Logo O POVO+
Eliana Pittman renova obra de Jorge Aragão em novo disco
Foto de Marcos Sampaio
clique para exibir bio do colunista

Marcos Sampaio é jornalista e crítico de música. Colecionador de discos, biografias e outros livros falando sobre música e história. Autor da biografia de Fausto Nilo, lançado pela Coleção Terra Bárbara (Ed. Demócrito Rocha) e apresentador do Programa Vida&Arte, na Nova Brasil FM

Marcos Sampaio arte e cultura

Eliana Pittman renova obra de Jorge Aragão em novo disco

Unindo cavaquinho e programações eletrônicas, o álbum "Nem Lágrima Nem Dor" une a voz de Eliana Pittman com as ideias do produtor Rodrigo Campos
Tipo Opinião
                                (Foto: Samuca Kim/ Divulgação)
Foto: Samuca Kim/ Divulgação

Em qualquer situação, o Brasil é muito cruel com idosos. No lugar de valorizar o acúmulo de experiência, o mais comum do mercado é trocar profissionais mais vividos por jovens com discursos cheios de palavras em inglês. Na música, o cenário não é diferente. Porém, algumas experiências do mercado fonográfico têm nadado contra essa maré e resgatado vozes que há tempos andam fora dos grandes holofotes.

O maior exemplo é Elza Soares, que, já depois dos 80 anos, rejuvenesceu seu público com o poderoso álbum "A mulher do fim do mundo" (2015). Já beirando os 90 anos (completados em 8 de dezembro), Alaíde Costa também vive um momento de renovação da carreira desde que Emicida a viu numa live (aquelas da pandemia) e decidiu produzir o delicado "O que meus calos dizem sobre mim" (2022), o primeiro de uma trilogia assinada pelo rapper. Claudette Soares, 87 anos, também anunciou que está às voltas com um novo projeto.

E agora chegou a vez de Eliana Pittman. Aproveitando a festa de 80 anos - comemorada em 14 de agosto -, ela lança "Nem lágrima nem dor", que poderia ser só um tributo a Jorge Aragão (76 anos), não fosse a produção de Rodrigo Campos. Ele faz parte de um grupo de músicos paulistanos que resgatou sons e temas tradicionais e misturou tudo com cavaquinho, beats, guitarra e violão. Rodrigo, assim como Juçara Marçal, Kiko Dinucci, Rômulo Fróes, criou pontes entre tantas épocas e estilos que é difícil saber onde termina o jazz para começar o eletrônico e chegar ao samba.

"Nem lágrima nem dor" segue por essa estrada que, embora sinuosa, é trilhada por uma voz experiente o suficiente para transformar qualquer maratona em passeio. Escolada no jazz, que aprendeu ao lado do padrasto, o saxofonista norte-americano Booker Pittman, Eliana já foi do carimbó, da bossa nova, da MPB, do samba canção e, claro, do samba. Tendo gravado de Duke Ellington ao cearense Ednardo, ela já era eclética desde antes do termo virar clichê. E, cantando, aprendeu a tirar esses ritmos de letra.

Logo não seriam as modernidades de Rodrigo Campos que iriam acanhar Eliana. Muito pelo contrário. Juntos, encontraram camadas para um repertório já conhecido. Gravada pelo Fundo de Quintal e Beth Carvalho, "Lucidez" ganha nova dimensão com a voz rouca de Eliana desfilando sobre uma passarela de programações pontuadas por detalhes de cavaquinho (de Rodrigo) e pelo sax de Thiago França. Sucesso do Exaltasamba, "Eu e você sempre" ("Aí foi que o barraco desabou...") soa estranha e magnética ao mesmo tempo, com tanto ruído para prestar atenção.

Do repertório gravado, mas não composto por Jorge Aragão, "Loucuras de uma paixão" (Alcino Ferreira/ Mauro Diniz) soa mais reconhecível do que "Além da razão" (Sombrinha/ Sombra/ Luiz Carlos da Vila), toda recriada sobre teclados, programações e um solo de guitarra com muito eco. Mas nada tão irretocável quanto a releitura dramática de "Papel de Pão" (Christiano Fagundes), quando o samba foi tirado dar lugar ao vazio do amor acabado covardemente.

Tendo ainda "Do fundo do nosso quintal" (ficou linda!), "Minta meu sonho" e "Novo endereço" como argumentos, é muito cedo para dizer que "Nem lágrima nem dor" estará entre os melhores discos de 2025. No entanto o encontro do universo sonoro de Rodrigo Campos com o filé do repertório de Jorge Aragão e a interpretação experiente de Eliana Pittman resultaram em um disco igualmente intrigante e acessível. Mas, como dito anteriormente, é cedo para dizer isso. Até porque, no pacote de comemorações pelos 80 anos, Eliana quer lançar este ano, além de uma biografia, um álbum de jazz. Mas o que ela fez ao lado de Rodrigo já não é jazz? Só eles podem responder.

Cantor e compositor cearense Felipe de Paula, o Dipas
Cantor e compositor cearense Felipe de Paula, o Dipas

A lista de Dipas

Um dos destaques do pagode cearense, Felipe de Paula, o Dipas, indica 5 discos importantes para sua formação

Leci Brandão (1985) - Esse disco, com sua diversidade de arranjos e composições, responde de forma concisa à pergunta que teimam em fazer: qual a diferença entre samba e pagode? Para Leci me parece que não existe diferença.

Simplicidade (2000) - Compilado de sucessos do Fundo de Quintal, que percorrem desde sambas românticos a sambas de partido alto, e desenham e influenciam de forma concreta toda a produção do que vem a ser chamado de "pagode" pelo mercado fonográfico.

Farol das Estrelas (1999) - Disco icônico do Soweto, que estabelece o sucesso meteórico dos meninos paulistanos, liderados pela voz do cantor Belo, que encantou o Brasil junto das composições do grande Claudinho de Oliveira.

Os Travessos (2000) - Divisor de águas por se tratar de uma ruptura mais radical com os elementos do samba mais tradicional para então assumir de forma intencional um samba/pagode mais pop, com guitarras, sintetizadores e figurinos mais ousados também, influenciados pelos contextos de globalização e a disseminação de uma ideia de cultura pop.

Exaltasamba (2002) - Despedida do cantor Chrigor do Exaltasamba e também comemoração de dez anos do grupo gravado ao vivo no Olimpo (RJ), com produção do renomado Prateado. No banjo o grande Arlindo Cruz. Obra-prima.

Adelson Viana (à frente) com o Grupo Murmurando
Adelson Viana (à frente) com o Grupo Murmurando

Notas musicais

Internacional

Em abril, o grupo Murmurando fará uma turnê com Adelson Viana pela Europa. De 4 a 6, eles participam de um festival de choro em Paris. Dia 8, partem para Londres, onde tocam com o grupo Alvorada. De 10 a 14, encerram o giro em Paris.

Imersão

Usando tecnologia 3D, o duo cearense Leves Passos lançou o videoclipe de "Anúncio - ecos do Invisível", produzido por Rafa Diniz. A música fala sobre memória e efemeridade, temas que o clipe exibe em imagens manipuladas e pixeladas.

Novo horizonte

André Frateschi, vocalista da Legião Urbana, está lançando single com a banda Undo. "Volta aquela cena" é um rock acelerado, estilo anos 1980, feito para levantar plateias. O single sucede "Coração selvagem", lançado há um mês, com ares de The Cure.

 

Foto do Marcos Sampaio

Ôpa! Tenho mais informações pra você. Acesse minha página e clique no sino para receber notificações.

O que você achou desse conteúdo?