. “Deus me presenteou com uma pessoa muito boa”, celebra emocionada.

A primeira lembrança que o nome de Evaldo remete a Liduína é de um Carnaval, há algumas décadas, no Clube Líbano Brasileiro, que ficava na rua Tibúrcio Cavalcante. Ela, à época uma adolescente, brincava com seu bloco quando o presidente do clube anunciou a chegada de um convidado especial: o “grande compositor Evaldo Gouveia”. Talvez ela nem tivesse certeza de quem se tratava, mas era perceptível que alguém importante chegava ali. Anos depois, coube ao dono da Boate Oásis apresenta-los de verdade. “Ele estava se separando da namorada que tinha no Rio de Janeiro. Quando o Henrique nos apresentou, eu lembrei do cara do clube Líbano. Nós ficamos amigos. Depois ele veio fazer um show no Hotel Praia Centro e me ligou, convidando pra ir ver. Eu não pude ir e ele foi embora, mas sempre que ele vinha aqui, me ligava”.

Mais alguns desencontros depois e eles se encontram, por acaso, no Bar da Mocinha. “Fujona”, exclamou Evaldo que foi puxando conversa. A empatia foi imediata e logo eles começaram a se encontrar entre viagens a Fortaleza, São Paulo e Rio de Janeiro. “Ele era um homem tão educado, tão fino que foi me aproximando. Fino, respeitador, gente boa. Muito respeitador. Ficamos namorando, eu aqui, ele lá”, relembra Liduína que, depois de deixar o emprego na Coelce, também foi convidada para cuidar da carreira de Evaldo.

Esse “cuidar da carreira” incluiu o morar junto e o cantar junto. Embora nunca tenha cogitado ou ensaiado uma carreira artística, Liduína teve algumas experiências de palco. “Eu comecei a cantar antes da faculdade. Os amigos faziam música e eu ia defender em festivais. Quando o Evaldo me conheceu, uma amiga até disse: ‘ela é cantora’. Mas eu não sou cantora, apenas gosto de cantar”, explica. Assim,  gravou “Analista de boêmio”, parceria de Evaldo com Carlos Colla, no disco “O trovador” (2011), quando Evaldo Gouveia foi o homenageado do Carnaval da Prefeitura de Fortaleza.

A partir daí, a cumplicidade foi maior. Ela acompanhou o nascimento de muitas canções, que não escolhiam hora nem local pra chegar. Quando aquela ideia vinha, as condições tinham que ser criadas. Uma vez foi num supermercado, no meio das compras. “Bora, Liduína, tá vindo. Vamo!”. “Calma, meu filho. Vamos já. Não dá pra segurar?”. Às vezes dava, às vezes não. Quando não, o jeito era esperar que a próxima ideia descesse. Quando Evaldo sofreu com a degeneração macular e foi perdendo a visão, também cabia a ela aprender as canções para ajudar a decorar.

Hoje com 63 anos, Liduína Lessa conserva o mesmo carinho e a mesma admiração pelo Evaldo Gouveia que  conheceu tantos anos trás. “Além de ser esposa, eu era fã. Ele sempre foi um grande músico, um cara correto. Quando ele ia ser do júri de algum programa de TV, como o Raul Gil, as pessoas gostavam porque ele sabia falar, ele sabia dar opinião”, conta.  Foi assim que ela teve oportunidade de conviver com muita gente que fez parte da trajetória do compositor de “Alguém me disse” e “Que queres tu de mim”. Gente como Moacyr Franco, Jair Amorim, Zeca Pagodinho, Martinho da Vila e Altemar Dutra Jr. “Eu dizia muito pro Evaldo: ‘Deus me deu você de presente’. Acho que é uma alma gêmea mesmo. O amor por ele é muito grande. Eu sofri muito, mas eu sei que ele não está sofrendo agora”.

Foto do Marcos Sampaio

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